domingo, 30 de maio de 2010

CAPÍTULO XXI

LANÇANDO AS SEMENTES
As meninas arrumam suas coisas para ir para o retiro e Suzana resmunga desde que acorda até o momento da partida. Sandra e Sônia vão numa boa, pensando em curtir um lugar diferente.
Ivan vai também a pedido de Lúcia, e é revistado por Vitor, que descobre uma maquininha de jogos escondida que guarda até que acabe o retiro.
Durante o passeio de ida na van cor de vinho de Vitor, na qual viajam ao todo 12 pessoas, Suzana fica emburrada e chega a dormir. Sônia, apesar de curtir o passeio, também dorme, pois o balanço do veículo a embala. Na chegada, no fim da tarde uma surprêsa:
- Rick! – exclama Sandra
- Rê! – Sônia vibra ao vê-lo
- Essa não! – Suzana reclama ao ver Rodrigo.
- Suzana! Quer parar de ser antipática! – Sandra chama a atenção da prima
- Ah! É isto mesmo! Tinha que aparecer esse X 9!
- Ele quer o seu bem! Devia pensar nisto invés de dar ponto pra esses moleques que querem te usar! Você gosta de ser maltratada! – Sandra repreende
- Não enche! – Suzana sai batendo o pé, procurando o quarto onde vai ficar. Quando acha, olha em redor pensando que ninguém a está observando e tira da mochila um frasco de perfume que começa a beber. De repente, entra Sandra e ela rapidamente enfia o frasco de volta na mochila.
- O que você tava fazendo?
- N-nada...
- Deixa eu ver o que você botou aí, você tava bebendo!
- N-não...
- Suzana, deixa eu ver!
Sandra insiste e Suzana trava uma luta com a prima, que reage, mas as duas são contidas por Bertinha e Celinha que passavam perto e entram no quarto.
- Meninas, o que é isso? – Celinha repreende as duas e Bertinha a ajuda a separar as primas.
- Ela tava bebendo! – Sandra entrega.
- Como? Não tem bebida aqui! – observa Bertinha abrindo a mochila de Suzana.
- O que você tava fazendo, Suzana? – pergunta Celinha mansamente, embora firme.
- Eu...eu...me ajuda! – Suzana abraça-se com Celinha aos prantos
- Suzana, – Celinha a consola – nós queremos ajudar.
- Suzana, o que eu estou vendo aqui é um frasco de perfume. – Bertinha repara abrindo a mochila de Suzana – Você tava bebendo perfume?
- Eu...eu... – Suzana quase não consegue falar, com a voz embargada
- Suzana, o nosso pai foi alcoólatra – diz Celinha – Eu já o vi beber perfume uma vez. Você tem uma doença, mas tem cura. Jesus pode te curar. Dá uma oportunidade a Ele.
- Eu não quero saber de Jesus! Me deixem em paz!
- Suzana, não fica assim, se acalma. Você tá muito revoltada. – Celinha argumenta.
Suzana chora compulsivamente, nervosamente.
- Você aceita que a gente a ore por você? – Bertinha pergunta
- Tá...
Bertinha ora impondo as mãos sobre a cabeça de Suzana que fica sentada na cama, enquanto Celinha, sentada ao seu lado ora colocando a mão em seu ombro.
- Senhor, tu que és misericórdia, amor e justiça. Sê com a Suzana, Pai. Que todo este espírito de bebedeira seja quebrado, derrotado que sejam destruídos agora todos os principados e potestades e ela seja liberta. Espírito de bebedeira, de depressão de angústia, em nome de Jesus, sai!
- Aaaai! – Suzana grita pouco antes de Bertinha retirar a mão de sua cabeça.
- Que foi? – pergunta Bertinha.
- A minha cabeça foi esquentando enquanto você orava e pouco antes de você tirar, parecia que tava queimando.
- Isto é poder de Deus. – Celinha observa.
Suzana e as outras primas ficam espantadas, sem entender. Suzana se acalma e arruma suas coisas no quarto em que fica com as primas e só sai para o jantar e depois para o culto. Logo que inicia o louvor, Suzana sente um incômodo, uma irritação incontrolável. Levanta-se e diz para Sandra que está ao seu lado:
- Não agüento mais ficar aqui dentro, quero sair!
Sandra assusta-se e vai atrás da prima, sendo seguida por Sônia. Lá fora, Sandra procura ajudar a prima.
- Que foi, Sú?
- Não sei...tô sentindo uma coisa estranha...aquela música me irritou... – Suzana responde ofegante
- Sú... ‘cê não tá bem. – Sônia preocupa-se.
- Eu preciso de um pouco de ar...Vocês não precisam ficar comigo se não quiserem.
- Nós vamos ficar aqui sim! – decide Sandra. – Não vou deixar você sozinha pra fazer besteira como há pouco!
- Eu tô me sentindo vigiada! – Suzana impacienta-se
- Lamento, mas você não dá outra alternativa. – Sandra permanece firme.
No jantar, Suzana não fala uma palavra. Vitor repara que as outras sobrinhas estão tensas e Rodrigo angustiado.
Durante a noite Suzana dorme tranquilamente e Sônia não tem o sono tão profundo como de costume, acordando sozinha, sem precisar que ninguém a chame.
Ao sair do quarto, Sandra encontra Rodrigo e conversa com ele:
- Oi, Rodrigo.
- Oi, Sandra.
- Você tá gostando?
- Tô né...
- Ih...este tô não foi muito convincente.
- É...
- Rodrigo, você é persistente, cara. Outro no seu lugar já teria desistido.
- Ai...eu não sei por que, mas a Suzana pra mim é especial.
- Eu mesma não sei dizer o que aconteceu com ela. Minha mãe diz que isto é normal em adolescentes, mas eu acho que ela tá muito inconstante, não é mais a mesma que eu conhecia. Há menos de um ano a gente fazia desfiles de brincadeira no quarto dela, vestia camisolas, roupas de verão, de inverno. A gente era muito mais unida.
- Você acha que ela se afastou muito de vocês?
- Agora nem tanto, mas ainda não é como antes.
Todos são chamados para o culto matinal rápido que se dá antes do café da manhã. Novamente Suzana não consegue ficar. As primas vão atrás dela. Suzana senta num banco no jardim.
- Será que vocês não vão me deixar em paz? Eu não tô precisando de babás, não, gente! – Suzana reclama
- Suzana, não quer ficar no culto, tudo bem. Mas, você não se enturma, se isola. Tem gente legal aqui. Por quê não se acerta com o Rodrigo? – Sandra argumenta
- Até parece que eu tenho alguma coisa pra acertar com aquele cara!
- Sú, para de fazer queixo duro! Cê quer falar com ele, para de se defender tanto!
- Não tô me defendendo de nada nem de ninguém! Não me enche o saco!
- Você sai do culto como se fugisse de um monstro. Seja sociável. – Sandra aconselha
- Eu...eu não sei, me incomoda ouvir essas músicas. Acho chato.
- Sú, o pessoal é simpático. Eu e a Sônia tamos aqui, tio Vitor, tia Helena e nossos primos também ‘tão.
- É isso mesmo, Sú, não são todos estranhos curte o que tem de bom. – Sônia reitera
Suzana continua emburrada e lança um olhar de raiva para Sônia por ter dado força à Sandra
- Sú, - prossegue Sônia – a Sandra é tão sua amiga que tá passando por cima dos problemas dela.
- Eu... – Suzana fica sem graça – eu sei Sandra, desculpe.
- Por que você não se entende logo com o Rodrigo? – Sônia sugere
Mal Sônia acaba de falar, Suzana avista Rodrigo saindo do culto conversando animado com uma garota alta de cabelo meio cacheado castanho claro e irrita-se
- Ele tá muito bem acompanhado! - Suzana quase explode de ciúmes.
- Tá morrendo de ciúmes, hein? – Patty, que vem chegando mexe com Suzana
- Ciúmes, eu?! Tá me gozando, pirralha?! Ridículo!
- Se esqueceu que eu durmo no mesmo quarto que você?
- E daí?
- E daí, olha o que eu gravei na minha filmadora, Sônia.
- Deixa eu ver...ih...- Sandra também vê
- O que vocês estão vendo aí?! – Suzana fica irada, imaginando do que se trata. - Deixa eu ver!
- Não deixo! – Patty sai correndo e Suzana corre para alcançá-la levando vantagem, pois suas pernas são mais longas. Alcança Patty, mas esta joga a maquininha para as outras, para Ricardo e Renato. Suzana passa uma rasteira em Renato e agarra a maquininha quase caindo no chão. As primas, que já sabem, aguardam a reação de Suzana, rindo. Suzana se vê filmada dormindo, falando durante o sono: “Rodrigo...Rodrigo...”
- Sua pirralha! – grita para Patty, que corre para dentro, encontrando o pai numa sala
- Pai, me ajuda! – pede agarrando-o
- Andou aprontando, é?
- Tio! Eu mato esta pirralha! – Suzana ameaça
- O que você fez? - Vitor pergunta para Patty em tom de repreensão.
- Eu...eu... – Patty fica sem saber o que falar, pois sabe que será punida
- Esta pirralha...tio, eu não vou falar em público pra todos ficarem rindo de mim!
Depois de ser acalmada pelas outras primas, Suzana vai até a cozinha beber água, pois está com sede depois da correria. Vitor, depois de descobrir a brincadeira de Patty, diz a esta:
- Agora é hora de ir à piscina. A senhorita vai ajudar na cozinha.
- Mas pai...
- Se não obedecer, vai ser pior depois!
Patty vai para a cozinha ajudar quase chorando e nem se atreve a discutir com o pai. Enquanto isto, Ivan entra na cozinha, no mesmo momento em que Rodrigo entra para beber um copo d’ água. Suzana, para se vingar, pois está louca de ciúmes de Rodrigo, solta um agudo possante e quebra o copo. Rodrigo espanta-se:
- Que foi isto?!
- Que pena... – Suzana diz ironicamente
- Deixa eu pegar uma vassoura para varrer estes cacos – diz a senhora que cuida da cozinha.
De repente Suzana grita:
- Aaaai! Uma baraaaaaaaaaaaaaata! Mata! Mata! – implora para Rodrigo
- Calma! – Rodrigo recomenda
A barata fica mais próxima e Suzana atira-se nos braços de Rodrigo com medo
- Bendita barata! – Rodrigo, ri do desespero de Suzana, abaraçando-a
- Tá se aproveitando do meu medo, é? – Suzana irrita-se afastando-se dele
- É de borracha sua otária! – Ivan mostra a barata que era arrastada por um linha fina na sua mão
- Moleque! Te mato!! – Suzana vai atrás do primo.
- Vamos parar com esta correria! Que houve agora? – Vitor chama a atenção de todos
- Tio, este garoto é uma peste! Me assustou com uma barata de borracha! Paguei o maior mico por causa dele!
- Já passou Suzana. – Rodrigo argumenta. – Vamos trocar o “dedinho de bem”?
- Palhaço! Você achou graça!
- Tá, desculpa.
- Não desculpo!
- Ivan, nós vamos ter uma conversinha. – Vitor avisa – Você, Suzana, precisa se controlar. A brincadeira foi de mau gosto, mas você já tem 15 anos.
- Mas tio, ‘tão curtindo com a minha cara!
- Não tiro a sua razão, mas não exagera. Você chegou aqui na maior apatia. Não consegue nem assistir um culto, fica de mau humor. Todos estão preocupados com você.
- É? Se estão mesmo preocupados, por que aprontam comigo? Você acha que tá certo o que a Patty fez? O que este pestinha aí fez?
- Ele é seu primo, tem nome e será punido como a Patty também foi. Mas isto não é motivo pra tanto descontrole de sua parte. Você tá com uma raiva que as veias saltam do seu pescoço.
- Ah, tio! Não tenho sangue de barata! Tô aqui por que minha mãe me obrigou a vir! Quero ir embora! Tô cheia!
- Depois nós conversamos, Suzana. – Vitor fala com autoridade.
Suzana vai para o quarto e Vitor recomenda à prima Angelina que a observe sem que ela veja. Suzana fica emburrada, deitada na parte debaixo da cama triliche virada de lado, abraçando o travesseiro apoiado na cabeça, na horizontal. Sandra entra no quarto para chamá-la:
- Sú, vem almoçar.
- Não.
- Deixa de bobeira, garota!
- Não tô com fome, me deixa em paz!
- Tá. Fica aí emburrada. Tchau.
Patty fica chateada com o que fez e pede ajuda a Celinha:
- Celinha, papai ainda tá muito zangado comigo?
- Um pouco.
- Será eu eu posso falar com ele?
- Eu peço a ele.
Celinha chama o pai e Patty se explica:
- Pai, eu sei que você ficou zangado comigo, desculpa.
- Não foi exatamente zangado com você pelo que fez, mas da maneira como fez.
- É...eu não pensei que ia dar tanta confusão.
- Patty, a sua prima tá numa fase muito difícil. Eu a trouxe aqui para que ela se recupere. Ela é alcoólatra. Só que pra Deus não há impossível e ela vai sair desta. O que você fez a irritou porque ela se sentiu invadida, exposta. Ela gosta do garoto, mas não quer admitir.
- Ela tá toda emburrada no quarto.
- E vai continuar, por que é muito teimosa. Você é um pouco também, mas nós damos limite e amor também. O pai não é amoroso com ela. Quando ela ficou com a gente há pouco, você foi mais amiga dela.
- Mas eu sou, pai. Sabe que é, eu fiquei irritada como que ela pode fazer pouco do Rodrigo, que é tão legal, tão meigo, respeitador e não assumir que gosta dele...acho que eu quis dar uma lição nela.
- Mas não pensou nas conseqüências, né?
- É...
- Você esqueceu o geniozinho que sua prima tem? Bem comparável ao seu. Se vocês fossem irmãs, mesmo com as diferenças que tem, não seriam tão parecidas.
- Ah, pai, mas um ataque igual ao que ela deu, eu não daria.
- Não mesmo?
- Ah, pai!
- Bóia! – a cozinheira chama.
Todos vão almoçar menos Suzana. Depois do almoço, preparam-se para dar uma caminhada. Sandra vai ver como está Suzana e volta logo.
- E aí, não quer ir, né? – Vitor deduz.
- Nem cheguei a falar com ela. Tá lá na cama dormindo como um bebê.
- Então vamos deixar o bebê lá. – Vitor decide
- Ela vai ficar chateada tio Vitor. – Rodrigo argumenta
- Rodrigo, não paparica a Suzana. Ela precisa parar de se sentir tão importante. Já se demonstrou interesse por ela, já foi chamada pra almoçar e não quis. Vamos deixá-la refletir.
- Mas ela vai ficar sozinha? – Rodrigo pergunta com pena
- Minha prima Angelina vai ficar, ela toma conta dela.
O grupo grande vai caminhar e demora um pouco. Antes que cheguem, Suzana acorda e estranha o silêncio. Ao sair para fora vê Angelina e pergunta:
- Prima, cadê o pessoal?
- Saíram pra caminhar.
- Ninguém me chamou?
- Você tava dormindo.
- Pôxa! – Suzana vai para dentro batendo o pé.
- Eta geniozinho! – Angelina exclama baixo.
Pouco depois, Vitor volta com o grupo que havia saído para o passeio. Angelina fala para o primo:
- Primo, um “furacão” passou por aqui batendo os pés de raiva.
- Ah, o “furacão Suzana”?
- Exatamente.
Mal Vitor acaba de falar e Suzana aparece:
- Tio, vocês, hein? Vão passear e me deixam aqui! Tá um saco! Tô detestando!
Vitor não fala nada, mas olha sério, fixamente para Suzana e somente pergunta:
- Acabou?
- Acabou o quê?
- O “show”?
- Que “show”, tio?
- Que você está dando.
- Ah, que graça! Vocês me deixam aqui e eu tenho que engolir calada?
- Desde que você chegou só abriu a boca para reclamar. Se isolou, não quis ir almoçar. Se quiser se envolver em alguma atividade, manifeste o desejo.
- Eu não tenho nada pra fazer aqui, por isso que fiquei com sono.
- Então, já que descansou bastante, vai ajudar na cozinha.
- Quê?!
- Isto mesmo o que ouviu. A Patty também ajudou e o Ivan até ajudou a lavar uma das piscinas.
- Mas... eu não sei fazer nada de cozinha!
- Sabe sim. Quantas vezes você e suas primas já fizeram bolos?
- Mas, tio...
- Não tem “mas”. Você não reclamou que não tinha nada pra fazer?
Sentindo-se vencida, Suzana vai até a cozinha ajudar. A cozinheira ouve a menina fungando e pergunta:
- Tá chorando, gatinha?
- Não...é a cebola.
Passado algum tempo, Helena vai à cozinha e avisa:
- Suzana, já ajudou bastante. Agora vai lavar as mãos que daqui a pouco a gente chama pro jantar.
- Tá...
Ainda chateada, mas começando a reconhecer que está sendo antipática, Suzana, que há algum tempo não abria o seu diário, resolve fazê-lo, lendo neste as seguintes passagens: “Não sejais como o cavalo ou a mula, sem entendimento, os quais sem freios e cabrestos são dominados; de outra sorte não te obedecem” (Salmos 32: 9); “Pois quem quer amar a vida e ver dias felizes refreie a língua do mal e evite que os seus lábios falem dolosamente” (1 Pedro, 3: 10).
Rio, 31 de maio de 2002
Oi, seu diário chato.
Você me fala coisas que eu não gosto de escutar, mas gosto de você, porque depois só escuta as minhas queixas. Eu achei dura esta mensagem de cima, a gente ser comparada a um cavalo, mas a que vem depois complementa. Eu sei que estou sendo uma chata. Acho que não quero falar com Rodrigo porque tenho medo. Mas também, ele já se enturmou, eu não sei se ele gosta mesmo de mim. Eu senti uma atração forte por ele logo que o vi, confesso, pois fisicamente ele é muito atraente. Depois, gostei da pessoa, mas também acho ele meio confuso, apesar de parecer mais seguro que eu. Será que eu sou mais complicada do que penso? Voltando sempre à estaca zero, né? Só uso suas páginas pra me encher mais de dúvidas. Eu vou tentar refrear mais minha língua,mas não sei se vou conseguir.
Até lá, novas complicações.
Tchau,
Suzana
- Suzana, tá na mesa. Você vem? – chama Sandra
- Vou, pode ir que eu já vou.
Suzana guarda apressadamente o diário, muito bem guardado pois teme que alguém possa lê-lo. Depois, vai até o refeitório e senta-se à mesa junto com as primas. Patty aproxima-se:
- Sú, me perdoa, priminha. Eu magoei você.
- Tá Patty, deixa pra lá.
- Eu não faço mais isso, prometo. Posso sentar com você?
- Claro.
Suzana consegue relaxar mais durante o jantar e depois assiste ao culto com alguma resistência. Ao fim deste, chama Vitor.
- Tio.
- Oi?
- Me desculpa tá? Eu fui boba, chata.
- Vamos ter uma reunião com outros adolescentes e jovens agora. Quer ir?
- Tá.
Mesmo relutante, Suzana vai. Vitor senta-se à mesa no meio dos outros sentados em círculo e inicia:
- Em 1º lugar, agradeço a presença de minhas sobrinhas e dos queridos três primos que aqui estão e em rápidas palavras quero explicar que esta reunião é realizada com a direção do Espírito Santo de Deus. Nós lemos a Bíblia na linguagem de hoje que a Júlia vai distribuir para mim.
Júlia é a garota que Suzana viu com Rodrigo. Sente-se um pouco incomodada com sua presença, mas determina-se a ficar. Sorri amarelo para ela quando esta lhe entrega a Bíblia com um largo sorriso.
- ‘Brigada... – balbucia quase entre os dentes
- Nós vamos ler um trecho da Palavra de Deus, – Vitor prossegue – depois alguém poderá pedir a palavra e eu darei prioridade aos que estejam aqui pela primeira vez. Vamos todos abrir em Provérbios 23: 29 – 35. Vitor ora e depois inicia a leitura, lendo o primeiro versículo:
- Quem é que grita de dor? Para quem são as tristezas? Quem é que vive brigando e se queixando? Quem é que tem os olhos vermelhos e ferimentos que poderiam ter sido evitados?
- É aquele que bebe demais e anda procurando bebidas misturadas. – Júlia prossegue
- Não fique olhando para o vinho que brilha no copo, com a sua cor vermelha e desce suavemente. – Renato continua
- Pois no fim ele morde como uma cobra venenosa – Sônia lê o versículo seguinte.
- Você verá coisas esquisitas e fará tolices – lê Ricardo
- Você se sentirá como se estivesse no meio do mar, enjoado, balançando no alto do mastro de um navio. – lê Sandra
- E-então...você dirá: - Suzana dá uma pausa, com a voz embargada pelas lágrimas, mas consegue mesmo com dificuldade terminar – “Alguém deve ter batido em mim; acho que levei uma surra...mas...não...me lembro. Por que não consigo levantar? – lê alto, como se as palavras viessem diretamente de seus lábios – Preciso de...mais...um...gole... – Suzana desaba a chorar e Sônia também chora, consolada por Renato.
- Alguém gostaria de colocar alguma coisa sobre o que foi lido? – Vitor pergunta
- Eu! – Suzana se manifesta, pois sente necessidade urgente de extravasar.
- A palavra é toda sua querida. – Vitor a anima - Nós costumamos dar 10 minutos, mas quem está aqui pela primeira vez tem direito a mais tempo.
- Eu..eu...
- Não tenha vergonha de chorar, meu bem. – Vitor a apóia
- Tio, eu tô sentindo que isto foi pra mim.
- Não houve intenção de invasão. Nós trabalhamos com a recuperação seja na área que for. Eu adquiri uma experiência com o A. A. e adaptei a dinâmica feita lá com o respaldo da Palavra de Deus.
- Eu preciso falar...tô me sentindo sufocada! Eu tenho dado trabalho pra minha mãe! Ela deve estar me achando uma péssima filha! Que vergonha! Desde o Réveillon, eu comecei a querer descontar toda a minha frustração na bebida. Eu ouvi meu pai se queixar de mim. Fiquei tão revoltada que comecei a beber tudo que via na frente. Eu queria chamar a atenção dele, mas ele nem soube. Ele é tão frio comigo! Eu perdi o meu “filhinho”...e ele debochou de mim! – Suzana chora alto aos soluços.
- O “filhinho” dela era o Lalau, o cãozinho de estimação – Vitor explica para as pessoas surpresas.
- O meu pai sempre me odiou. Ele me virou a mão na cara há pouco tempo, quando eu tava de porre. Eu quis que ele visse, eu provoquei. Eu acho que dói mais a indiferença do que um tapa! Prefiro que ele me bata do que me ignore! – Suzana chora muito e não consegue mais falar. Sônia também chora e Renato a abraça. Vitor carinhosamente vai até Suzana que permanece sentada, a abraça e fala:
- Meu amor, se precisar sair pra lavar seu rosto, pode ir. Eu gostaria que voltasse depois, seria muito bom.
Suzana vai acompanhada por Sônia. Elas se abraçam e lavam seus rostos. Ao voltarem ouvem um testemunho:
- Meu nome é Júlia. Eu também gostava de beber e o vício foi mais intenso entre meus 16 e 17 anos. Eu vou fazer 19. Também não me dava nada bem com o meu pai. Ele me criticava e eu também descontava na bebida. Eu era muito agressiva com minha mãe. Um dia eu fui à igreja com uma amiga e aceitei Jesus. Desde então eu não bebi mais. Meu pai não mudou tanto, mas já tenho um relacionamento melhor com ele e com minha mãe, porque me relaciono bem com Deus, desde que aceitei O Filho d’Ele como meu único e suficiente salvador.
Após a reunião, Suzana acha: “É claro que o Rodrigo tá paradão naquela garota.” Referindo-se à Júlia.
- Suzana! – Júlia a chama.
- Oi. – Suzana vira-se e a olha sentindo-se derrotada, sem condições de competir com a suposta rival.
- Cê tá melhor?
- Tô... foi bobeira minha.
- Expressar os sentimentos não é bobeira. Você é muito sensível. É isto que o Rodrigo aprecia em você.
- Hein?! – Suzana fica perplexa – Ele falou isto pra você?
- Nem precisaria dizer. Ele não fala em outra pessoa a não ser você, desde que chegou.
- É?!
- Tá vendo como você se desvaloriza? Ele parece ser muito legal. Disse que você andava chateada com ele. Eu particularmente acho que você tem medo de ter uma amizade mais profunda com ele. Eu não costumo me enganar. Ele é um menino diferente, não se aproveita das garotas.
- Ele...andou vacilando comigo.
- Se ele vacilou deve ter se arrependido. Se não, não falaria de você com tanta ternura.
- Ternura?
- É. Ele disse que você é estourada, mas que por dentro desta pantera, tá uma gatinha dengosa.
- Pôxa...
- Ficou vermelha, hein?
- Ah, para! – Suzana ri sem jeito
- Suzana, alguém gostaria de falar com você – Vitor avisa. Logo depois aparece Rodrigo
- Suzana...meus parabéns.
- Ué...parabéns de que?
- Por ter tido coragem de botar pra fora seus sentimentos. Sensibilidade é uma qualidade.
- Eu tô meio sem graça. Eu tive vergonha de chorar.
- Você foi autêntica. Poucas pessoas tem coragem de expressar que precisam de ajuda, que sofrem. Eu quero também me desculpar se chateei você. Mesmo que eu tenha parecido intrometido é por que gosto muito, muito de você.
- Eu...também queria me desculpar. Eu fui grossa com você muitas vezes.
- Vamos esquecer, vamos recomeçar.
- É...a gente deixou que outras pessoas atrapalhassem.
- Bobeira da gente né?
- É... sabe que mesmo que tenha doído, aquela reunião me fez bem.
- Você precisava se abrir.
- É. Rodrigo, me desculpa, mas acho que foi tanta emoção que eu fiquei cansada. Vou tomar um banho e deitar. Amanhã será um novo dia. Boa noite.
- Boa noite.
Quando Suzana vai se virando de costas para ir para o quarto, Rodrigo a chama:
- Ah, Suzana!
- Oi? – responde ela virando-se para ele
- Bom banho! Sonhe comigo e não caia da cama!
- Ah! Você deve ter conversado muito com o tio Vitor! – Suzana ri, percebendo que o menino aprendeu as brincadeiras do tio.
- Com certeza.
- Tá Rodrigo. Amanhã a gente conversa mais, tá?
- Tá. – Rodrigo olha para lá com um olhar terno.
- Tchau... – Suzana despede-se.
- Tchau...- Rodrigo mantem o olhar fixo em Suzana e ela vai até chegar à porta do quarto andando de costas, também olhando fixo para ele. Rodrigo suspira e Suzana também, logo depois que entra no quarto encostada na porta.
- Alguém viu um passarinho verde. – Sônia observa
- É mesmo. - Sandra concorda
- Ah! – Suzana dá conta que as duas estão no quarto – Vocês tavam aí?
- Nós entendemos por que não nos viu. Tava sonhando acordada com seu príncipe encantado. – Sandra graceja
- Ah, para de “botar pilha!”
- Sú, eu vou mostrar uma coisa que o Rick gravou e que eu passei pra minha filmadora. – Sandra avisa
- O que?
- Vem aqui, num canto discretamente e controle-se, tá?
Suzana olha na filmadora e ri com Sandra. Ricardo gravou o primo Rodrigo dormindo, falando durante o sono:
- Suzana...Suzana...gatinha...
- Você tá vermelha? Ele é que vai ficar se alguém mostrar pra ele.
- Não faz isto. Fica entre a gente.
Suzana vai dormir feliz e novamente seu sono é tranqüilo. Sente que tirou um peso de si por ter desabafado na reunião. Sandra acorda durante a madrugada e vê a prima dormindo tranqüilamente.
- Mãe...te amo...tô com saudade... - Suzana murmura durante o sono
Na manhã seguinte Suzana e as primas vão assistir o culto. Embora não goste, Suzana consegue ficar até o fim. Pouco depois, todos vão para a piscina.
Na volta, no domingo ao cair da tarde, os respectivos “trios em R e S” conversam. Vitor deixa primeiro o trio masculino na Barra. Quando se despede das sobrinhas, deixa uma palavra de alerta para Suzana:
- Evite o primeiro gole.
- Vou lembrar disto, tio. ‘Brigada. Eu te amo.
- Também te amo muito.
Ao entrar e ver Soraya no jardim, Suzana joga-se nos braços da mãe:
- Mãe...que saudade, te amo.
- Vou mandar você pra fora mais vezes. – Soraya brinca com a filha observando seu carinho
- Ai...tanta coisa aconteceu. – diz Suzana
- Foi bom os meninos terem ido. – Sandra comenta.
- Claro que foi. – Heloísa concorda olhando com cumplicidade para a filha.
- Foi bom pra nós, sim, mas melhor ainda pra Suzana – conta Sônia – Ela e o Rodrigo se reconciliaram.
- Ah, Sônia! – Suzana fica ruborizada.
- É mesmo? – Soraya anima-se com a novidade.
- Temos uma “novela” pra contar. – enfatiza Sandra
- Com certeza com final feliz. – Soraya deduz
Suzana prepara-se para deitar quando ouve uns acordes de violão e vai até a janela. Para sua surprêsa, vê Rodrigo e os primos cantando. Embevecida ouve com atenção e tem a certeza dos sentimentos do garoto por ela.
- Ai......Você não existe cara! – Suzana –– grita para Rodrigo - Você foi inventado!
- Inventado pra você! – ele responde.
Os adolescentes apaixonados esquecem que é hora de deitar. Para isto, há sempre um jeitinho materno:
- Filha...filha! – Soraya chama Suzana
- Oi! Nem percebi você chegar.
- É natural. Você só tá vendo o Rodrigo na sua frente. Já é hora de deitar, você tem aula amanhã.
- Ah...deixa só mais um pouquinho.
- Só um pouquinho, mas deixa eu avisar aos cantores.
Soraya chega à janela:
- Meus parabéns! Que bom que ainda existe isto.
- Boa noite dona Soraya.
- Boa noite Rodrigo. Boa noite meninos.
- Boa noite – respondem os outros dois.
- Queridos, a idéia foi maravilhosa, mas amanhã todos vocês terão aula. Suzana tem que estar em forma pra treinar a coreografia que você tanto gostou, Rodrigo.
- Mãe... – Suzana fica sem graça.
- Com certeza. Posso cantar mais um número? – Rodrigo pede
- Só mais um, tá? - Soraya cede
- Tá. – Rodrigo aceita
- Tchau. – Soraya despede-se
- Tchau. – respondem os três.

segunda-feira, 24 de maio de 2010

CAPÍTULO XX

CRESCE A LUTA ESPIRITUAL
Dois dias depois do debut de Sônia, no domingo, o Trio em S vai ao Barra Shopping.
Enquanto isto, no hospital público para onde foi Daniel, um médico indaga a outro:
- Cadê aquele cara que chegou mal aqui na madrugada de 6ª pra sábado?
- Ah, já foi liberado.
- Ele tava bem?
- Parece que sim.
- Como assim, parece?
- Ah, colega, então você não sabe que estes drogados não têm jeito?
- Que visão mais pessimista!
- Pessimista não, cara! É tudo igual. Você cuida, eles melhoram, daí a pouco, na primeira esquina eles encontram um traficante e se entopem outra vez!
Daniel que saíra sem rumo, encontra um “amigo”, companheiro de noitadas.
- Dani, cara. Você por aqui?
- Oi...
- ‘Cê tá esquisitão, cara! Que houve?
- Tô precisado de um abastecimento.
- Cara, lá no Shopping tem um fornecedor que marcou comigo.
- Como é que eu vou pagar? Tô durão.
- Deixa comigo.
Ao chegar ao shopping, o que Daniel não esperava é que o fornecedor fosse alguém conhecido.
- Dani Castelli!
- Você?
- É, cara! E aí, tá me devendo, aquele celular não foi o bastante pra saldar a dívida.
- Cara, eu tô na maior fissura!
- Te vira!
- Peraí! – Dani avisa quando avista Sônia que no momento está sem as outras por perto.
- Sônia, - Daniel agarra a prima num ímpeto, - as meninas estão aqui?
- Estão numa loja aqui perto. – Sônia responde apavorada
- Não diz que me viu. Me dá substância, agora!
- Cê tá louco?
- Tô, tô sim e se você não me der eu te estrangulo aqui agora! Me dá este celular também!
Daniel tira todo o dinheiro que tem na bolsa de Sônia que fica paralisada. Daniel vai até o traficante.
- Tá aqui, cara. Não cobre tudo, mas ajuda.
- Vamos lá pra fora conversar.
- Cara, ‘cê tem que me arrumar um.
Lá fora, Daniel tenta negociar com o traficante que acaba cedendo:
- Eu enrolo o chefe. Te arranjo mais em troca de clientes.
- Falou.
Suzana e Sandra que estavam numa loja voltam. Sônia está estática, sem conseguir dizer uma palavra.
- Sônia, ‘cê tá estranha, o que houve? – pergunta Suzana assustada.
- É Sônia, o que foi? – Sandra também se preocupa.
- Gente...o...Dan... – Sônia não consegue dizer mais nada e desmaia.
- Sônia! – exclamam as duas juntas.
Suzana ajoelha-se e tenta reanimar Sônia enquanto Sandra pensa no que ouviu a prima tentar dizer.
- Suzana, ela viu o Dani. Ela tentou dizer o nome dele. Eu sei que o que ela viu não foi coisa boa.
- Sandra, não dá pra pensar nisto agora. Precisamos de ajuda.
Um segurança as ajuda a socorrer Sônia e juntos vão até o carro.
- O que foi? – Alfredo espanta-se ao ver Sônia desmaiada.
- Estamos tentando descobrir. – Suzana responde.
- Vamos pra casa, Alfredo. – Sandra pede. - No caminho eu conto.
No carro, Sônia volta a si e lembra-se do ocorrido. Conta às primas e chora muito. Sandra fica frustrada por não ter visto o irmão e conta o fato à mãe. Sônia também conta à Lúcia que lamenta por saber a que ponto Daniel chegou.
Suzana, a menos atingida com o fato, vai até às “dependências” de seu “filhinho”, levar sua comida:
- Lalau, filhinho, aqui tá o seu papá. – o cãozinho está de olhos fechados não se mexe.
- Lalau, acorda, filhinho... – o cãozinho continua imóvel e Suzana estranha, tocando-lhe, sentindo-o frio.
- Lalau...Lalau...Lalau! LALAU! Nãaaaaaaao! – Suzana chora desesperadamente não querendo acreditar que aquele animalzinho a quem dispensava tanto amor havia morrido.
- Suzana! – Alfredo ouve os gritos intercalados por soluços de Suzana. – Que foi filhinha?
Alfredo observa e entende o que ocorreu e abraça carinhosamente Suzana. Soraya também ouve e vem apressada
- Suzana! Que foi filha?
- O Lalau dona Soraya – responde Alfredo
- Vem, filhinha, vem com a mamãe. - Soraya entende e também abraça a filha, levando-a para dentro.
Suzana fica no quarto, deitada na cama, imóvel, sem dizer uma palavra, preocupando a mãe e às primas.
- Filha, não fica assim. – Soraya acaricia a filha, tocando-lhe na testa e percebe-a quente.
Soraya chama o médico que a tranqüiliza assegurando-lhe que trata-se de fundo emocional.
No dia seguinte, Suzana não vai à aula e no recreio, Rodrigo encontra Sandra:
- Oi, Sandra, a Suzana não veio?
- Ai, nem te conto.
- Que foi?
- Rodrigo, o Lalau, o “filhinho” dela, morreu ontem.
- Pôxa...
- Ela tá arrasada. Teve até febre, não dormiu direito, teve pesadelos, acordou aos prantos.
- Sempre que ela tá começando a reagir alguma coisa acontece pra derrubar. Parece até “encosto!”
- Ai, você também?
- Eu também o que?
- Meu tio Vitor, no aniversário da Sônia tava falando em diabo, você agora fala em “encosto!”
- Olha, Sandra, eu falei por falar, mas você não acha que existe o mal neste mundo?
- Ah, isto eu acho.
- Eu não posso afirmar que exista diabo com chifres, com tridente, orelhas pontudas vermelhas, mas o mal existe.
- Eu vejo tanta coisa ruim que continuo me perguntando se Deus existe mesmo.
- Eu vejo Deus em pessoas do bem, que superam os problemas com perseverança.
- Eu vejo os bons sentimentos nas pessoas, sim. No tio Vitor, na tia Helena, na tia Soraya, na minha avó Marisa na avó Dete. Também vejo isto em você, nos seus primos.
- Então, sua visão do bem tá melhorando!
- É, mas, sabe, Rodrigo, eu amo a Suzana, mas acho você muito paciente. Ela tá um saco.
- Dá um tempo pra ela, Sandra, ela vai sair desta.
- Você fala com tanta certeza que até me impressiona.
- Vai, sim. Sandra, pode ser que a morte do “filhinho”, tenha acontecido pra dar uma reviravolta na vida dela.
- É?!
- Ela jogava muito da carência dela pra aquele bichinho.
- Pior que sim. Ela tratava o Lalau que nem gente.
- Ela tem complexo de rejeição, tem medo de se entregar às pessoas. Ela sabe que pode contar com você e a Sônia, seu tio Vitor e outras pessoas. O problema dela é o pai.
- “Altas psicologias!” Olha Rodrigo, o papo tá bom, mas eu tenho que subir, o sinal tocou.
- Tchau! – Sandra despede-se.
- Tchau, Sandra.
Voltando da escola, Sandra vai primeiro para sua casa e depois vai até a casa de Genaro saber de Suzana Suzana sobe até o quarto da prima e chega perto dela que está deitada de lado na cama, imóvel.
- Sú...minha pantera linda...eu sei que ‘cê tá sofrendo, mas reage, sai desta cama, você tava criando uma coreografia linda pra gincana. Sai dessa, Sú.
Suzana olha para a prima, mas logo desvia o olhar como quem diz: “Você não me entende.”
- Pensa na sua mãe que perdeu a mãe dela tão cedo. – Sandra fala com mais firmeza - Compara sua situação com a dela. Minha mãe perdeu mãe e pai num espaço de menos de dois anos! Para de se sentir a pessoa mais infeliz do mundo, porque você não é! – Sandra olha a prima bem no fundo dos olhos. Esta fixa o olhar nela com uma certa revolta, mas não diz nada, pois no íntimo sabe que a prima tem razão.
Mais tarde, Soraya sobe ao quarto de Suzana e exige uma reação da filha:
- Suzana, filha, você já está bem, não está mais com febre. Amanhã vai pro colégio.
Suzana, que estava encolhida deitada na cama agarrando um travesseiro na horizontal e com outro que apoiava a cabeça, senta-se na cama e olha a mãe com espanto.
- Não fica com esta expressão indignada. Já deixei você viver seu luto. Agora, é andar pra frente.
Continuando a sentir-se indignada, Suzana deita-se bruscamente na cama, como em sinal de protesto, como quem não é entendida. Soraya não se abala, mantem-se firme e prossegue:
- Sei que tá se sentindo incompreendida, mas, ouça bem: não se joga a carência toda da gente num cãozinho de estimação.
- Não fala assim do meu filho! – Suzana protesta. Embora sentisse vontade de rir, Soraya segura-se sem se deixar levar pela reação da filha.
- Quer você aceite ou não ele era um cãozinho. Você vai à escola amanhã e vai continuar ensaiando a coreografia e voltar às suas atividades normais. A vida continua.
Mesmo indignada com a exigência da mãe, Suzana não perde o senso de justiça e cumpre suas ordens. Nos dias que se seguem, o seu estado de apatia no colégio preocupa professores e colegas mais chegados.
Sandra também demonstra a preocupação com o irmão e Ricardo a procura no período do intervalo na escola:
- Sandra, você não quer conversar um pouco? Desabafa, eu tô sentindo que você não tá bem.
- Ai, Rick! – Sandra abraça Ricardo encostando sua cabeça no ombro dele e chora.
- Chora que faz bem, não guarda, não, fala.
- Rick, eu tô cansada de ficar bancando a forte. Suzana tá fazendo o maior drama por causa de um cãozinho de estimação que morreu e eu sem saber do meu irmão, imaginando se neste momento ele possa estar vivo.
- Mas você contou que o viram no Shopping.
- Eu não vi, ele tomou dinheiro da bolsa da Sônia, tomou o celular e sumiu. Parece que tava fugindo de alguém.
- Uma pista você já tem. Se ele há poucos dias tava na Barra, não deve ter ido pra muito mais longe.
- Eu sei lá...no mesmo dia falei com meu pai, ele saiu de carro procurando o Dani, mas não teve o menor sinal dele. Já perguntou na faculdade, mas ou ninguém sabe, ou tá mentindo muito bem.
- Fico triste por você. Eu quero ajudar no que eu puder. Posso ajudar a procurar também.
- Você já ajuda muito me ouvindo. – agradece Sandra com um sorriso correspondido por Ricardo.
Ao chegar ao Solar, Suzana ia para o quarto, mas recua ao ouvir uma discussão próxima ao escritório de Genaro:
- A nova frescura dessa menina agora é aquele cachorro! – critica Genaro.
- Genaro, para com isso! Ela já foi ao colégio, tá reagindo. – Soraya argumenta.
- Já era hora de voltar pra escola! Vê se pode! Ficar com febre por causa de um bicho!
- Você, hein? Pensei que estivesse um pouco mais sensível. Como você é implicante!
- Eu não tenho saco pra estas coisas! Eu já tive e tenho cachorros e sempre tratei como cachorros!
- Não adianta argumentar com você, hein, Genaro? Por quê você insiste em ver tudo de uma maneira tão fria?
- Eu sou prático. Meu pai criou os filhos para enfrentar a vida! Eu não aceito na minha família um drama desses por causa de um animal! Era só o que faltava!
- Genaro, eu não vou ficar discutindo com você. Espero que ainda tenha a capacidade de refletir.
Soraya dirige-se à porta. Suzana deduz que ela sairá do escritório e apressa-se em subir.
Suzana sente um ódio profundo do pai. No quarto, pega o diário como uma válvula de escape, para despejar nele toda sua indignação. Lê as passagens: “Porque o que sucede aos filhos dos homens, sucede aos animais; o mesmo lhes sucede: como morre um, assim morre o outro, todos têm o mesmo fôlego de vida e nenhuma vantagem tem o homem sobre os animais; porque tudo é vaidade” (Eclesiastes, 3: 19); “O homem revestido de honrarias, mas sem entendimento, é antes como os animais que perecem” (Salmos, 49: 20), e começa seu relato escrevendo com raiva:
Rio, 24 de maio de 2002:
Eu tô cheia! Cheia das críticas do meu pai, cheia de tudo! Eu não posso nem sentir a morte do meu filhinho, fico engolindo os deboches, o desrespeito do meu pai! Te nho vontade de matá-lo! Eu odeio ele! Que saco! Eu tô aqui, chorando, mas ele não vai ter o prazer de me ver infeliz! Eu vou...
Naquele exato momento toca o telefone e Suzana atende com o tom de voz agressivo:
- Alô!
- Suzana? – Joana está do outro lado da linha.
- É.
- Tudo bem?
- Tudo...quer dizer....ah, desculpa Joana, não é nada demais, não. Alguma novidade? Você não me liga faz tempo.
- Eu gostaria de convidar você e as suas primas pra uma reunião aqui na casa da Glória, a minha prima em Ipa. Não tem hora pra acabar. Os pais dela deixaram, vão sair pra deixar o pessoal mais à vontade, desde que haja ordem.
- Ah...tá. eu falo com a minha mãe depois com as meninas.
Enquanto isto, Sandra em seu quarto abre seu diário lendo antes os trechos bíblicos: “Porque um menino nos nasceu, um filho sê nos deu; o governo está sobre os seus ombros e o seu nome será: Maravilhoso, Conselheiro, Deus Forte, Pai da Eternidade, Príncipe da Paz” (Isaías, 9: 6); “Já não falarei muito convosco, porque aí vem o príncipe do mundo e ele nada tem em mim” (João, 14: 30). Sandra inicia seu relato refletindo sobre o que leu:
Rio, 24 de maio de 2002:
Meu querido diário:
A Suzana tá vivendo ainda a perda do Lalau e eu apesar de entender, mesmo achando um exagero, tô noutra. Claro que eu já vivi perdas e sentiria a falta de um cãozinho de estimação, mas não desse jeito. Tudo é passageiro, mesmo o que é bom. Eu gosto de ser prática.
Outro dia, tio Vitor falou de Deus e eu confesso que tenho ficado muito descrente pelos últimos acontecimentos. Poucos dias depois, o Rodrigo que me parece ser neutro, me disse acreditar no mal. Isto me fez refletir, porque eu não rejeito o que os outros dizem, ainda mais se conheço a pessoa e sinto que tem uma boa visão da vida, das coisas. Agora eu leio estas passagens e me questiono: se existe este Deus, por quê Ele permite que este “príncipe do mundo” continue fazendo tantas maldades? Eu quero justiça, porque vejo tanta coisa errada! Onde estará o Dani? Me pergunto se neste momento ele tá vivo. Meu pai já tentou achá-lo e não conseguiu. Se Este Deus que tio Vitor, tia Helena e a minha avó crêem realmente existe, eu preciso de uma prova pra crer n’Ele, no Seu poder.
Te mais,
Sandra.
Com as autorizações de suas respectivas mães, as meninas vão à reunião. Soraya acha que a filha precisa se divertir. Soraya está lendo o jornal enquanto Genaro deita-se mais cedo por causa de uma reunião de negócios na manhã seguinte. O telefone toca e ela atende:
- Alô?
- Cunhada!
- Oi, Vitor, tudo bem?
- Tudo ótimo. Como é que está a Suzana?
- Ah, bem melhor. Aceitou até um convite de uma amiga pra ir a uma reunião com as meninas.
- Sei...eu estou ligando pra fazer outro convite.
- Diga.
- Neste próximo feriado que cai agora na 5ª feira, dia 30, as escolas vão enforcar, pelo menos a da Patty vai.
- A das meninas também.
- Pois é. Eu queria convidá-las para um acampamento que vai ter agora neste período. A ida vai ser na 4ª feira à noite e a volta domingo à tarde.
- Eu depois pergunto à elas se querem ir.
- Aguardo resposta até a véspera.
- Tá. Eu ligo. Boa noite, cunhadão. Tchau.
- Tchau.
Vitor desliga e Helena pergunta:
- E então, amor, como foi?
- Ela não deu certeza de nada, mas eu sei que elas vão, em nome de Jesus.
Daniel não estaria muito longe. Andando pela Barra, um colega da faculdade, Alexandre, o vê e o chama:
- Dani! Dani! Vem, cá, cara!– o rapaz impressiona-se ao ver Daniel com a aparência de quem não toma banho há alguns dias.
Daniel fica com medo, não sabe se recua ou se vai até o colega e fica quase paralisado quando ele chega.
- O que você quer comigo?! Eu não fiz nada!
- Que é isto, cara? Eu quero te ajudar.
- Você vai me entregar pra polícia!
- Não cara. Você precisa de um banho. Eu tô alugando um apartamento pequeno aqui perto, vamos lá.
Apesar de desconfiado, com os olhos arregalados de pânico, Daniel acaba cedendo ao colega que fala mansamente:
- Vem, cara. Não fica com medo, eu quero te ajudar.
Daniel permanece imóvel mas o colega com jeito o convence e o leva de carro ao seu apartamento.
Enquanto isto, Suzana e as primas estão em Ipanema, na reunião que Joana convidou. Suzana chama a atenção de um garoto, Tiago, amigo da anfitriã. Tiago não tira os olhos de Suzana e pergunta a um amigo:
- Conhece aquela “gataça?”
- Não.
- Olha, se ela não tiver namorado, vai passar a ter. Se tem, vai ter outro agora.
Tiago se aproxima de Suzana e os dois conversam. Joana comenta com a prima:
- Glória...a Suzana e o Tiago ‘tão num papo animado e eu chamei o garoto que tá a fim dela, o Rodrigo.
- Deixa, ué...a coisa vai ficar mais quente!
- Glória! O garoto é legal. Ele vai ficar magoado.
- Mas Joana, ele tá namorando a garota?
- Não, ela gosta dele mas é insegura. Por isso eu convidei o Rodrigo, pra ver se os dois se entendem.
- Mas eles já se conhecem há algum tempo e não rolou nada?
- Eles são diferentes, né, Glória?
- Eu acho que ele é um otário e ela tá investindo. Dei muito mais ponto pra garoto que não ficou esperando muito.
- Existem exceções. Se eu conhecesse um garoto como o Rodrigo, que gostasse de mim, eu daria muito mais chance a ele. Falo pela experiência que tenho hoje. Você fala assim porque nunca gostou realmente de alguém.
- O negócio mesmo é “ficar”. Tudo bem que essa garota não queira, mas ela não é mais criança.
- É? Ela só tem 15 anos.
- Menina...eu pensei que ela tivesse no mínimo 17!
- Ela já aparenta mais idade e tá usando salto alto e a roupa, maquiagem.
A conversa continua mais animada e a música convidativa à dança. Suzana e Tiago dançam músicas agitadas e...lentas, o que propicia um clima entre os dois que dançam abraçados e neste intervalo vão para perto da janela para conversar mais livremente. Tiago fica fascinado por Suzana e ela gosta de ser cortejada.
- Tá vendo lá? Tem um barzinho, vamos lá?
- Mas eu tô com as minhas primas.
- Ah, deixa elas pra lá, gata! Vamos curtir.
- Mas...como é que a gente vai sair assim?
- Ninguém vai notar. Tá escuro. A gente sai pelos fundos.
Sem ser notados, os dois silenciosamente saem pelos fundos. Joana dá pela falta dos dois e pergunta à prima:
- Cadê a Suzana? Não tô vendo nem ela nem o Tiago.
- Acho que os dois saíram.
- Mas...aonde será que eles foram?
- Ah! Devem ter ido perto.
Joana corre até a janela. Como está no 2º andar, vê Suzana e Tiago dirigindo-se ao barzinho. Procura Sandra e conta aonde Suzana e Tiago foram. Poucos minutos depois, chega o “trio em R”. As meninas cumprimentam seus pares rapidamente e pedem ajuda a Rodrigo:
- É aqui perto? Eu vou lá – Rodrigo mostra-se decidido
- Vê lá hein, Rodrigo, não vai arranjar briga com o cara. – Sandra alerta
- É bom ele ir mesmo! - uma garota na festa apóia - Ele já namorou a minha prima. Aprontou muito com ela.
- Já tô indo. – Rodrigo dirige-se para a porta, como se não visse mais ninguém nem nada em sua frente.
- Acho melhor a gente também ir lá. – Ricardo decide.
- Vamo nessa! – Renato concorda imediatamente.
Na porta do bar, Rodrigo recomenda aos primos:
- Me esperem aqui embaixo. É mais garantido. Se ela tentar escapar de mim, vocês ajudam.
Rodrigo sobe e não vê Suzana. Fica procurando e resolve esperar um pouco. Numa mesa no canto, Tiago conversa com um amigo que encontrou:
- Tiago, você tá namorando aquela gata que foi ao toalete?
- Quase. Tô investindo.
- Cara, cê sabe quem é ela?
- Por quê? Tô ignorando alguém importante?
- Você já ouviu falar na CASTELLI EMPRENDIMENTOS, do empresário Genaro Castelli? Ela é filha do cara.
- Você a conhece há muito tempo?
- Eu fui no início do ano à festa de 15 anos dela.
- Cê tá me dizendo que aquela “escultura”, aquela “obra prima”, aquele “manjar dos deuses”, tem só 15 aninhos?
- Disfarça que ela tá voltando.
Rodrigo esconde-se num canto, observando e repara que Suzana está meio tonta.
- Oi. – Suzana cumprimenta o amigo de Tiago.
- Este é o Wagner, esta é a Suzana – Tiago apresenta os dois, fingindo não saber que se conheciam. Suzana a princípio não se lembra de Wagner, mas tem idéia de já tê-lo visto antes.
- Você...eu já o vi em algum lugar.
- Claro, eu fui ao seu aniversário. Nossos pais se conhecem. Meu pai é o Davi Zenatti, empresário.
- Sei...
- Você tá bem? Seus olhos estão tão vermelhos – Wagner pergunta
- Se você não tá bem, podemos ir embora. – sugere Tiago um pouco preocupado.
- Agora que eu cheguei?! Eu vou é curtir muito! – Suzana fala alto, chamando a atenção de todos. Rodrigo não se contem e vai até ela.
- Suzana, v’ambora. – Rodrigo intima
- De onde é que você veio? – Suzana espanta-se ao vê-lo
- Eu fui convidado pela Joana.
- Esta agora! Cai fora, cara!
- Cara, você ouviu, te manda! – Tiago ameaça.
- Ah, é? Eu vou chamar tua mãe aqui! – Rodrigo adverte Suzana
- Cara, deixa a garota em paz! – Wagner também toma partido.
- Ih, qual é? A garota é menor, vocês deixam que ela tome um porre e ainda querem briga, é?
Também escondidos, Ricardo e Renato resolvem intervir em defesa do primo.
- Se é pra brigar, a gente entra na briga também! – Ricardo se manifesta.
- Não seja por isto! – Tiago levanta-se
- Cara, ‘cê não conhece o pai da garota. - Wagner, argumenta, sussurando ao ouvido de Tiago
- Esta agora tá boa! – Suzana ironiza – Vou ser disputada!
- Vamos parar de encrenca ou eu chamo a polícia! – avisa o dono do bar. – Se mandem daqui agora!
Todos são obrigados a sair e na rua, a discussão recomeça:
- Agora estamos na rua, cara! – Tiago desafia novamente.
- Cê tá mesmo a fim, hein? – Rodrigo não se intimida.
Wagner, tenta separar os dois que começam a brigar assistidos por uma platéia inerte na rua. Alguns, por medo, outros divertindo-se com o fato. Preocupada, Joana aparece com Sandra e Sônia:
- Gente, por favor, para com isto! – Joana pede
- Para gente! – Sandra reforça o pedido também aos gritos – É tudo culpa sua! – Sandra repreende Suzana, que tonta pela mistura que bebeu quando estava no banheiro do bar, já não consegue dizer nada e cai ao chão.
- Suzana! – Sônia grita
- Para! A Suzana desmaiou! – Joana grita com os rapazes, que encerram a briga. Rodrigo a pega no colo e leva para o apartamento de Glória.
- É mole?! Essa garota não podia escolher outra festa pra estragar, não? - Glória reclama
Sandra dá uns tapas em Suzana para reanimá-la, começando a bater de leve, depois com mais força.
- Ai! Que saco! - Suzana acorda, reclamando dos tapas
- Gente, me ajuda aqui – Sandra chama as outras para levantarem Suzana que está mais pesada devido ao seu estado e a levam para o banheiro. Sandra ajudada pelas outras, joga água no rosto da prima que grita:
- Para! Saco! – Suzana fica cada vez mais furiosa.
- Ô garota, dá um tempo! – Glória adverte. – Com esta altura toda, agindo como uma criança! Você hein, Joana?! Convida cada uma!
Saindo do banheiro, Suzana, raivosa, desconta em Rodrigo:
- Você tinha que aparecer, né?! Te odeio! – tenta avançar no garoto sendo segura pelas primas e por Joana.
- Eu fiz o que achei certo. – Rodrigo responde firme, seguro, com o olhar fixo em Suzana.
- Te mete com tua vida, cara! Eu te odeio! TE ODEIO!! – Suzana chora de raiva, mas Rodrigo não se abala.
- Você pode até estar com ódio de mim, mas ainda vai me agradecer. – Rodrigo continua seguro
- Vai esperando! Deitado, pra não cansar! – Suzana fica ainda mais raivosa.
Alexandre consegue contactar com Paulo pelo telefone, informando que Daniel está em seu apartamento.
- E aí, cadê ele? - Paulo pergunta ao chegar
Alexandre faz um sinal de silêncio com o dedo, alertando que Daniel pode ouvir e depois sussurra:
- Ele tá lá no quarto dos fundos. Espera que eu vou chamar.
Ao entrar, Alexandre tem a impressão de que Daniel está deitado, pois vê um volume debaixo das cobertas.
- Dani...Dani... – chega perto, cutucando-o de leve, mas para sua surpresa, Daniel não está lá.
- Que foi? – Paulo pergunta quando Alexandre volta à sala
- Dr. Paulo, me desculpe, mas eu acho que o Daniel deve ter ouvido o meu telefonema escondido ou percebeu alguma coisa. Ele fugiu. Mas ele não deve ter ido muito longe. Podemos procurá-lo.
- Tá, quem souber primeiro avisa o outro.
As três primas no início da manhã são levadas para casa por Alfredo. Suzana dorme durante o percurso. Quando chegam, Soraya que havia acordado mais cedo percebe pelos olhos vermelhos da filha que está de ressaca.
- Oi mãe... - Suzana fica sem graça ao vê-la.
- Oi, mãe?! É só isto que tem a dizer? Francamente! Vendo você assim, eu me segurei; primeiro, tive vontade de te trazer arrastada pelos cabelos; depois, quis te dar umas palmadas; por fim, quase te dei uns puxões de orelha! Eu acho vergonhoso querer tratar você como criança, tanto pra você quanto pra mim!
- Me perdoa, mãe. – Suzana tenta chegar perto, mas Soraya é dura e recua.
- Não tem refresco não, senhorita! Suba, tome um banho e vá pra cama curar esta ressaca! Vê se não faz barulho pra seu pai não acordar! Mais tarde nós conversamos e vou impor a você os devidos limites que está precisando!
Suzana dorme até a tarde. Acorda deprimida com dor de cabeça e espera a sanção da mãe, que comunica:
- Suzana, até segunda ordem, está proibida terminantemente de ir à qualquer festa! Ai de você se desobedecer!
No colégio na semana que se inicia, alguns colegas são cruéis com a menina, pois estiveram na festa na qual se deu sua última bebedeira. Uma colega conta à Luciana, na hora do intervalo:
- A Suzana na festa da Glória, prima da Joana. Saiu escondido com um garoto que tava lá, foi a um barzinho e tomou o maior porre!
- Ela é uma beberrona, mesmo! – Luciana zomba sem saber que Suzana está perto ouvindo e surpreende-se quando é agarrada por esta pela blusa.
- Vou te fazer engolir o que falou, sua cretina! Você é a última que pode falar!
- Ih! Me solta!
- Sua falsa! Te arrebento a cara!
Sandra, Sônia seguram Suzana enquanto outras separam Luciana dela. Hermínia percebe o tumulto e ordena:
- Suzana e Luciana! Vão pra minha sala agora! Sônia e Sandra e vocês que assistiram a briga, venham também!
Depois de tudo explicado, Hermínia determina:
- Vão ficar depois da hora e suas mães serão chamadas. Desta vez darei uma chance, mas na próxima serão suspensas.
Soraya volta com Suzana que ficou depois da hora e passa-lhe uma repreensão:
- Só faltava esta agora! Mas você vai se imendar! Ah, se vai!
- Eu tô cheia!! – Suzana sobe de carreira as escadas sem ouvir Soraya
- Suzana! Volta aqui, menina!
No quarto, Suzana tem uma crise, jogando as coisas no chão, gritando. Soraya, enérgica, bate na porta:
- Abre ou eu arrombo esta porta! Eu chamo o Alfredo!
- Me deixa em paz!
- Abre a porta! Não sabe mais se controlar? Será que vou ter que chamar um médico pra te dopar?
Suzana abre, mas olha para a mãe com revolta.
- Eu tô cheia do meu pai! Só me critica, só vê defeitos em mim! Eu quero morrer!
- Para com isso, Suzana!
- Eu não agüento mais! – Suzana berra e chora, completamente fora de si e jogando as coisas no chão novamente, fazendo uma cena e Soraya toma uma atitude. Como é contra bater, joga-a na cama, segurando seus braços com as mãos e seu tronco entre as pernas.
- Me solta, mãe!
- Não! Só quando você se acalmar!
Suzana tenta reagir, mas não tem coragem de desrespeitar a mãe. Chora mais ainda sem o menor controle.
- Mãe, eu vou ficar quieta, prometo. – Suzana sente-se vencida.
Vendo que ela não vai reagir, Soraya a solta e pede que Odete fique com ela enquanto liga para Vitor. Após a breve conversa com o cunhado, Soraya fala com Suzana:
- Suzana, você vai a um retiro com seu tio Vitor no próximo feriado.
- Quê?!
- Isto mesmo. Você vai ter tempo pra poder refletir num local tranqüilo.
- Mas mãe...
- Suzana, não tem mas, você vai. Suas primas podem ir com você se quiserem, seu tio convidou todas.
- Eu não quero ir!
- Tem outra opção: fica na casa da sua avó, mas pra lá irá sozinha.
- Saco... – sussurra de raiva entre os dentes.
- Quê?
- Não...nada.
- Então, está resolvido. Você vai com suas primas e seu tio.

segunda-feira, 17 de maio de 2010

CAPÍTULO XIX

O DEBUT DE SÔNIA
Para os 15 anos de Sônia, novamente é requisitado o buffet de Elisa. Lúcia, mãe sempre dedicada, cuida dos detalhes. Sérgio vem mais cedo de sua última viagem e Marisa, cumprindo mais uma promessa, vem ao debut da neta.
Sônia recebe rosas rosa, e um cartão com os dizeres: “Rosas para uma rosa que floresce”, enviadas por Renato.
Ivan sente-se ridículo por ter que usar um traje a rigor e ter que dançar com a irmã a valsa.
Apesar do tempo não estar muito firme, o Solar é protegido para uma esperada chuva e os dois salões devidamente ornamentados sendo o maior reservado para o momento da valsa.
Sônia abre o diário para relatar este momento tão importante de sua vida, lendo antes as seguintes passagens bíblicas: “Quem é esta que aparece como a alva do dia, formosa como a lua, pura como o sol, formidável como um exército de bandeiras?” (Cântico dos Cânticos, 6: 10); “Volta, volta ó sulamita, volta, volta para que te contemplemos”. (Cântico dos Cânticos, 6: 13).
Rio, 17 de maio de 2002:
Meu querido diário:
Hoje eu faço 15 anos. Estou tão feliz que nem consigo descrever. Tantas pessoas queridas vão estar na festa! A mais importante delas, claro, é o meu pai, pois ele vai passar depois de muito tempo um fim de semana inteiro comigo. Ele continua viajando muito, por isso a presença dele é tão especial. Meus avós vieram ontem à tarde de São Paulo e minha avó Marisa chegou um pouco antes do meio dia com a avó Tonha e a prima Angelina.
Achei as passagens que li bem a propósito da ocasião, se bem que não me acho tão formosa assim. Recebi flores do Renato e amei. Uma das melhores coisas no fim de 2001, foi tê-lo conhecido e os seu primos também. Eles são muito diferentes dos outros. Quero ver se a Suzana se acerta com o Rodrigo e a Sandra, - que parece estar se entendendo muito bem com o Ricardo – saiba notícias do Daniel. A felicidade delas também é a minha felicidade. Elas para mim são mais do que primas, são mais do que irmãs. Se nós fôssemos irmãs, talvez não nos déssemos tão bem. Meu irmão Ivan não se dá tão bem comigo. Eu até tento, mas ele continua desligado nos joguinhos. Minha mãe o proibiu de jogar durante a semana no computador, recolheu os joguinhos e só entrega nos fins de semana. Ele têve notas vermelhas, ela ficou uma fera! Tenho que reconhecer que pelo menos quando eu sofri o acidente ainda no começo do ano, o Ivan foi mais atencioso.
Amanhã depois da festa conto mais novidades.
Tchau,
Sônia.
Apesar do tempo um pouco chuvoso, tudo sai bem. Sônia chega com um vestido rosa claro e uma tiara de flores artificiais rosa.
- Lolô, a Sônia tá tão linda! - Elisa comenta com Heloísa
- É...
- Tá tudo bem, Lolô?
- Bem...você sabe, né?
- Lolô, eu creio num Deus de milagres. O seu filho vai voltar e Deus vai mudar tudo isso.
- Ah, Elisa, esta conversa não me convence!
- Aí é que tá o seu mal, Lolô. Você só ouve o que você pensa. Você culpa o Paulo, mas é tão culpada quanto ele. Eu tô falo isso pra você acordar. Pra Deus não existe impossível e afirmo que o Daniel vai aparecer.
Naquele exato momento, a máfia do tráfico reunia-se e o chefe inquiria seus subordinados:
- Como é? Ainda nada do Dani Castelli?
- Nada chefe. - Responde um dos homens.
- Mas vocês não ligaram pros números que têm no celular?
- A gente ligou pra mais outros, mas ainda não conseguimos, vamos continuar insistindo. Tem número fora de área, outros não atendem. – informa outro.
- Um cliente como este eu não perco! Ele hoje é fissurado, é de família rica e eu já fiz um bom dinheiro com ele!
- Mas tem outros que dão mais lucro chefe. – argumenta o primeiro.
- Eu tenho um plano para atraí-lo, mas primeiro eu tenho que saber onde ele está. Continuem tentando pelo celular e indo aos pontos que ele ia. Ele ainda vai implorar pela droga e eu coloco o meu plano em prática.
- Qual é o plano, chefe? – pergunta o segundo.
- O segredo é a alma do negócio. Primeiro a gente acha o cara, depois inicia o plano.
Na festa, o celular de Sérgio toca. Ele olha o número e vai para um lugar mais silencioso no jardim e atende:
- Eu já disse pra você não ligar pra este número! Eu já a coloquei num plano de saúde. Eu deixei dinheiro, não diga que já gastou todo! Mas como é possível? Eu vou praí na 5ª feira. Eu tenho que desligar, é aniversário da Sônia, eu não posso falar muito tempo. Quando puder eu ligo, tchau.
Edú sempre deslumbrado, está na festa, com funcionários da MEGA MÍDIA e Márcia e comenta com ela:
- O cara tava nervoso, hein, Márcia?
- O “cara”, Edu, é o pai da aniversariante. Você é tão deslumbrado com o ambiente que esquece da etiqueta!
- Ah, mas eu não o chamei de cara na frente dele, eu só comentei com você!
- Mas é daí que começa. Se você se habitua a falar assim, não se acostuma a falar mais polido.
- Tá “professora!”
Naquela noite de chuva, Daniel encontra um amigo.
- Cara, você por aqui? Por onde você andava, Dani?
- Pelas esquinas, pelos bares, na maior fissura, em todos os lugares.
- Ih, rimou... ‘cê tá “no transe?”
- Tô...demais...consegui um bônus especial ‘inda agora...
- Com quem?
- Uma “amiguinha” me forneceu.
- Tem mais aí?
- Infelizmente não.
- Eu sei onde podemos arranjar mais, vem comigo.
- Já tô nessa! Que chuvinha boa, hein?
Daniel se coloca em local descoberto e molha-se todo.
- Cara... ‘cê tá na maior, mesmo, se você se visse agora no espelho...Tá um pato!
- Tô pronto pra fazer “qüen qüen”!
- ‘Cê vai fazer muito mais do que isto onde eu vou te levar, lá é liberado.
- Que é que nós ‘tamos esperando, então?
- É isso aí Dani, “vamo nessa”!
- Rumo à aventura, “esquiando na neve quente!”
Lúcia, na expectativa da volta de Sônia que fôra trocar de roupa, pergunta à Soraya:
- Você viu o Sérgio?
- Vi, ele tava falando no celular, lá num canto do jardim.
- Daqui há pouco é a valsa.
- Ele sabe.
- Soraya, pena que o tempo não ficou bom.
- Mas a gente se preveniu, graças a Deus tá tudo saindo bem.
- Eu fico tão nervosa numa ocasião destas.
- Não esquenta. A Elisa dá conta do recado, tá tudo sob controle.
- É, mas o Sérgio tá tão tenso!
- Os benditos negócios! O Genaro também tem fases que fica insuportável!
- Mas o Sérgio é diferente, ele reprime mais os sentimentos, a gente nota nas expressões, no andar agitado.
- Ele precisa tirar umas férias grandes. Quando eu fui na última viagem com o Genaro a São Paulo apesar de ser a negócios tivemos períodos de descanso, conversamos. Isto faz falta ao casal.
É dada a introdução da música que anuncia a chegada de Sônia que agora aparece com um vestido branco com mangas curtas bufantes, num estilo parecido com o que Suzana usara em seu debut. Esta última e Sandra aparecem também de longos brancos segurando flores também brancas, juntamente com Patty e outras meninas como damas.
Inicia a valsa e os pares vão se encontrando. Primeiro, Sônia valsa com o pai, depois com Ivan e finalmente com Renato. Os outros pares dançam além dos respectivos maridos e esposas do Solar Castelli, – com exceção de Heloísa e Paulo – Sandra valsa com Ricardo e Suzana com Rodrigo, pois este sabe que a menina não recusaria em público. Depois da valsa e do tradiconal PARABÉNS PRA VOCÊ, Rodrigo f ala com Suzana:
- Suzana, vamos pra outro canto pra conversar.
- Tá chovendo.
- A gente passa por onde tá coberto, não arranja desculpa. Não tá chovendo tanto assim.
Os dois vão para um local mais afastado do jardim. Soraya observa e comenta com Heloísa:
- Acho que agora os dois se entendem.
- Tomara.
- Fala. - Suzana permanece numa postura de quem espera ouvir, não dando a perceber sua ansiedade.
- Eu...eu sei que você deve estar chateada comigo.
- Eu? Chateada? Por que? – Suzana dá de ombros querendo parecer que não se importa.
- Suzana, depois da competição você nem quis falar comigo, antes já não me procurava e o Bruno tava sempre atrás de você.
- Você nem precisou de mim. Aquela perua tava lá te consolando depois que se machucou. O Bruno nem tá aqui.
- Eu sei por que, mas isto não vem ao caso. Eu quero me desculpar por não ter dado a você o devido valor.
- Você deu ponto pra Adriana.
- Dei, não nego.
- Ela tava na sua cola, vai me dizer que não rolou mais nada?
- Bem...quase.
- Como quase?!
- É que...eu estive com ela, mas não cheguei a avançar demais.
- Ah...não chegou a avançar demais?! Então quer dizer que você chegou a ter intimidade com ela?
- Bem...
- Sim ou não?!
- Bem, eu...
- Não precisa dizer mais nada! Não quero mais ouvir!
- Suzana!
Suzana explode de ciúmes, embora não queira admitir. Sai correndo de perto de Rodrigo que tenta detê-la.
- Suzana, deixa eu explicar.
- Não tem nada o que explicar! Você é igual a todos!
- A todos, como? Como o Bruno?
- Por que como o Bruno?! – Suzana assusta-se e no íntimo sente-se culpada, porque sabe que chegou a dar liberdade para Bruno aproximar-se mais dela.
- Suzana, eu também tenho sentimentos. – Rodrigo fala segurando-a firme no braço
- Quer me largar! Não te dou o direito de fazer isto! – Suzana tira bruscamente o braço da mão de Buno.
- Tá...desculpa, mas eu quero só que você entenda...
- Entenda o que?
- Suzana, eu gosto de você! Eu...eu te amo!
- Ama o que! Você deu ponto pra aquela biscateira! Me deixa em paz!
- Suzana! Suzana!
Suzana corre de Rodrigo. Soraya vê e pergunta:
- Que foi Rodrigo?
- Dona Soraya, desculpa.
- Desculpa o que meu filho?
- Eu...pôxa...
- Vamos entrar pra conversar.
Soraya entra com Rodrigo e Suzana, chorando, está com Vitor que a consola.
- Bem, acho que vamos poder esclarecer melhor as coisas já que estão os dois aqui. – diz Soraya.
- Eu não quis me meter, a Suzana tava triste e procurei saber o que aconteceu. – Vitor explica-se.
- Você não está se metendo. Nestas situações, principalmente, ajuda muito cunhadão. – Soraya tranqüiliza Vitor – O que houve, gente? Não tenham vergonha de falar. Estamos aqui pra ouvir e ajudar.
- Dona Soraya. Eu não fui correto com a sua filha. Eu me deixei envolver por outra garota.
- Pela Adriana. A atração falou mais forte?
- É...
- Você ainda não sabe muitas coisas da vida, mas aprendeu uma lição. Se você quiser namorar minha filha, eu não me oponho. Você é um ótimo menino. Não vou julgar você. Se antes não foi correto, agora seja. Vocês tem uma vida pela frente. Se não der certo, podem ser amigos.
- A minha sobrinha está magoada, - Vitor pocura ajudar – mas ela é uma menina de bons sentimentos. Ela gosta de você, mas precisa perdoá-lo.
- Você tá arrependido por ter se envolvido com a garota, Rodrigo? - Soraya pergunta.
Rodrigo faz que sim com a cabeça e ainda acrescenta:
- Muito.
- Suzana, você também não se arrepende de ter dado confiança pro Bruno? – também pergunta para a filha.
- Ai...eu...pôxa...Tô me sentindo num tribunal!
- Não tem razão pra se sentir assim, nós te amamos muito e só queremos o seu bem. – Vitor argumenta. – Eu gostaria de não ter que opinar tanto. Acho que seu pai é que deveria estar participando da conversa.
- Ah, tio, meu pai não me entende!
- Podemos começar a quebrar esta barreira.– Soraya propõe - Assim que puder vou falar com ele.
- Gente, eu não quero falar agora. – Suzana se esquiva - Eu tô tão confusa!
- Eu só quero que primeiramente você perdoe o Rodrigo. – Soraya pede.
- Tá, eu perdôo.
- Olha pra ele e diz isto. – Soraya insiste
- Eu te perdôo, Rodrigo.
- Ele deve ter se sentido magoado com você também. – Vitor pondera
- Eu não tô com raiva dela.
- Você parece ser bem mais compreensivo que ela. – Vitor reconhece
- Não vamos apressar as coisas. – diz Soraya - Eu gostaria muito que o Rodrigo voltasse a vir aqui como antes. Até hoje não conheço seus pais.
- O meu pai tem ido muito a São Paulo. Eu tenho um irmão lá.
- Pôxa...eu e Genaro estivemos lá. Na grande São Paulo, mesmo?
- É.
- E a sua mãe?
- Ela ficou uma temporada em São Francisco, onde mora minha irmã, depois foi pra São Paulo com meu pai, voltou pra São Francisco e vai voltar pra cá em junho.
- Então quando chegarem, vamos nos conhecer. Vamos voltar pra festa, gente? – Soraya convida.
Sônia estava entretida dando atenção a vários convidados, mas nota pela falta de Suzana e pergunta a Renato:
- Rê, cadê a Sú, o Rodrigo?
- Eu vi os dois saindo juntos prum canto do jardim.Acho que eles estão se entendendo.
- Tomara.
- Agora tô pensando mais em você. O aniversário é seu, mas eu ganhei o presente: dançamos a valsa. Você tá tão linda...Eu...eu queria dar mais um presente.
- O que?
- Isto. – Renato mostra uma caixa, Sônia abre e vê pulseirinha de ouro.
- Ai...que linda! Rê...que emoção... ‘Brigada... – Sônia agradece dando um beijo no rosto de Renato e ele coloca-lhe a pulseira.
- Este seu jeitinho tímido me encanta. Você é minha bonequinha. Hoje também é muito importante pra mim.
- Tá sendo o meu melhor aniversário.
Do outro lado do jardim, Vitor fala com Genaro.
- Enfim o terceiro “debut”.
- Ano que vem é a Patty, né?
- É. Já estou me preparando.
- Falta mais de um ano.
- É, mas a gente já vai pensando bem antes. Você parece estar mais disposto depois da viagem com a Soraya.
- É, foi muito bom. Precisava estar mais com ela.
- Você já reparou que sente ciúme de sua mulher com sua filha?
- Por que diz isto?
- As duas têm muita cumplicidade. Tinham até mais, só que a Suzana se afastou um pouco da mãe sentindo-se culpada. Depois fechou-se mais e afastou-se das primas também. Genaro, o que você acha do Rodrigo?
- Um excelente garoto.
- Ele gosta muito da Suzana.
- Mas ela não se decide.
- Genaro, eu amo a Suzana como uma filha, mas você é o pai dela. Ela tem muita insegurança, foi pelo caminho errado quando deu abertura para um menino sedutor como aquele Bruno e o Rodrigo se afastou.
- Mas a Soraya falou que o Rodrigo andou interessado noutra menina que havia conhecido em Angra.
- Pois é, mas ele reconheceu que não gostava dela, estava confuso e agora há pouco a Suzana falou comigo da insegurança que tem de deixar o Rodrigo namorá-la. Acho que ela quer tanto um aval seu quanto uma prova dele.
- Eu não me oponho. Se ele quer coisa séria e ela também souber andar na linha. Suzana é atirada demais.
- Não, ela é comunicativa. Sua mulher vai ficar muito feliz se tiver o seu apoio. O menino é respeitador. A Suzana é impulsiva, mas aprendeu uma lição depois do episódio com o Bruno.
Genaro não responde, pois sente culpa e ao mesmo tempo orgulho.
Vitor avista Rodrigo e o chama.
- Rodrigo, vem cá, querido, vamos conversar um pouco.
- Oi tio Vitor.
- Eu estava falando de você. Né Genaro?
- É... espero que você a Suzana se entendam. De minha parte se quiserem namorar eu não me oponho.
- ‘Brigado, Dr. Genaro.
Num canto do jardim, Sandra e Sônia conversam:
- Parece que de nós três, você tá a mais feliz, né? – Sandra conclui
- Hoje é um dia muito especial pra mim. Mas eu sei que as coisas vão melhorar, tanto pra você quanto pra Suzana.
- Pra Suzana eu acho que estão melhorando. Os dias que ela passou na casa do tio Vitor foram muito bons pra ela. Pra mim...eu...não sei... – Sandra fica com a voz embargada pelo choro e Sônia, solidária, pega um lenço para enxugar as lágrimas da prima.
- Sandrinha, não fica assim. Tudo vai passar.
- Eu...sempre me achei forte, mas tá ficando muito difícil suportar tudo isso.
- Você também tem o direito de ter seus momentos de fraqueza. Também tem sentimentos. Eu não me dou tão bem com o Ivan, mas se houvesse algum problema sério com ele, eu sofreria também. Eu sei que ele ficou muito preocupado quando eu tive aquele acidente com a bicicleta no início do ano.
- É... eu me segurei pra não chorar. A Suzana ficou tão desesperada.
Devagarinho Ricardo chega e tapa os olhos de Sandra que pelo tato reconhece
- Rick!
- Minha fofinha! – os dois se abraçam
- ‘Cê tá lindão!
- E você, “lindaça!”
- Ah! ‘Cê é suspeito!
- Gente, vou deixar vocês dois conversando e vou procurar o Rê. – Sônia avisa.
- Você tava chorando né? – Ricardo pergunta afagando o rosto da Sandra.
- Tava...
- Pensando no seu maninho?
- É engraçado...Você não me conhece há tanto tempo, mas mergulha profundo no meu pensamento.
- É bom ouvir isto. Sinal que “nossas almas se completam”. Parece brega, né?
- Não...eu até gosto disto. Eu pareço ser muito prática, mas também tenho meu lado romântico.
Enquanto isto, noutra “festa”, Daniel entrava no seu profundo delírio, embalado com doses de ecstasy:
- Cara...tá demais....maió fissura...
Passa uma bandeja com a droga e Daniel serve-se intensamente.
- Cara, - dirige-se um amigo comenta com o outro – o Dani tá exagerando.
- Deixa ele curtir.
- Cara, ele tá mal, olha lá! Este ecstasy tem que ser em doses menores.
Daniel continuava a se entupir e ter atitudes completamente sem limite. De repente, deita-se num sofá e começa a demonstrar sinais de cansaço, tremor e seus amigos que usaram dose bem menor se preocupam:
- Dani, o que foi, cara?
- Eu...sei lá...
- Cara, ‘cê tá com febre! – o rapaz toca na testa de Daniel.
- Dani...Dani, reage cara! – o outro dá uns tapinhas no rosto de Daniel, vendo que este está quase inconsciente.
- Cara, temos que ajudar o Dani.
- Mas como?
- Levando pro hospital, ora!
- Olha, eu não me garanto pra dirigir. De repente um guarda me para, vê que eu tô meio doidão, me prende.
- Tá, então nós levamos de táxi. O que não podemos é deixar o cara aqui, quase apagando.
Os dois levam Daniel de táxi a um hospital público nas proximidades do local e este é atendido de emergência.
- O garotão têve sorte. – explica o médico - Ele teve uma overdose. Vocês são parentes dele?
- Não, só amigos.
- Ele deve ficar mais um pouco aqui. É melhor avisar a algum parente.
- Tá, a gente vê o que pode fazer.
O médico olha para os dois um pouco desconfiado e sai.
- Eu não tenho telefone de ninguém da família dele, você também não tem, né? - pergunta um ao outro
- Acho que ele não tem nem mais celular. Eu não vi nada com ele, acho que nem dinheiro ele tem.
- Vamos cair fora daqui antes que aquele médico volte. Já fizemos mais do que devíamos, agora ele se vira.
- É melhor mesmo, Vamos nessa!
Quase ao fim da festa, Vitor encontra Sandra no jardim e conversa com ela:
- Eu sei como tá se sentindo. Eu tenho orado muito por você, pelo Daniel.
- Tio, se Deus existe como é que pode tudo isto estar acontecendo?
- Se duvida da existência de Deus, é só olhar para tudo que está à sua volta. Olha pra este jardim.
Sandra olha em volta.
- Não tem grama, flores, árvores, plantas, terra? Olha pro céu, vê as estrelas. Isto tudo viria do nada? O nada, poderia criar o tudo? – Vitor questiona
- Bem...faz sentido.
- Sandra, veja o que há de bom. Esta festa tá maravilhosa, a Sônia tá linda. Eu amo vocês como filhas.
- Tio, eu sei que você ama a gente. Eu só tô cansada. Eu não vejo nada melhorar, tudo piora.
- Querida, vitórias vem de grandes batalhas. Os combatentes tem que se esforçar, lutar pra vencer o inimigo.
- Que “inimigo?”
- Deus é poder acima de tudo, mas tem um adversário: o diabo.
- Tio, desculpa, mas eu não acredito nisto.
- Sandrinha, você diria que seu irmão está metido com drogas por que esta é a vontade de Deus?
- Tio, eu não quero falar disto.
Sandra afasta-se e Vitor entrega tudo a Deus. Depois de se despedir de outros convidados, Sandra volta.
- Tio, não leva a mal aquela hora que eu saí, tô muito tensa.
- Eu não levei a mal, querida. O que você achou do presente de natal que sua avó deu a você e às suas primas?
- Ah...legal...
- É diferente dos outros diários que vocês já tiveram, né?
- Realmente é.
- Você sente algo diferente quando lê aqueles trechos bíblicos? Eu sei como é. Ela deu um pra Patty também.
- A Patty também ganhou?
- Por que o espanto?
- É que ela é da igreja. Ela já conhece.
- É, mas a Palavra de Deus diz: Ensina a criança no caminho em que deve andar e ainda quando for velho não se desviará dele. (Provérbios, 22: 6).
- Oi, queridos. – Marisa aproxima-se
- Oi, vó.
- Enfim, o 3º e último “debut” do ano.
- Ano que vem é o da Patty. Vai ser festejar no Clube Militar. Eu tava comentando com a Sandra sobre o presente que você deu pra ela e pras meninas. – Vitor fala para Marisa
- É...um maná pra cada dia.
- Maná? – Sandra estranha a expressão.
- Maná, Sandra, era o alimento que Deus mandava do céu pro povo israelita durante a peregrinação pelo deserto entre o Egito e Canaã. – Vitor explica.
- Ah... Gente, dá licença um instante que eu vou até lá falar com o Rick.
- À vontade, querida. – diz Vitor
Observando o entusiasmo da neta, Marisa comenta com Vitor:
- Parece que ela está se dando muito bem com aquele menino, né?
- É...a Sônia também está encantada com o Renato, o loiro.
- E a Suzana? Aquele ruivo não tira os olhos dela.
- Eles vão se entender também. Ainda têm muito tempo pela frente.

domingo, 9 de maio de 2010

CAPÍTULO XVIII

REAVALIAÇÕES
Vitor vai buscar Suzana no domingo para passar alguns dias em sua casa. A menina usa o cabelo preso para trás, trajando um conjunto de jaqueta e calça jeans, com o cãozinho Lalau no colo. Vitor, carinhoso, saúda a sobrinha:
- Bom dia, minha “Morena grau dez!”
- Bom dia, tio...
- Que carinha é esta?
- Tio.... – Suzana joga-se aos prantos nos braços de Vitor.
- Queridinha, não fica assim. Perdoa teu pai.
- Ele me odeia, tio.
- Não minha querida. Ele só ainda não aprendeu a amá-la.
- Por quê que as coisas são assim?
- Meu bem, você consegue explicar o dia 11 de setembro? Só de falar a data todos já sabem do que se trata. “O mundo jaz no maligno”. A explicação é espiritual. O ser humano tá sem amor. Você ainda vai reconhecer o amor de Deus na sua vida, disto eu tenho certeza.
Os dias passam e Suzana apresenta melhoras no seu estado emocional. Apesar da falta da mãe, falava com ela ao telefone e via sempre as primas na escola. Alfredo ia cedo à casa de Vitor para levá-la trazendo-a também de volta e o motorista de Heloísa levava Sandra e Sônia.
À tarde na creche-escola de Vitor, Suzana se vê embaraçada para ajudar nas atividades com as crianças:
- Tio, eles não param quietos! Olha quanta “empurração” pra escovar os dentes!
- Espera passar este momento de agitação e conta uma história antes deles deitarem.
- Eu já sei o que vou fazer. – Suzana entra na sala respirando fundo, decidida a colocar ordem.
- Sentem todos ou eu os “reduzo a mísero pó!”
- Quê? – pergunta um menino assustado
- O que é mísero pó? – pergunta outro
- Me dá sua mão. – Suzana ordena, segurando o apagador.
- É assim que você vai ficar! – responde ela batendo com o apagador na mão do menino - Agora, todos sentados no chão, que eu vou contar uma história! – Suzana senta-se no chão e todas as crianças sentam-se em volta dela.
Helena e Vitor observam Suzana com as crianças escondidos olhando por uma fresta da porta.
- Ela tá brilhando! – Vitor comenta entusiasmado ao observar Suzana contando histórias para as crianças.
Enquanto isto, no Solar Castelli, Soraya procura salvar seu casamento:
- Genaro, precisamos conversar.
- Eu tenho uma reunião daqui a pouco.
- Eu não vou prejudicar a sua reunião. Voltamos ao assunto depois.
- Então, fala.
- Você tem demonstrado muito mais nos últimos tempos uma impaciência total em relação à nossa filha e por isto mesmo, eu pensei em afastá-la um pouco de você, pra que ela não se sentisse pior do que já está se sentindo.
- O que você acha que eu deveria ter feito depois daquela cena que ela aprontou aqui, diante de convidados meus?
- Não me refiro só àquele dia. De ambas as partes haviam sentimentos acumulados. Você nunca me perdoou por não ter lhe dado o filho homem que tanto queria e que eu não tenho a culpa de ter perdido e passou a transferir sua raiva pra ela que se ressentiu ficando uma menina insegura, com necessidade de aparecer com atitudes como a que teve noutro dia. Ela agiu assim porque é uma adolescente e ainda não tem o domínio total das emoções.
- Onde você quer chegar com isto? Quer dizer que eu tinha que aceitar aquilo?
- Não, quero dizer que com violência, com ódio, não vai chegar a lugar nenhum. Você precisa aprender a conversar com ela, precisa aprender a amar a sua filha. Você já foi tão romântico. Sua obcessão por dinheiro está fazendo você ficar frio, insensível. Estou falando pelo nosso bem, pelo bem da nossa filha.
- Esta é a explicação para uma atitude como aquela?
- Genaro, não entra na defensiva. Quero salvar nosso casamento que está muito afetado por essas suas atitudes. Se fosse um pai mais presente teria evitado uma situação como aquela.
- Por que?
- Por que simplesmente ela estava num lugar afastado e deserto com o Bruno que queria se aproveitar dela.
- O Bruno? Você tá imaginando coisas!
- Não estou, não, Genaro. Ele estava com más intenções. A Suzana tem uma fraqueza e ele se aproveitou disso.
- Que fraqueza? Como assim?
- Genaro, nossa filha está se tornando uma alcoólatra.
- O quê?
- Isto mesmo. Você não percebeu que ela não estava no estado normal?
- Bem, eu percebi, mas...
- Mas estava tão revoltado pela atitude dela que só pensou em repreendê-la, em descarregar toda a raiva que sentiu por ter se sentido humilhado diante dos seus convidados.
- Eu achei que estivesse bêbada, mas...
- Ela estava bêbada e drogada. A Helô pegou a latinha de bebida daquele garoto e descobriu que tinha uma quantidade - muito pequena, mas tinha – de ecstasy. Pra quem não está acostumado como a Suzana, fez um efeito rápido. Felizmente eu a fiz botar tudo pra fora. Ela poderia ter entrado em coma. Aquele menino é um inconseqüente e eu também soube que o pai dele é sonegador e na casa dele tem umas festinhas bem duvidosas.
- Quem não sonega hoje em dia?
- Você por exemplo. É uma das suas grandes qualidades e que eu admiro muito. Ainda o acho um péssimo pai, mas um excelente administrador, um ótimo marido, um homem íntegro.
- Bem, eu iniciei negócios com o Wilson e estou indo bem.
- É? Melhor se afastar. Eu creio que não vai sobrar pra você, mas cuidado. Quanto à Suzana, vamos zelar mais pela nossa filha. Amor de pai faz falta e isto nenhum dinheiro no mundo compra.
- Bem eu estou atrasado. - Genaro prepara-se para sair, mas recua e chama a esposa - Soraya.
- Hein?
- Eu vou pra São Paulo 6ª feira de manhã, mas ainda não comprei passagem.
- Desta vez eu vou com você.
- Obrigado, meu amor. – Genaro aproxima-se da mulher para abraçá-la e ela corresponde
- Não precisa agradecer, vai ser bom pra nós. Mais uma vez eu peço que pense no que eu falei, principalmente sobre a Suzana. Aliás, assim que houver outra viagem, se ela estiver de férias quero que vá com a gente.
- Combinado.
Soraya comunica-se com Suzana avisando que vai com Genaro a São Paulo e no mesmo dia em que estes viajam, Sandra e Sônia vão ver a prima.
- Eu soube que você tá ajudando na creche do tio Vitor. - Sandra demonstra interesse pela prima
- É... também fui à editora.
- Ele tem escrito muito? – Sônia fica curiosa
- O próximo livro é surprêsa. Aquele que ele escreveu há muito tempo, “LUZ DO TRIUNFO”, saiu nova edição.
As meninas conversam e se divertem. Mais tarde, Vitor chega.
- Como é? O que me contam?
- Ah, nada de novo, só mesmo a festa da Sônia que tá chegando.
- Vai ser muito bom. – Vitor anima-se - E o Daniel, Sandra? Teve alguma notícia?
- Até agora, nada. Faz um tempo que ele não me liga. Da última vez foi muito rápido.
- Ele não quer ser localizado.
- Ele liga muito rápido do celular. Depois, quando eu ligo, ele deixa sempre desligado.
No apartamento de Eliana, Daniel está cada vez mais agressivo:
- Dani, aonde você vai?
- Não interessa! Já tô bem grandinho, tá?
- Mas Dani, eu só quero o seu bem! Não vai, Dani, por favor. – Daniel ignora o pedido de Eliana e sai.
Desesperado, Daniel procura o ponto mais próximo de venda de drogas e encontra um dos fornecedores:
- Oi, me arranja um pó.
- ‘Cê ainda tá devendo.
- Cara, eu não tenho nada comigo aqui ...eu te dou o meu celular.
- Não é o bastante pra pagar o que você deve.
- Por favor...é importado ‘cê pode vender e dá pra pagar uma boa parte – Daniel suplica
- Tá, cara, eu aceito, mas você vai levar uma quantidade menor.
Daniel não pensa no que está fazendo, pois seus contatos telefônicos estão no celular e o traficante aceita para tirar proveito disto.
Genaro e Soraya passam em São Paulo uma segunda lua de mel. Vão aos melhores restaurantes, passeiam, fazem compras, sempre que os intervalos permitem, pois, embora viajasse a negócios, Genaro gosta da companhia da espôsa. Os negócios prosperam e o casamento também. Se realiza a perfeita união de útil ao agradável.
Num dos momentos de “relax” do casal no hotel, os dois assistem à TV e Soraya impressiona-se ao ouvir a reportagem: “Empresário Wilson Mattos, preso por sonegar impostos”.
- Genaro! Vem aqui, depressa!
Genaro fica estarrecido ao ver o citado empresário, o pai de Bruno sendo preso.
A reportagem nara que foram encontradas trouxas de maconha e sacos de cocaína na mansão e que havia lá um Cassino clandestino.
Depois da visita das primas, Suzana, que deixou alguns dias de escrever em seu diário abre a página do dia e lê os trechos: “Honra teu pai e tua mãe, para que se prolonguem os teus dias na terra que o Senhor, teu Deus, te dá.” (Êxodo, 20: 12); “Filhos, em tudo obedecei a vossos pais; pois fazê-lo é grato diante do Senhor” (Colossenses, 3: 20)
Rio, 09 de maio de 2002
Meu querido diário:
Fiquei muito triste com tudo que fiz. Quando me joguei nos braços do meu tio Vitor, ainda me sentia a garota mais infeliz do mundo. Ele me falou daquela tragédia do dia 11 de setembro. Ninguém vai se esquecer daquele dia, mas eu também não esqueço de quantas vezes já chorei por causa do meu pai. É bem verdade que pensando em pessoas que perderam parentes, outras que foram trabalhar e não voltaram pra casa, fico até envergonhada de sentir o que sinto. Mas tudo o que tenho naquela mansão não é sinônimo de felicidade. Sei também que não tenho o direito de me considerar uma infeliz, porque coisas como o terrorismo, guerras entre países são situações sem comparação com as que eu passo. Eu vivo no maior luxo, sempre tive tudo e acho que poucas na minha idade que tem a minha condição financeira pensam nisto. Mas não é este o motivo pelo qual tenho que honrar meus pais. Minha mãe é maravilhosa. Sinto a falta dela, mas ela e o tio Vitor me fizeram ver que eu precisava de um tempo. Aqui não tem o luxo que tem lá, mas é um lar muito mais feliz. Tio Vitor é um pai tão carinhoso. Dá bronca na Patty, mas também a coloca no colo. Eu até me revolto em ter que honrar um pai que é tão bruto comigo. Ele já me bateu tanto, já foi tão cruel comigo. Não sinto a menor dificuldade em honrar minha mãe. Acho que ela e o meu pai devem estar se entendendo. Pelo menos assim eu não me sinto tão culpada. Eu pensei que eles pudessem se separar e ainda acho que eu atrapalho a vida dos dois. Tá chegando o dia das mães e estou com mais saudades da minha mãe... vou parar de escrever, pois estou começando a chorar e se continuar vou chorar mais. Por hoje é só.
Tchau,
Suzana.
Helena entra no quarto que está com a porta entreaberta e Suzana apressa-se em disfarçar, enxugando rapidamente as lágrimas com as mãos.
- Você tava chorando, filhinha?
- Tia... – Suzana não consegue mais disfarçar e abraça a tia que senta-se ao seu lado na cama.
- Pode chorar, meu amor, não fica com vergonha. Você é como uma filha pra mim.
- Eu...eu sou uma chata. Tô aqui na sua casa dando trabalho, enchendo o saco de todos com a minha tristeza.
- Não diga isto. Você é uma benção. A Patty tá gostando muito da sua companhia. Ela disse que é o mesmo que ter uma irmã. Ela conviveu tão pouco com as dela na mesma casa.
- Eu...tô sentindo falta da minha mãe.
- Eu sei, ela deve estar sentindo de você também, mas disse que sabe que você aqui é bem cuidada.
- É tão bonita a convivência de vocês. É tudo tão difícil lá em casa.
- Você acha que nós não temos problemas?
- Ah, tia! Não se compara aos que eu tenho, aos que a Sandra tem.
- Pelo menos a Sônia está de fora.
- Não tenho muito o que falar da Sônia. Ela é tão “na dela”.
- Você acha que pra ela não é chato o pai ficar ausente tanto tempo?
- Sei lá...ela se dá tão bem com o tio Sérgio.
- Mas eu já percebi como sente falta do pai e como fica feliz quando ele volta de viagem.
- É...já a Sandra tá sofrendo por causa do Daniel.
- E você deixou sua mãe muito aflita quando andou bebendo.
- Nem fala, que vergonha. Eu...não vou mais beber.
- Amém. Em nome de Jesus, você vai voltar logo pra casa e superar esta fase difícil.
Enquanto isto, a máfia do tráfico procura a pista de Daniel.
- Chefe, acho que tenho a pista certa. O telefone de um cara que também é nosso cliente.
- Faz o seguinte: oferece um kit grátis pra ele em troca de informações.
- Falou chefe.
Eliana chega à noite em seu apartamento e não encontra Daniel. Temerosa de que tenha ido procurar drogas, procura no quarto e vê que suas coisas estão reviradas. Depois que dá pela falta de alguns objetos de valor, deduz que Daniel tenha roubado para obter mais drogas e dá pela falta dos pertences dele também. Eliana começa a chorar:
- Ele nem se importou comigo...por que eu fui me envolver com aquele cara? Eu sou uma burra! Até me roubou!
No fim de semana, Sandra, sem ter com quem falar, sobe ao seu quarto e abre o diário, lendo os trechos bíblicos: “O homem que tem muitos amigos sai perdendo, mas há amigo mais chegado do que um irmão (Provérbios, 18: 24); “Aquele que ama a seu irmão permanece na luz e nele não há nenhum tropeço” (1 João, 2: 10).
Rio, 10 de maio de 2002
Meu querido diário
Lendo estes trechos, constato que a vida não tem a mínima coerência. Quando eu vejo um filme, leio um livro ou qualquer coisa no gênero da ficção, fico sempre procurando um sentido para as situações que parecem absurdas e observando bem tudo o que está acontecendo à minha volta, com a minha família, com meus parentes, chego à conclusão do quanto tudo é tão absurdo e que o comportamento de todos não parece combinar, nada com nada. O Dani, teria tudo pra sentir ciúme de mim e não sente mas o que tem feito é pra chamar a atenção. Ele é o que diz o trecho acima, porque é um irmão amigo. Eu o amo profundamente. Ele tem razão de ter mágoa dos nossos pais. Apesar de revoltado, ele nunca descontou nada em mim. Ele já foi agressivo comigo, principalmente nos últimos tempos, mas foi coisa passageira. Ele reprimiu dentro de si um ódio dos nossos pais que só conseguiu extravazar pela droga. Ele não é um exemplo de filho, mas um irmão como poucos. A Sônia e o Ivan vivem às turras, o tio Genaro é rude com a Suzana, mas cede quando a tia Soraya o encosta na parede. Os irmãos do meu pai se unem pelo fator dinheiro,- com exceção do tio Vitor - e não estão inseridos neste grupo citado acima, que “permanece na luz”. Meu pai e tio Genaro falam do tio Vitor com um sarcasmo total. Ele é o “Bíblia” “o aleluia,” o “glória a Deus!” Eu não acredito nas mesmas coisas que o tio Vitor, que a minha avó, mas reconheço que eles são muito mais felizes do que nós. Minha avó não cobra nada de nenhum filho, não é infeliz por ser pouco procurada, vive uma vida tão serena naquela casa em Petrópolis que muitas pessoas acham monótona, mas as pessoas que criticam a ela e ao tio Vitor, têm inveja. Tá chegando o dia das mães...minha avó devia ganhar um troféu por ser a mãe que é.
O que mais me entristece é a hipocrisia que eu vejo em volta, meus pais mantendo um casamento de quase 25 anos que já terminou há pelo menos uns 10. É tudo tão falso, tão horrível, incoerente. Meu pai nem fala no Dani. Quando é que será que a ficha dele vai cair?
Sandra ouve alguém bater na porta e interrompe:
- Quem é?
- Sou eu, filha. – responde Paulo – Posso entrar?
- Só um momento, pai.
Vou interromper, meu pai tá batendo na porta. Depois que ele sair, posso ter novidades e fecho o dia de hoje.
Te já,
Sandra.
Sandra guarda o diário e abre a porta. Paulo fica parado esperando.
- Pai, ‘cê vai ficar parado aí?
- Eu..não incomodo, filha?
- Claro que não, entra, pai, senta aqui.
Paulo senta-se na poltrona e Sandra em frente a ele, na beira da cama.
- Você tá muito triste, né?
- E não é pra estar?
- Querida... – Paulo segura delicadamente o queixo da filha com a ponta dos dedos – Eu... Nem sei como está suportando tudo isto com tanta coragem. Como você é madura. É como se você tivesse nascido de uma fórmula de equilíbrio entre mim e sua mãe.
- E o Dani é o “desequilíbrio”.
- Eu não quis dizer isto.
- Pai, o Dani precisa se sentir amado. Ele é seu filho também. Você vai ficar assim, passivo, sem procurar saber do seu filho, deixando o tempo passar e que ele afunde mais nas drogas? Ele precisa de nós. O que aconteceu, foi a gota d’água pra transbordar o fundo do poço. É uma das conseqüências desta hipocrisia que é o seu casamento.
- Sandra! Você não sabe de nada pra dizer isto.
- Nem preciso saber, é óbvio. Você e o tio Genaro falam do tio Vitor, mas a vida dele é muito melhor que a de vocês.
- O que há de tão melhor na vida dele? Nem deu pra negócios!
- Não deu pros mesmos negócios que vocês, mas é feliz com o que faz e com a família que tem.
- Você não sabe o que ele já fez, não sabe o que passamos por causa dele aqui mesmo em festas de fim de ano, aturando as bebedeiras dele, brigas com a Helena!
- Tudo passado. Tô falando de agora. Não se esconde no passado do tio Vitor, pai.
- É muito fácil! Faz besteira atrás de besteira e um dia resolve virar santo!
- Pai, as besteiras que ele fez, várias pessoas fizeram. O Dani agora tá fazendo besteira, mas eu acredito que ele possa mudar. Só que vai precisar de ajuda. O que ele tem é uma doença.
- Ele tava numa clínica e fugiu. Do que adiantou?
- Pai, não arranja justificativas. Procura pensar numa forma de ajudar o seu filho! Ele é meu irmão, eu tô sofrendo, quero que ele esteja bem, que volte pra cá.
- Eu...não sei ainda o que fazer, vou pensar.
Antes que Paulo saia do quarto, toca o telefone e Sandra atende. É uma ligação a cobrar. Sandra aguarda e depois do sinal ouve a pessoa identificar-se:
- Dani!
- Dani! Onde é que você tá?
- Maninha...eu...liguei...pro telefone do seu quarto....porque sabia que só você ia atender...
- Onde você tá, Dani?
- Na rua...
- Mas onde?
- Maninha...eu...te amo...só queria ouvir tua voz...eu...ainda vou te ver...assim que eu puder...
- O que ele tá dizendo? – Paulo interessa-se
- Ele tá falando tão devagar, não tá bem. – Sandra responde ao pai, tapando com a mão o fone
- Maninha...tem alguém com...você aí?
- Dani, volta pra casa, por favor. Esquece a mágoa dos nossos pais. Todos nós erramos, Dani, eles te amam.
- Eu...não volto...mas ainda quero te ver...te amo. Maninha do coração. Tchau...
- Dani!
- Você viu na bina o número? – Paulo Pergunta
- Acho que é um orelhão, parece ser zona sul, acho que é Ipanema.
- Deve ter algum “ponto” de entrega lá. Vou tentar achá-lo em lugares assim.
- Procura também na faculdade dele. Eu acho que deve ter sido lá que ele começou o vício.
- Não vai ser fácil, mas vou tentar.
Após a saída do pai, Sandra volta a escrever no diário:
P. s: Tanta coisa aconteceu neste curto espaço de tempo. Conversei com meu pai, pedi que tentasse achar o Dani e o próprio ligou. Onde ele estará? Não sei, mas tá atrás de mais drogas e meu pai há de encontrá-lo, antes que seja tarde. Meu irmão vai se libertar disto tudo, eu acredito. Em breve terei notícias dele.
Até a próxima, diário
Sandra.
Do mesmo lugar onde está, Daniel liga a cobrar para outra pessoa:
- Que bom que você ligou. – a voz de uma garota atende feliz
- E... que bom que você atendeu...
- Você tá com um jeito de falar, Dani. Você não tá bem.
- Eu...queria te ver...
- Tá, eu não posso demorar, minha mãe vai reclamar, você ligou a cobrar. Atendi porque ela deu uma saída. Vem hoje à noite. Ela não vai estar aqui.
- Tá...eu...te amo...
- Eu também, amor. Tchau.
- Tchau...
No domingo, Genaro e Soraya chegam de viagem e vão imediatamente para a casa de Marisa, para cumprimentá-la pelo dia das mães. Suzana vai com Vitor, para depois voltar com os pais.
- Oi mamãe. – Genaro cumprimenta a mãe - Eu atrasei, mas vim. Você sabe que eu estava em São Paulo, né?
- Mas o importante é que você veio, filho.
- Oi filha. – Soraya cumprimenta.
- Oi, mãe, oi pai.
- Vocês não tem nada pra dizer um pro outro? – Soraya procura quebrar o gelo entre Genaro e Suzana
- Pai...me perdoa do jeito que falei, eu me arrependi muito, não vou repetir uma coisa destas.
- Está bem, está perdoada. Eu também me desculpo, fui rude demais.
- Tá... – Suzana chega a ficar quase sem fala, pois o pai nunca havia lhe pedido desculpas
- Temos um presente pra você. – Soraya diz à filha
Suzana abre e fica maravilhada.
- Um discman novo! ‘Brigada!
- Foi seu pai que escolheu, agradeça a ele.
- ‘Brigada, pai. – Suzana vai até o pai e timidamente o beija.
- Por nada... – Genaro responde sem jeito.
- Mãe...eu tenho um pequeno presente pra você.
- Um presente dado pela minha filha, nunca é pequeno, ainda mais com o coração grande que você tem.
- Vó...dá licença pra gente ir lá pro jardim? Nós não demoramos.
- Claro!
Suzana pega na mão da mãe e a conduz para o jardim.
- Mãe...é de coração. Eu fiz um cartão pelo computador e escrevi umas palavras pra você.
Soraya abre o cartão e lê atentamente:
Mãe,
Neste cartão tento expressar o amor que sinto por você. Sei que não sou fácil. Já disseram que sou mimada, complicada, que afasto as pessoas de mim com meu jeito, mas de uma coisa eu tenho certeza: por mais chata que eu seja, tem alguém que sempre vai ser fiel a mim e nunca me abandonar: você, minha mãe querida que atura esta chata 24 horas por dia,7 dias na semana, 30 ou 31 dias por mês, 365 ou até 366 dias por ano. É demais, né? EU TE AMO, resumo nestas três palavas o meu sentimento. Você sempre me entendeu, me ouviu e eu tantas vezes não valorizei isto. Quero ser uma filha melhor, assim como a Bertinha e a Celinha são pra tia Helena, embora ela diga que como adolescentes também não foram muito fáceis e que com a Patty é até mais difícil. Eu não quero prometer nada que não possa cumprir, só quero dizer que o seu dia não é só hoje, são todos os dias no meu coração. Sempre te amarei, sua filha,
Suzana
Soraya abraça carinhosamente a filha:
- Querida...como você é maravilhosa. Eu agradeço a Deus a filha que você é.
- Que bom que você existe, mãe.
- Que bom que você existe, filha.
Na casa de Marisa, a reunião do dia das mães prossegue calma, apesar do clima tenso entre Heloísa e Paulo. O casal trouxe Lúcia e os filhos. Sérgio chegaria depois, vindo direto de viagem. Vitor lê dois versículos da Bíblia:
- “Que te direi, filho meu? Ó filho do meu ventre? Que te direi ó filho dos meus votos?”(Provérbios, 31: 2); “Mulher virtuosa, quem a achará? O seu valor muito excede o de finas jóias” (Provérbios, 31: 10).
- Mamãe, estes dois versículos sintetizam o que você é. Você pede sempre direção a Deus e Ele cuida de tudo, porque é fiel. Você é esta mulher virtuosa de que Ele fala. Ter uma mãe como você é ter uma jóia rara.
- Exagerado! – Marisa abraça Vitor e, mesmo aplaudindo, no íntimo os outros sentem um ciúme, uma inveja, já que não tinham uma intimidade com Aquele Deus de que Vitor fala.
Rodrigo passa o dia das mães conversando com a mãe pela internet e é convidado por Adriana para ir à casa dela. Apesar da data festiva, os pais da menina haviam saído e os dois ficam a sós no quarto dela. A menina aproxima-se dele, que num impulso incontrolável, retribui calorosamente aos seus carinhos. De repente, ele recua.
- Rodrigo? Que foi? Você tá estranho...
- Tá errado.
- Tá errado o que?
- Eu...gosto de outra garota.
- Que nem tá dando ponto pra você, nem te merece!
- Pode ser que eu nem fique com ela, mas não é justo usar você.
- Usar?! Que há, cara? Você acha que eu não sei de nada? Sei mais do que você! Seu otário!
Rodrigo vai embora e Adriana, furiosa, vinga-se difamando-o para vários garotos do colégio dele que comentam entre si.
- E aí, otário? – Leo, um garoto da turma de Rodrigo o provoca
- Tá falando comigo? – Rodrigo pergunta espantado
- É, com você mesmo.
- Que confiança ‘cê pensa que eu te dou pra isto?
- Olha só...dispensa uma gata como a Adriana e ainda acha que pode se dar ao respeito?
- Ô cara, pega leve, deixa o meu primo em paz! – Ricardo intervem
- Vai defender o priminho, é?
- Não precisa, eu mesmo me defendo! – Rodrigo dá um direto no garoto que fica com o nariz sangrando mas reage. Os dois rolam no chão e são mandados para a diretoria. Ao saber do incidente, Hermínia encaminha-os à diretora dona Arlete que os suspende. O ocorrido chega ao conhecimento da turma de Suzana:
- Suzana, ‘cê sabia que o Rodrigo e o Leo saíram na maior briga?
- Não. Quando foi?
- Ontem, pouco antes da hora da saída.
- A gente sai mais cedo que a turma deles.
- É, mas eu tava ainda. Foi por causa da Adriana, aquela que competiu aqui, pelo CENEM. O Leo disse que ele dispensou a gata, que era um otário. Aí o Rodrigo saiu no braço com ele. A Dona Arlete soube e suspendeu os dois por três dias. Ainda bem que a Hermínia reconheceu que o Leo provocou.
- Aquela Adriana é nojenta! - Suzana fica com raiva de Adriana, muito mais por difamar Rodrigo.
- Ela anda de mão em mão. O Rodrigo é diferente dos outros, por isso ela tá espalhando que ele não é de nada, mas é mentira. Ele é muito educado. Adriana é uma despeitada. Pode ser linda, mas é metida e muito mimada. Os pais deixam fazer tudo. Ela diz que vai dormir em casa de amiga e sai escondida com garotos. Tem 16 anos, mas quando chegar aos 18, já tá mais do que “rodada”. Suzana, você que é garota pra ele. Todos aqui reparam como ele te olha.
Suzana chega a expressar um meio sorriso de contentamento, mas disfarça.
- Se ele quiser mesmo alguma coisa comigo, tem que se decidir. Eu vou continuar “na minha”.
- Cê vai continuar dando ponto pro garoto do cabelo encaracolado, daquele colégio que competiu aqui?
- Ah, o Bruno? Não houve nada. Ele é safado, fica atrás de tudo que é garota.
- Então, mais um motivo pra você dar uma chance pro Rodrigo que quer coisa séria.
- Ele que me procure.
- Ih... Sebosa!
- É pra quem pode!
O debut de Sônia aproxima-se e os convites já estão todos prontos. Na saída do colégio, Sandra chama Suzana:
- Sú, preciso falar uma coisa com você; a Sônia disse que não vai convidar a Luciana.
- Por quê?
- Sú, vem comigo aqui pra dentro do carro.
As duas entram no carro e Sônia já as estava esperando. Sandra tira da mochila seu mini-gravador.
- Ouve isto. – Sandra gravou uma conversa de Luciana com outra garota.
- Suzana é “pirada”, né? – a garota comenta com Luciana
- É só tomar uma “pinga” que ela se transforma.
- Ah, mas ela é pirada com ou sem pinga.
- É mesmo. Ela fala dormindo, grita, dá gargalhadas. – Luciana descreve com maldade
- Pôxa... E aquele moreninho encaracolado?
- Estive na casa dele outro dia. Só nós dois. Fizemos nossa festinha particular.
- A Suzana é uma otária, né? - as duas riem.
- Vou furar os olhos daquela perua! - Suzana fica furiosa.
- Alfredo, arranca com este carro! – Sandra ordena.
Alfredo atende prontamente e Suzana chora irada.
- Seja superior, Sú. Ignora aquela garota, ela só se aproveitava da sua amizade. – Sandra aconselha.
- É, Sú. Fica assim não. Ela não merece. Nós te amamos, não vamos deixar ninguém te magoar. – Sônia reforça.
Três dias depois, os protagonistas da luta saíam da suspensão e advertidos por Hermínia, os alunos cientes do fato são proibidos de tocarem no assunto.
O colégio prepara-se para uma gincana para o próximo mês e Suzana, assessorada pelas primas, se encarregaria de criar uma coreografia com um grupo de meninas. Fica um pouco depois da hora e escolhe uma música para inicialmente dançar sozinha e depois dirigir o grupo.
- Sú, já trocou de roupa? – Sandra pergunta
- Já tô indo! Luzes! Som na caixa!
Suzana se solta completamente em piruetas e bailados jazísticos e as primas, atentas a ela, não reparam que alguém entra e fica maravilhado ao vê-la dançando. Suzana percebe que esta pessoa a está observando muito perto e ao desviar o olhar perde a concentração, tropeçando e caindo. Furiosa, se recompõe enquanto Sônia tira a música.
- Pôxa Rodrigo! ‘Cê tirou toda minha concentração, todo meu embalo!
- Ih...desculpa, não pensei que ia ficar tão chateada! Só tava apreciando a coreografia.
- Ah, mas eu tô criando, não gosto de ser observada assim tão de perto! Me deixa sem graça!
- Tá, Suzana! Se é este o problema, eu saio.
- Ô, Sú, você às vezes é “paquidérmica”, hein? – repreende Sandra, que, com pena, vai atrás de Rodrigo.
- Rodrigo, desculpa a Suzana. Se eu tivesse visto você eu diria pra não ficar tão perto. Ela fica muito sem jeito.
- Tá, tudo bem. Não é por ser assim, mas é pela maneira que ela fala.
- É pra se defender, cara. Ela tá muito insegura. Você vai ao aniversário da Sônia, não vai?
- Vou.
- Então, lá vocês vão poder conversar. Não esquenta com ela.
- Tá, Sandra... ‘brigado pela força.