terça-feira, 23 de fevereiro de 2010

CAPÍTULO XIV

DANIEL NA COVA DOS LEÕES & SUZANA NA FORNALHA
Terminando suas férias, Daniel guia o jipe de um amigo na Praia Seca, nas proximidades de Araruama.
- UUUUUUUUUHHHHHHH! – Daniel grita agitado – Isto é que é vida!!!!!!!!!!
Saltando do jipe e apreciando a paisagem, os dois num canto mais reservado, distante de outras pessoas procuram algo.
- Cara, tô na maior fissura. Cadê a “neve quente?” – pergunta Robson, o amigo de Daniel, referindo-se à cocaína.
- Vou ver na minha mochila. – responde Daniel, que ao procurar encontra uma quantidade pequena.
- Ih...tem pouco. – lamenta Daniel. – Como é que a gente faz pra depois?
- Deixa comigo cara. Vamos prum lugar em que o celular pegue. Vou ligar prum amigo meu. Ele pode dar pra gente.
- Dar?!
- Deixa comigo.
Robson consegue falar com o amigo e informa a Daniel:
- A gente vai à uma festa na casa dele. Lá tá liberado.
- É? Será que a gente agüenta até à noite?
- Agüenta. Até lá, a fissura pode estar maior, mas a gente desconta.
- “When the lights out is less dangerous. Here we are now, entertain us”. – Daniel cita a frase da música de Kurt Cobain: “Smells like teen spirit”, deduzindo o que vai acontecer na festa.
Num clima completamente diverso, Vitor e sua família, voltavam de um abençoado retiro, recomeçando a rotina de trabalho.
- Bom dia amor. – Vitor cumprimenta Helena - Acordou cedo, hein?
- Você também.
- Que benção o retiro, né amor?
- Com certeza. Pena que não conseguimos levar as meninas.
- Tudo ao seu tempo. Lembremos de Eclesiastes.
- É mesmo.
Patty desce correndo:
- Bom dia, pai, bom dia, mãe.
- Calma, menina! – Vitor chama a atenção da filha, vendo sua pressa ao tomar seu café.
- Mas tá em cima da hora! – justifica a menina.
- Já que tá com tanta pressa, vou apenas perguntar uma coisa: deixou sua cama arrumada? – inquere Helena.
- Bem... “Sácumé”, né, mãe? Primeiro dia de aula...a gente sempre acorda em cima da hora...
- Hoje eu arrumo, mas amanhã, a senhorita arruma. Quando chegar em casa, faça o favor de deixar o uniforme para lavar. Não quero nada jogado. Tudo no lugar, em ordem.
- Sim senhora! – Patty responde batendo continência para a mãe.
- Engraçadinha... – Helena dá um meio sorriso, tentando disfarçar.
Allan e Miguel também descem apressados e o último, como sempre, queixa-se do irmão:
- Gente, positivamente assim não dá!
- Não dá o que? – pergunta Vitor.
- Este cara! – Miguel aponta para Allan.
- “Este cara,” não, seu irmão! – corrige o pai.
- Pois é. O “meu irmão”, continua como sempre esta “benção” de desarrumação! Deixa tudo largado, coloca roupas, calças, até em cima da minha escrivaninha! Isto é um desrespeito!
- Guel, meu filho, deixa pra discutir depois. – Helena interfere.
- Mas ele tem que tomar jeito!
- Tá, ele vai tomar jeito, mas agora vocês vão pro trabalho. – Vitor encerra o assunto.
No Solar Castelli, Daniel só aparece no sábado, três dias após a quarta-feira de cinzas, Heloísa o inquere:
- Você esqueceu que o expediente na firma começou quarta-feira ao meio dia?
- Ah, mãe...estiquei o feriado.
- Então você deve estar muito bem financeiramente, economizando muito. Para quem esticou o feriado, não deve estar se preocupando com o que será descontado.
- Descontado?
- É claro. Ou você acha que vai ser pago pelos dias que não trabalhou? Não conhece as leis trabalhistas? Se você não fosse o filho de um dos sócios – o que particularmente não quer dizer nada, porque ninguém é melhor do que ninguém – poderiam apontar as suas faltas como abandono de emprego.
- Ah, mas sabem que eu não abandonei o emprego!
- Mas quem não trabalha não ganha.
- É engraçado; tem uns caras lá que aparecem quando querem, não têm horário fixo.
- Naturalmente por serem chefes, sócios. Faça por onde para chegar ao mesmo patamar que eles.
- Até parece que todos chegaram lá por honestidade! O meu pai que é advogado trabalhista e sócio da firma, duvido que tenha subido por mérito.
- Não desvie o assunto. Você tem que cuidar das suas responsabilidades e não se justificar pelos erros de outros.
- Ah, mãe, eu já estou de saco cheio!
- Olha como fala garoto! Enquanto estiver debaixo do meu teto, siga as regras! Trabalho é responsabilidade, folgado comigo não tem vez! Para de me olhar com esta cara!
- Quer saber do que mais? Vou pra firma mesmo pra ter sossego!
- É bom mesmo!
No primeiro dia de aula, durante o recreio, Rodrigo tentou se chegar à Suzana, mas esta era sempre rodeada pelas outras colegas e por outros admiradores e ele também tinha suas admiradoras. Na saída do colégio, Suzana, Sandra e Sônia saem conversando e vêem Ricardo e Renato sozinhos. Rodrigo não está com eles
- Cadê o Rodrigo? – indaga Suzana às primas, antes de chegarem perto dos outros dois.
- Deve estar vindo. – conclui Sônia.
- Olha ele lá! – Suzana exclama raivosa, vendo Adriana conversar com Rodrigo.
- Suzana, calma, garota! – Sandra recomenda.
- Não tô nervosa! – retruca a menina, com mais raiva.
- Imagina se não estivesse. – Sandra ironiza.
- Não tô mesmo! – Suzana insiste, não querendo admitir - Quer saber do que mais? Vou entrar no carro!
De longe, Rodrigo percebe a indignação de Suzana ao vê-lo conversar com Adriana, de quem não consegue livrar-se. As meninas falam rapidamente com Ricardo e Renato e apressam-se em falar com Suzana.
- Sú, deixa de ser criança, vai lá falar com o Rodrigo. – Sandra aconselha.
- Ele que venha aqui! Já sei que tá muito ocupado e não vai vir mesmo!
As meninas vão para casa e Suzana não troca uma palavra com as primas durante o trajeto. Sandra não dá a menor confiança, até fazendo um gesto como quem diz: “Deixa pra lá!” quando percebe a preocupação de Sônia.
Chegando ao Solar, cada uma vai para sua mansão.
Entusiasmada com o primeiro dia de aulas, Sandra sobe ao seu quarto e escreve em seu diário as novidades, não antes sem ler os costumeiros versículos bíblicos. Na parte de cima: “Levanta os olhos ao redor e olha: todos estes que se ajuntam vêm a ti. Tão certo como Eu vivo, diz o SENHOR, de todos estes te vestirás como de um ornamento e deles te cingirás como noiva. (Isaías, 49: 18). Lê a parte de baixo e sente como que uma confirmação: “Porque muitos são chamados, mas poucos escolhidos.” (Mateus, 22: 14).

Rio, 18 de fevereiro de 2002
Meu querido diário
É interessante como as passagens bíblicas descritas falam tanto comigo e têm sempre a ver com a situação que eu estou vivendo. É como a minha avó diz: “Deus sabe de todas as coisas.” Apesar de não ser da igreja dela, eu concordo. Hoje foi um dia muito especial. Além de ser o primeiro dia de aula, fizeram uma eleição para representante de turma. Eu fui a mais votada, portanto, sou a nova representante. Isto me deixa feliz, porque tive a liberdade de escolher a Suzana, que foi a segunda mais votada como suplente e a Sônia como secretária.. Muitos garotos votaram na gente. Comigo foi mais meio a meio, mas a Suzana tem muitos admiradores.
Enquanto tantos colegas acham o primeiro dia de aula um saco, eu gosto. Gosto de rever os colegas, inclusive tive o prazer de encontrar o Ricardo e a Sônia o de rever o Renato. Recebemos uma notícia que pra nós foi muito agradável: aquela garota Carolina que implicou com, a Sônia e por causa disto apanhou da Suzana o que valeu às duas uma suspensão, saiu do colégio. A mãe dela disse que não queria que a filha se misturasse mais. Ô gente metida!
A Suzana hoje têve a crise de ciúmes que não quer admitir, pois aquela Adriana tá na cola do Rodrigo. Ficou no maior emburramento, mas eles que se entendam.
O Bruno também parece ser muito esperto,sempre tem vindo com os pais aqui, quando tio Genaro os convida. Isso tem afastado um pouco o Rodrigo. Mas o que mais me preocupa é o Dani. Embora não me falem nada, sei que ele matou o trabalho neste período depois do carnaval e só apareceu hoje. Eu ouvi minha mãe discutindo com meu pai – pra variar – queixando-se da negligência dele como pai, da irresponsabilidade do Dani. Eu acho minha mãe muito dura com meu irmão. Sei que ele não está certo, mas ela exagera. Por que é assim? Ele está cada vez mais inconstante. Ora tá eufórico, ora depressivo. Eu amo tanto meu irmão e não sei o que fazer por ele. Como é difícil! Bem, vamos ver o que vem por aí.
Tchau, diário
Sandra.
O comportamento agressivo de Daniel se evidencia no trabalho no decorrer da semana. Telma, preocupada, telefona para Heloísa:
- Helô, sou eu a Telma
- Sim, houve alguma coisa?
- Helô, eu estou muito preocupada. O Daniel tá agressivo demais. Ele chegou hoje outra vez atrasado. O Aurélio, o supervisor, chamou a atenção dele e vendo só a cara que ele fez, não precisou dizer nada, só no olhar a gente percebia o ódio dele. Entrou batendo a porta depois saiu mais cedo do que de costume.
- Quer dizer que ninguém está conseguindo controlá-lo?
- Pior que não, Helô. Ele deve estar com algum problema sério. Eu não sei como posso ajudar.
- Você já está ajudando me pondo a par de tudo. Obrigada Telma.
Heloísa procura observar o filho de longe e obtendo informações de Telma. Começa a desconfiar de um problema mais sério, mas procura certificar-se.
No decorrer da 1ª semana de aula, Suzana e Rodrigo encontram-se nos intervalos casualmente. Porém, o ciúme os afasta mais ainda. Rodrigo um dia na saída, percebe que Bruno aparece no colégio para encontrar-se com Suzana, mas finge não ver, saindo sem ser notado por esta e por suas primas, o que chama a atenção de Ricardo que questiona o primo:
- Você, hein, cara!
- Eu hein o que?
- Cara...será que eu preciso falar? Você tá louco de ciúmes da Suzana.
- Ah, deixa isto pra lá! Ela é mesmo muito complicada!
- Ela tá insegura porque viu você falando com a Adriana outro dia.Você parecia um cara disposto a enfrentar desafios.
- É? Então cansei. Não tô mais a fim de dificuldade.
- Então você quer garota fácil? Que nem aquele chiclete da Adriana?
- Por que “chiclete?”
- Por que no início tem um gosto doce. Depois, quando se masca demais, fica amargo, só serve pra passar o tempo, pra distrair. A Suzana não é assim, a gente nota uma grande diferença entre as duas.
- Pode ser...mas eu não tô querendo me aproveitar da Adriana, somos só amigos.
- É...vamos ver até onde vai essa “amizade”, porque dá pra ver que pelo menos da parte do Bruno, a que ele tem pela Suzana tá aumentando. Você tem uma grande vantagem sobre ele: tá no mesmo colégio que ela.
- Mas ela não vai querer falar comigo, Rick, eu acho melhor não forçar a barra.
- Só te lembro uma coisa: “Mais vale um pássaro na mão do que dois voando”, pensa nisto.
Rodrigo resolve ficar “na sua”, não procurando Suzana, nem Adriana.
Na 6ª feira à noite, depois de ir ao Barra Shopping com as primas, Suzana conversa com elas em sua casa:
- Foi bom o passeio no shopping, né Sú? – Sandra comenta com Suzana.
- É...
- Que é mais chôcho! –Sandra observa.
- Ah...você quer que eu diga o quê? Foi maravilhoso! Oh! – Suzana ironiza abrindo os braços.
- Não é isso, Sú. – Sônia intervém – É que você parece que não sente mais prazer nas coisas, tá sempre calada.
- Ir ao shopping pra mim é uma coisa tão comum, já fomos tantas vezes.
- Eu gosto de estar com você, com a Sônia, e curto esses passeios “comuns”, pela companhia de vocês. Mas você dá a sensação de que falta alguma coisa. – Sandra coloca
- Ih...lá vem a psicóloga! Que mais “Doutora Sandra?”
- Suzana, não entra na defensiva. Eu só tô querendo ajudar. No shopping, tinha tanto garoto olhando pra você. Você nem se dá a chance de conhecer outros garotos. Fica com ciúme do Rodrigo e por outro lado tem medo de se aproximar mais do Bruno. Pode ser que nenhum dos dois seja pra você. No colégio, tantos tentam se aproximar e você não se abre. Por quê?
- Ah...sei lá. Não tô a fim de falar nisso não. Vamos ver um pouco de TV?
- Tá... – Sandra aceita, embora desanimada, pois vê que sua tentativa de fazer a prima se abrir foi em vão. Sônia a olha com cumplicidade, como quem diz que não adianta. As três ficam vendo TV até de madrugada e dormem. Suzana nas almofadas do chão, Sandra na poltrona e Sônia no sofá.
Soraya e Genaro que haviam saído chegam e vêem as três dormindo. Soraya desliga a TV e assusta-se ao ver Suzana remexendo-se para um lado e para o outro, num sono muito mais agitado do que o de costume. A menina parece delirar:
- Não...sai...não me deixa! Não!
- Suzana...- Soraya chega perto da filha e Sandra vai despertando aos poucos, virando-se, até que percebe que a tia chama pela prima.
- Filhinha, acorda, é a mamãe..
- Essa menina tá é louca! –Genaro critica.
- Que é isto, Genaro! – Soraya repreende em tom de voz baixo.
- Não...nãaaaaaao! – Suzana acorda sobressaltada ao ver a mãe. Respira ofegante e sente ao mesmo tempo alívio por acordar e angústia ainda pela impressão do pesadelo que não consegue lembrar.
- Ai...mãe, - Suzana abraça forte a mãe.
- Filha, você tava tendo um pesadelo, fica calma.
- Eu nem me lembro, mas ficou uma sensação tão ruim.
- Mas já passou, filha, tá tudo bem, mamãe tá aqui. Gente, vamos acordar a Sônia e vão todas pra cama. É sábado, aproveitem pra dormir até mais tarde.
Sônia só acorda com um paninho com água no rosto. As meninas dormem juntas e novamente Suzana fica com o sono agitado. Ninguém acorda pois, Sandra, muito cansada e preferindo dormir no pequeno sofá próximo à janela, ferra no sono.
Naquele sábado, as três ficam em casa. Suzana não tem muito ânimo para sair e prefere ficar na piscina, passeando com Lalau e entretendo-se com outros passatempos caseiros como TV e internet, na sala de bate-papo e lê dizeres que sente que são dirigidos à ela: “Apareça”, “Morena poderosa”, entre outros um tanto mais provocadores.
- Você tá com cotação alta hein, Sú? – observa Sandra.
- É...mas tem muito recado grosso aqui. – Suzana comenta com uma expressão de asco.
- Mas tem uns bem criativos. Olha só este: “Julieta, quero ser teu Romeu”. – cita Sandra.
- Ai, tá até brega! - Suzana critica.
- Eu gostei... – Sônia sorri e suspira.
- Você é mais romântica –Suzana analisa.
- Ih! Olha este: “Pantera da turma 1002!” – Suzana acha graça e ri - Este quase se entregou.
- Gente, vocês vão ficar muito tempo ainda aí? – indaga Sandra.
- Acho que vou, mas vou falar com a Luciana. – Suzana, refere-se a uma colega do colégio.
- Tá...eu vou dar uma descida e daqui há um pouco volto. – Sandra avisa.
Sabendo que Daniel estava em casa depois de ter chegado de manhã e dormido até à tarde, Sandra procura o irmão.
Daniel está em seu quarto deprimido. O telefone celular toca e vendo o número que aparece, apressa-se em atender. Sandra, ouvindo, espera antes de bater na porta.
- Oi, gatinha! – Daniel recobra um pouco o ânimo ao saber quem estava do outro lado da linha.
- Dani, o que houve? Você sumiu. – pergunta a garota docemente.
- Desculpa fofinha...é que... eu...não tô muito bem. – emociona-se ao sentir o interesse da garota e chora.
- Dani, não fica assim, eu quero tanto te ajudar.
- Eu sei...você e a minha irmã parece que são as únicas que me entendem.- Daniel chora mais ainda.
- Dani, vem aqui, amor. Não fica curtindo tristeza em casa. Eu quero tanto te ver.
- Eu...eu vou...mas antes eu preciso ir a outro lugar.
- Tá Dani. Mas não demora muito que senão eu vou ficar preocupada.
- Tá paixão. Eu te amo. Té mais. – Daniel desliga e apressa-se para sair. Quando abre a porta encontra Sandra, antes que esta possa bater.
- Mano...que foi?
- Nada não maninha... – responde fungando nervosamente - Eu preciso sair...
- Dani, você não tá fazendo nada de errado, tá?
- Sandra... não me faz perguntas! – Daniel irrita-se
- Desculpa, tô vendo que você não tá bem, só quero ajudar.
- Que saco! Por que não me deixam em paz?! Já não chega minha mãe?
- Dani, não fica chateado eu não quis irritar você. – Sandra fala mansa, vendo que o irmão passa por alguma crise.
- Tá, me desculpa também, eu preciso sair, respirar, tô me sentindo preso. Tchau!
Daniel desce e pega apressadamente a moto saindo em alta velocidade assim que abrem o portão. Heloísa o vê de longe. Entra em casa e pergunta à Sandra:
- Seu irmão saiu. Ele falou com você?
- Eu achei ele muito tenso, deprimido. Será que ele vai fazer alguma besteira, mãe? – Sandra quase chora.
- Não minha filha. Ele muitas vezes tem instabilidade de humor. Isso é coisa de momento, não se preocupe.
Heloísa sente a aflição da filha, pela sua forte relação de amizade com o irmão. Procura manter a calma e pensa: “Ele não vai ficar longe por muito tempo, ele sempre volta.”
Daniel vai ao encontro marcado depois de ter passado por outro local. Sua expressão agora é de euforia e embora a garota estranhe, o convida para entrar em sua casa, pois estava ansiosa à sua espera.
No Solar Castelli, Suzana após ter usufruído de seus passatempos caseiros, deita-se não muito tarde e as primas vão dormir com ela. De madrugada o sono de Suzana é mais agitado do que de costume. Ela delira, fala sem parar e sua voz parece presa:
- Não... sai!
Sandra acorda assustada ao ouvi-la dar uma gargalhada, com uma emissão de voz estranha, diferente.
- Você vai ser minha! – Suzana parece alternar o jeito de falar, ora falando com a voz gutural e ora delirando.
- Não...não... – Suzana continua falando como se fosse duas pessoas ao mesmo tempo e Sandra deduzindo que só pode ser um pesadelo chama a prima.
- Suzana...Suzana...Suzana, acorda!
- Hein...? Quê...? – Suzana acorda sem entender nada e irrita-se. - Pô, Sandra! Qual é? Você me acordou!
- Você tava falando sem parar, delirando. Ria, gritava. Só podia ser um pesadelo.
- Eu?!
- É, você.
- Tá, mas você me acordou, pôxa!! Que saco! – Suzana, num gesto muito próprio seu, agarra um dos dois travesseiros com o qual dorme e cobre o rosto, irritada, enquanto apóia a cabeça no outro.
- Ah, também da próxima vez não chamo mais! – Sandra irrita-se
- É bom mesmo!
Suzana volta a dormir como se nada houvesse acontecido. Sandra fica preocupada e custa a conseguir dormir novamente. Sônia, como sempre, dormia profundamente.
Amanhece e Suzana aproveita para curtir a piscina com as primas. Sandra conversa com ela.
- Sú...
- Oi?
- Você tá pensando em fazer alguma coisa diferente hoje?
- Não, eu fiquei cansada na 6ª feira, a gente rodou muito no shopping. Quero ficar mais descansada pra amanhã.
Subitamente, aparece Bruno.
- Oi, garotas.
- Oi, você chegou há muito tempo? – indaga Suzana.
- Não. Sua mãe disse que vocês estavam aqui e eu vim fazer companhia.
- Seja bem vindo! – Suzana saúda.
- Fique à vontade – Sandra procura ser educada.
- Não quer cair na piscina? – Suzana convida
- Eu vim saber se você não queria sair.
- Olha...hoje não tô muito a fim, obrigada. Mas fica aí. Se não tiver uma sunga, aqui é o que não falta.
- Eu vou chamar a Sônia e volto logo – Sandra avisa.
Quando vai descer, Sandra encontra Soraya, que a chama
- Sandra.
- Oi.
- Este menino não perde tempo, hein?
- É...
- Eu queria tanto que ela se acertasse com o Rodrigo.
- É tia, mas isso vai passar. Eles estão inseguros.
- Pra que simplificar se complicado é melhor? – Soraya questiona com humor - Mas eu vou continuar na minha, quero ver até onde vai isso e quando é que os dois vão assumir os sentimentos deles.
Depois de algumas horas conversando com Suzana, Bruno vai para casa sentindo-se fracassado, apesar de já ter conseguido alguns progressos. O telefone toca assim que entra no quarto
- Alô.
- Oi Bruno, sou eu a Adriana.
- Oi.
- Que há, gato, tá chateado?
- É...tá meio difícil minha investida.
- Cara, eu te falei que a guria é difícil.
- Acho que você tem razão. E você com o Rodrigo?
- Tá devagar, mas sei esperar. Quer que eu vá aí? Você precisa de consolo.
- E como!
- Podemos fazer uma “festinha particular”.
- É isso aí, gata. Nestas horas você é um grande consolo.
Adriana e Bruno, mantinham uma relação sem compromisso, dispostos a destruir as relações que provinham de uma semente boa, brincando com os sentimentos alheios, como pessoas que se classificam: “Traidores, atrevidos, enfatuados, mais amigos dos prazeres do que de Deus” (2 Timóteo 3: 4).
No Solar Castelli, Sandra conversa com Sônia:
- Sônia, você tem falado com a Joana?
- Não, eu quase não a vejo.
- Pois é, eu tenho reparado desde aquele fim de férias em Angra que ela tá muito distante, estranha.
- Como assim?
- Sônia, você não tem malícia. Minha intuição me diz que desde que o Bruno apareceu, ela resolveu sumir.
- Por que você diz isto? – Sônia fica intrigada
- Você não percebeu que a Joana ficou perturbadíssima quando viu a Suzana e o primo dançando no Luau?
- Ela pareceu ter ciúmes?
- Não, ela ficou em pânico, como quem não soubesse o que fazer.
- Estranho...
- Outro dia no recreio da escola, quando eu a chamei, ela não me tratou mal, mas encurtou a conversa.
Sandra rememora o fato:
- Joana!
- Oi... – Joana responde um pouco nervosa.
- Tá tudo bem?
- Tá...
- Joana, você sumiu no fim das férias. Eu e a Sônia te procuramos, mas você já tinha ido, nem se despediu da gente.
- É que...eu resolvi ir de repente, de última hora.
- Como vai seu primo?
- Hã? Qual primo?
- O Bruno.
- Ah, não tenho visto.
- Ele tem ido muito lá em casa.
- Ah, é? Ô Sandra, vai me desculpar mas eu tenho que falar com uma amiga, outro dia a gente se fala, tá?
- Tá... – Sandra olha desconfiada.
- Aí tem coisa. – Sandra afirma para Sônia após contar o diálogo com Joana.
No dia seguinte, as primas estão na aula de educação física e Suzana demonstra apatia.
- Sú. – Sandra a chama.
- Oi...?
- Você tá estranha.
- Eu? Impressão sua.
- Vamos lá Sú, vai começar a aula. Vamos nos esquentar na corrida.
As turmas começam a correr. Suzana vai ficando para trás e Sandra, ao vê-la parar, também para e Sônia faz o mesmo.
- Sú, o que foi? – Sandra pergunta espantada. Suzana parece não ouvir as primas. Fica tonta e cai desmaiada.
- Suzana! – as duas gritam assustadas.
- Para, gente! Por favor, socorre aqui! – Sônia pede.
- Suzana!- exclama Rodrigo que a pega no colo e a leva para o atendimento médico da escola.
Sandra liga para Soraya. O médico a examina e ela em pouco tempo recobra os sentidos
- Qual é seu nome?
- Su...zana...
- Quantos anos você tem?
- 15...
- Que dia é hoje?
- 2ª feira... por que tanta pergunta?! – Suzana irrita-se
- Calma, filhinha. – o médico a tranquiliza entedendo sua reação. – É que você desmaiou de repente e eu preciso saber como você está. Você não deve estar se alimentando direito, né?
- Ai...por que eu tenho que responder tanta coisa? Por favor, eu quero sair daqui!
- Calma, sua mãe está chegando ai pra buscá-la.
Soraya chega ansiosa para ver a filha que a abraça chorando logo que a vê.
- Filha, que susto! Você tá bem?
- Tô! Me leva, por favor!
- Ela deve estar tensa pelo ocorrido, não é nada demais – o médico a acalma. Eu vou dar uma dispensa por alguns dias da educação física. É bom que ela faça um exame de sangue, deve estar com uma anemia, mesmo que branda.
- Sim, obrigada doutor. – Soraya agradece e sai com Suzana. Encontram Rodrigo que ficou esperando.
- Oi, você tá melhor? – Rodrigo pergunta com interesse.
- Tô...‘brigada...vamos embora, mãe, por favor!
- Não repara não Rodrigo, ela ficou envergonhada, isso passa. - Soraya fala baixo para o menino
Enquanto isso, Heloísa liga de seu trabalho para Telma para saber de Daniel que havia sumido mais uma vez.
- E aí, Telma, ele chegou?
- Chegou atrasado, como sempre vem acontecendo nos últimos dias. Tá muito agressivo. Qualquer coisa eu aviso.
No fim de semana Daniel novamente desaparece o que deixa Heloísa mais preocupada.
Suzana demonstrava estar melhor. Com a proximidade das provas, faz um pedido à mãe:
- Mãe, eu posso ficar na casa da Luciana neste fim de semana pra estudar com ela?
- Ela já falou com a mãe?
- Já.
- Poderia ter chamado a colega pra estudar aqui. Tem mais espaço.
- Ela fica sem jeito. Quem sabe numa outra vez eu a convenço.
- Bem, vá lá! Mas não vai se tornar um hábito. Lembre-se das minhas recomendações.
- Já sei: Não comer muito, fazer a cama, não pedir pra usar o telefone a não ser que seja rápido e em casos de urgência.
Soraya pergunta à Sandra sobre Luciana e esta lembra dela, o que a deixa um pouco mais tranqüila. Liga para a mãe de Luciana que confirma já saber do combinado entre as colegas. Porém, a mãe de Luciana não fica em casa.
- Lú, você conseguiu a birita?
- Aqui no botequim vendem pra qualquer um.
- Vamos nessa!

domingo, 7 de fevereiro de 2010

CAPÍTULO XIII

CORAÇÕES DIVIDIDOS
Soraya vai até Angra com a filha e as sobrinhas, levando também Odete.
Lúcia passaria alguns dias com os pais em São Paulo e conseguiria levar Ivan.
Com seu humor e altos e baixos, como toda a adolescente, Suzana vai um pouco contrariada, embora leve seu “filhinho” Lalau. Chegam à tarde e Suzana não aprecia muito a viagem e nem o fato de estar na casa.
- Mãe, o que nós vamos fazer aqui, hein?
- É engraçado...você passou o maior sufoco estes dias, se queixou de cólicas, disse que não agüentava fazer nada. Não ligou pra ninguém, suas primas saíram sozinhas. Agora quer agitação. Vai entender...
- Você não me entende...
- Ah, Tá! Faz o seguinte, ô não entendida: pegue o seu “filho” e vá dar uma volta com ele que tá impaciente.
- Ai...tá bem! – responde malcriada.
- Volta fria. Não tô a fim de aturar mau humor e grosseria! Ouviu bem?
- Tá....
Suzana passeia com Lalau, olha o mar, as pessoas, casais felizes. Sente o sol no rosto e fica a pensar: “Bem que o Rodrigo podia estar aqui. Mas minha mãe resolveu tudo na pressa e nem deu pra me despedir dele. As meninas não encontraram o Renato nem o Ricardo. Será que viajaram?”
Voltando para casa, Suzana vai mansamente até a mãe que estava numa poltrona de vime, pendurada por uma corrente, balançando-se e lendo o jornal.
- Mãe.
- Ai, me assustou!
- Desculpe.
- Tá...
- Desculpe também pelo meu mau humor, você não merece. – Suzana dá um beijo na mãe. – Eu te amo.
- Também te amo muito, filha.
- Eu acho que você e o tio Vitor têm razão. A gente não tem só TPM, tem o durante e o depois também.
- É...você precisa se controlar. Fica muito irritadiça.
- Eu vou tentar me controlar.
- Filha, as meninas querem fazer bolo mais tarde, vai fazer com elas. Você sempre achou isso divertido.
- É...
Suzana tenta se animar fazendo bolo com as primas e as três lancham juntas e depois saem a passeio no fim da tarde com Lalau. Todas sabem que seu ar de tristeza, de desânimo é devido à ausência de Rodrigo. Sônia e Sandra, embora também sentissem a falta de seus admiradores, não se deixavam dominar pela tristeza.
Após as atividades do dia, as inseparáveis primas vão deitar-se. Suzana custa um pouco a dormir e seu sono, como sempre é agitado, cheio de pesadelos. Quando amanhece depois do café da manhã vai até a praia próxima, com seu discman, ouvindo o CD que Rodrigo lhe deu. Ouve a primeira música e identifica-se com os versos.
- Suzana. – chama Joana, uma amiga da escola. Suzana, embora entretida com a música, vê a amiga e vai ao seu encontro.
- Joana, você por aqui? - as duas cumprimentam-se e conversam. Joana finge não ver alguém que faz um sinal de silêncio enquanto vagarosamente chega-se à Suzana, tapando-lhe os olhos.
- Não acredito. – Suzana reconhece as mãos pelo tato. – Rodrigo! – vira-se para o garoto, abraçando-o e este dá-lhe um carinhoso beijo na testa e outro no rosto.
- Tá mais moreninha, hein?
- É...aqui a gente vive na praia ou na piscina. Esta é a Joana.
- Oi. – cumprimenta Rodrigo.
- Oi, - responde Joana. – Bem, eu vou indo. – Joana entende que preferem ficar a sós.
- Não precisa ter pressa de ir, Joana. – Suzana fica sem jeito.
- Eu já não ia demorar mesmo. Depois a gente se vê. Vocês querem botar os papos em dia. Tchau.
- Tchau. – respondem os dois.
Um pouco adiante, Bruno, o primo de Joana observava com malícia. Esta se assusta passando por ele.
- Mas até aqui? Eu não fico livre de você, hein? – Joana reclama.
- Pra você ver. Esqueceu que eu também tenho casa aqui?
- Infelizmente.
- Aquela gatinha, ou melhor dizendo, aquela pantera é sua amiga?
- É, mas fica longe. Você não sabe a fera que o pai dela é.
- Quem é o pai dela? - Bruno pergunta em tom desafiador.
- O empresário Genaro Castelli, proprietário da firma de construção CASTELLI EMPREENDIMENTOS.
- Uau!!! – exclama Bruno. – deve ser tão rico quanto o meu pai.
- Deve ser até mais. Só que você deve ficar longe.
- E quem é você pra me dizer isto?
- Eu sou alguém que sabe quem é você. Fica longe desta garota ou eu espalho tua fama!
- Tô morrendo de medo! – Bruno debocha - Fala isso que eu também falo de você. Se você foi comigo é por que foi e vai com qualquer um.
Joana prepara-se para dar-lhe uma bofetada, mas ele instintivamente segura-lhe a mão.
- Olha lá hein, guria. Tá pra nascer garota que me dê um tapa.
- É... – Joana retira bruscamente o braço da mão de Bruno. Não vou sujar minha mão em você.
- Vou dar mais um aviso: seus pais até hoje não sabem de nada, mas ainda podem saber.
Joana dá as costas para Bruno e vai correndo para sua casa, próxima a praia. Chega um pouco perturbada.
- O que foi, filha? – pergunta sua mãe ao vê-la entrando às pressas.
- Nada não, mãe...é que o sol tava forte e eu me senti mal, resolvi voltar, dá licença...
Entrando no quarto, Joana começa a chorar e pensa: “Este cara tá doido pra pegar a Suzana. Por causa dele tive até que ir pra outro colégio! Queria entregar aquele cara, mas tenho tanto medo. Como a gente paga por um erro!”
As meninas curtem a casa com piscina, a praia e a companhia do simpático “Trio em R”. À noite chega e todos estão cansados. Suzana e Rodrigo ainda ficam conversando na sala.
- Gostei de vocês terem vindo. – Suzana comenta com Rodrigo.
- Sou bom de surpresas, né?
- É...- Suzana deita-se no divã da sala e Rodrigo fica sentado no chão ao seu lado.
- Não quer sentar aqui? Eu sou folgada, né?
- Tá bom aqui. Eu gosto de cantinhos.
Do outro lado perto da cozinha, Soraya e Odete observavam enternecidas os dois.
- Olha só que amor, Odete: o Rodrigo fazendo carinho na cabeça da Suzana. Ele é tão doce.
- Tá me acostumando mal hein? – Suzana olha para Rodrigo com ternura
- É um prazer. – Rodrigo responde.
- Assim vou acabar dormindo. – Suzana boceja.
- Depois de um dia cheio deste. Você não prefere ir pra cama?
- Tá bom aqui. – Suzana acaba dormindo e Rodrigo a contempla.
- Você dormindo é uma gracinha. – Rodrigo beija a testa de Suzana e fica olhando a TV até o sono chegar, recostado em umas almofadas no chão.
- Você não vai deitar? - pergunta Soraya
- Estou sem sono. – responde Rodrigo.
- Ela é que emborcou mesmo, hein? – Soraya vê a filha dormindo e a chama delicadamente:
- Filhinha...Suzana....
- Hã...? – Suzana acorda esfregando os olhos, tentando se espreguiçar – Tava tão bom aqui...
- Eu sei, mas aí é muito desconfortável pra dormir. Vamos pra cama? A mamãe te ajuda.
Soraya ajuda Suzana a levantar-se e Rodrigo logo se oferece também
- ‘Brigada... – Suzana agradece lisonjeada ao sentir as mãos fortes de Rodrigo ao ajudá-la.
- Pode ficar vendo a TV até a hora que quiser. – Soraya oferece.
- Obrigado.
Rodrigo fica vendo a TV entre um cochilo e outro, até que num momento em que está sonolento pega o controle e desliga, dormindo profundamente entre as almofadas.
Suzana acorda ao amanhecer, passa pela sala observa o garoto ainda dormindo e chega-se perto dele, falando baixinho:
- Sabe que você dormindo é uma gracinha?
Rodrigo vira-se e Suzana com medo que este acorde, sai correndo e entra no quarto. Rodrigo então acorda e vai para o quarto onde estão os primos e lá inicia sua segunda etapa de sono.
Nas primeiras horas da manhã, Soraya deixa que Suzana e as sobrinhas descansem mais um pouco, mas como todas são criadas com atividade, vão fazer ginástica e os meninos acordados pelo ritmo intenso na casa animam-se entram no clima. Todos “malham” juntos e depois caem na piscina. À tarde, depois do almoço, vão passear pela praia.
Os adolescentes apreciam a beleza da região, o sol, o mar, sentindo-se como num paraíso. Duas pessoas os observam. Bruno, junto com uma amiguinha, Adriana.
- Tô parado naquela gata!
- Será que ela vai dar ponto pra você? – Adriana fala com tom duvidoso.
- Por que não?
- Olha só o garoto lindo que tá com ela: um ruivão de olhos verdes, você acha que pode competir com ele?
- Os morenos também tem sua vez.
- Quero só ver. O menino não desgruda dela.
- Você podia grudar nele.
- Como?
- Vamos pensar num pretexto...já sei, olha lá! – Bruno aponta um cartaz que anuncia: “HOJE LUAU.” – é um ótimo pretexto. Vamos lá.
Enquanto os trios estão numa conversa animada, a dupla vai se aproxima. Adriana olha Lalau e comenta:
- Que cãozinho lindo.
- Não é cãozinho, é meu filho! – corrige Suzana.
- Ah, desculpe – ri Adriana. – Qual é o “nominho” dele?
- Lalau.
- A minha prima te conhece. – Bruno usa Joana como um pretexto para se apresentar.
- É? Quem é sua prima? – Suzana interessa-se.
- A Joana. Eu as vi conversando ontem.
- É, ela é do meu colégio. Só que ela vai pro 2º ano, eu vou pro 1º.
- Vocês vão ao Luau? –Adriana pergunta.
- Não sei. Que horas vai ser? – pergunta Suzana.
- No anúncio diz que começa às 21:00, mas só esquenta mesmo depois das 22:00. – Bruno informa.
- Sei...qual é seu nome? – Suzana pergunta.
- Bruno. Bruno Mattos.
- Peraí...Mattos? – Sandra percebe no sobrenome algo de familiar. – Você é primo da Joana por parte de mãe?
- É. A minha mãe é irmã do pai dela.
- Seu pai é o Wilson Mattos?
- Exato!
- Meu pai foi colega do seu pai. – lembra-se Sandra. – Eles fizeram Direito juntos. Só que eu acho que seu pai seguiu outra especialização. O meu pai é trabalhista.
- O meu é advogado de empresa também, mas trata mais de área financeira, aplicações.
- O meu é sócio do meu tio Genaro. – Sandra comenta.
- O Dr. Genaro Castelli. – Bruno cita o nome do pai de Suzana para impressioná-la.
- Suzana, vamos andar mais um pouco. – convida Rodrigo, percebendo as intenções de Bruno.
- Peraí. – Suzana não percebe e prossegue a conversa. – A gente deve vir sim. Vamos gente?
- Se a sua mãe deixar. – pondera Sandra.
- Ah! Por que não?
- Vamos perguntar, né? –Sônia concorda.
Todos se despedem depois de mais algumas apresentações e combinam de vir. As meninas pedem à Soraya que se tranqüiliza por saber que o menino é de família conhecida e as meninas acompanhadas dos três garotos e a praia sendo próxima, não haveria perigo.
No início do Luau, tudo corre bem. Todos se divertem, trazem alguma coisa, há música, descontração. Bruno e Adriana, dão continuidade aos seus respectivos interesses.
Quando começa a dança, sem perder tempo, Bruno tira Suzana para dançar pegando-lhe pela mão e esta ao sentir-se cortejada e com seu ego de adolescente valorizado, prontamente aceita, sem titubear.
Adriana, percebendo o olhar enciumado de Rodrigo, pergunta cinicamente:
- Que foi Rodrigo?
- Nada... – responde expressando um desapontamento ao ver sua musa entusiasmada pelo garoto.
- Vamos dançar, gatão! – Adriana logo puxa Rodrigo pelo braço, que sendo cavalheiro não tem como rejeitar o convite.
- Você dança bem...– elogia Adriana, lançando um olhar de conquista para ele.
Enquanto todos dançam, chega Joana.
- Olha lá a Joana! – aponta Sandra. Joana vai até o grupo.
- Oi. – Joana cumprimenta
- Oi, Joana. – todos respondem
Sandra percebe um nervosismo em Joana logo que esta vê Suzana dançando com Bruno e indaga:
- Tá tudo bem Joana?
- Tudo bem...eu...eu vou encontrar uns amigos mais adiante, dá licença... – Joana inventa a desculpa para poder se afastar.
- Estranha esta pressa da Joana, né? - Sandra percebe e comenta com Sônia
- Ah...sei lá...de repente ela tá “na cola de algum gatinho” e tá com medo de perdê-lo pra outra.
- Pode até ser, mas eu a achei muito tensa, principalmente quando viu o Bruno dançando com a Suzana.
- Quer uma sangria? – Bruno oferece à Suzana:
Suzana começa a ter a mesma sensação que no seu aniversário como que impelida a aceitar, embora no começo titubeie:
- Um pouquinho, obrigada. – Suzana bebe de maneira sôfrega e a bebida sobe como um raio, pois estava há horas sem comer.
- E aí, gostou?
- Gostei, dá mais um pouquinho. – Suzana vira outro copo.
Em pouco tempo, Suzana completamente tomada pela bebida começa a dançar, dar piruetas, cantar.
Como tudo era festa e descontração, ninguém percebe o estranho estado de Suzana, a maneira como dançava, trejeitos que não pareciam ser seus e um olhar que acentuava ainda mais seus grandes olhos negros, como se penetrassem todos os que dela se aproximassem.
- Vem cá, “gataço!” – Suzana exclama para um menino que passa por perto e estranha seu jeito.
As primas de Suzana e os primos de Rodrigo se divertiam, dançavam. Rodrigo porém, sentia seu orgulho de adolescente ferido ao ver sua musa dançando com outros garotos e inclusive com Bruno.
- Vem cá, gatão, vamos dançar mais, a noite é um neném!. –Adriana insiste.
Mesmo aceitando, Rodrigo não tira os olhos de Suzana e acha que ela está se excedendo.
Naquele mesmo momento, a muitos quilômetros de distância, Vitor acorda e ajoelha-se ao pé de sua cama. Helena acorda e pergunta:
- Vitor?
- Estou orando. Deus me acordou para interceder pela Suzana. Não sei o que há com ela, mas Ele sabe.
- Vou orar com você.
Como num raio, mais forte do que a velocidade da luz, aquela oração era atendida e Suzana fica tonta, seu corpo pesa e a menina começa a vomitar, como que liberta de uma situação sobre a qual não tinha controle. Suas primas e Rodrigo e seus primos, percebem o mal estar dela e a socorrem. Suzana desmaia e Rodrigo a leva no colo para um canto onde não houvesse muita gente. Suzana volta a si e Rodrigo tem uma chance de paparicar sua musa.
- Ai...que dor de cabeça...- Suzana reclama levando a mão à cabeça.
- Suzana, toma um pouco de água de côco. Você vomitou muito, deve estar desidratada. – Rodrigo oferece.
- Obrigada...
Ao ver sua presa ser coberta de mimos, Bruno fica irado.
Sandra, Sônia e os demais, preocupam-se com o estado de Suzana e decidem ir embora. Despedem-se dos outros e Bruno e Adriana pensam noutra estratégia.
- É. Desta vez não nos demos bem. –Adriana observa.
- Tem pratos feitos pra ser degustados frios. A gente chega lá. – Bruno retruca maldosamente.
- Você não achou a menina muito esquisita?
- Por quê?
- Sei lá...ela olhava de um jeito, dançava tão alucinada. Parecia que tava “tomada”.
- Eu hein?! Não acredito nestas coisas, não.
- Pois eu acho que ela tá é com uma “Pomba gira!”
- Ah! – exclama Bruno, com desprezo.
No dia seguinte, Suzana ficara dormindo até tarde e os outros sairiam para passear. Sônia oferecera-se para substituir a prima em relação às tarefas com o “filhinho” desta.
Enquanto todos passeavam descontraidamente, Bruno avista-os dando pela falta de Suzana. Rapidamente deduz: “Ela deve estar em casa”. Aproveitando a situação, Bruno dá continuidade à sua investida e vai ver Suzana. Soraya atende. Bruno apresenta-se e diz que é primo de Joana. Pergunta por Suzana e Soraya vai chamar a filha.
- Oi, Bruno.
- Oi. Você ta bem?
- Tô. Foi só uma indisposição. Não comenta nada com a minha mãe, por favor. Ela nem soube, tava dormindo quando eu cheguei. Desculpe, eu sei que me portei mal.
- Que nada. Você tava alegre.
- Fiquei alegre demais, eu sei.
- Ah! Hoje é outro dia. Falando em dia, que aliás tá lindo, vamos dar um passeio?
- Obrigada, mas não tô a fim, tô um pouco cansada.
- Tudo bem, mas ainda vai me dar o prazer de sua visita lá em casa, tá?
- Claro.
- O convite é pras suas primas também.
- Bem...tem os garotos que estão aqui também.
- Também podem ir. – Bruno tenta disfarçar uma contrariedade, mas pensa noutra estratégia.
Naquele exato momento, chegam Sandra, Sônia e os garotos.
- Oi, gente. – Suzana cumprimenta a todos.
- Oi. – cumprimenta Bruno.
- Oi. – respondem todos e Rodrigo expressa um olhar de ciúme. - Dá licença, que eu tô muito suado, vou subir pra tomar um banho.
Ricardo sobe para conversar com o primo.
- Cara, qual é a tua? –Ricardo questiona.
- Por quê? – Rodrigo não entende a pergunta do primo.
- Cara, vai dar a Suzana “de bandeja?”
- Ela não é minha propriedade.
- Assim o cara vai se sentir por cima.
- Ah, Rick, não tô a fim de ficar de competição!
- É? Pois quem não compete, não aprende a vencer. Eu tô falando porque sei que você tá a fim dela.
Ricardo desce e encontra Sandra que pergunta:
- Ele tá emburrado?
- É...falei pra ele não entregar a Suzana “de bandeja”. Ele parece que quer entregar os pontos.
- Eu vou falar com a tia Soraya. Ela sabe lidar bem com isto. Vai falar com ele.
Sandra fala com Soraya, que vai até Rodrigo, batendo antes na porta.
- Rodrigo. Posso entrar?
- Claro.
- Oi querido. A Suzana perguntou por você. Não vai descer?
- Bem... – Rodrigo fica aliviado e ao mesmo tempo sem jeito.
- O garoto ainda tá aí, mas se ela perguntou por você é por que sentiu sua falta. Não se sinta rejeitado, eu sei que você tem interesse na Suzana. Ela é problemática, insegura, mas tem bom coração. Ela gosta de você, mas deve estar dando atenção ao garoto pra se certificar do que você sente.
- Por que toda garota é tão complicada?
Soraya ri enternecida.
- Rodrigo, quase toda mulher é complicada. Na fase adolescente, então...
- É...
- A Sandra é uma exceção. Também tem os sentimentos normais que uma adolescente tem. Já a Sônia, é meiguinha. Cada pessoa tem o seu temperamento, a gente tem que respeitar, entender as pessoas pra conviver bem com elas.
- Eu acho que gosto da Suzana do jeito que ela é, mas as vezes é difícil entender o que se passa com ela.
- Eu sei agora é o que se passa com você: está com ciúmes. Portanto, querido, desça, vá até a sala e mostre que é superior. A Suzana achava todos os garotos que se aproximavam uns chatos, mas a partir do momento que você e seus primos foram convidados pelo Genaro, ela começou a sair do “clube da Luluzinha”, está em fase de descoberta. Para muitos como você e o Bruno, ela se destaca. Ela é linda – não estou falando só por ser minha filha, muitos outros também acham e não me desfaço da Sandra e Sônia que também são – mas ela é alta, muito desenvolvida pra idade, tem um porte, parece uma moça feita. Eu sei que fisicamente ela o atrai, mas você gosta da pessoa dela, o que eu aprecio em você.
- É verdade.
- Vamos descer?
- Vamos lá.
Rodrigo desce e participa da conversa reunindo-se também com os primos e Sandra e Sônia, não deixando transparecer insegurança, o que incomoda Bruno. Antes de despedir-se, Bruno reitera um convite:
- Bem, então está combinado. Amanhã, churrasco lá em casa. Aguardo por todos.
- Com certeza. – confirma Suzana.
No dia seguinte, no churrasco, todos conversam descontraidamente à beira da piscina e Bruno dá muita atenção à Suzana, que corresponde. Rodrigo fica com ciúme, mas tenta disfarçar. Adriana percebe e aproxima-se dele.
- Gato, você tá tão quieto, que há?
- Nada...
- A piscina tá ótima, por que você ta aí só olhando? Vamos cair!
- Ah, não, obrigado.
- Vamos, lá, gato! – Adriana puxa Rodrigo que tenta esquivar-se. – Tá com medo da água? Não acredito! Com este porte todo, você deve ser o maior nadador! Vamos lá! – Adriana acaba empurrando Rodrigo, que apesar de não gostar da brincadeira, procura ser simpático.
De longe, Suzana observa os dois e começa a sentir um ciúme, mas procura não deixar transparecer.
- Não quer nadar, Suzana?
- Ah...não, obrigada.
- A Adriana é muito extrovertida. –Bruno comenta notando o ciúme de Suzana.
- Dá pra notar. – Suzana enfatiza, sentindo vontade de estar na piscina com Rodrigo, no lugar de Adriana.
A conversa entre Adriana e Rodrigo na piscina fica animada, o que irrita Suzana. Bruno repara.
- O churrasco está ficando pronto, não vai comer? – Bruno pergunta à Suzana, que de tão enciumada nem ouve.
- Suzana! – Bruno chama mais alto
- Hã? – Suzana desvia o olhar da piscina e se dá conta da pergunta de Bruno. – Eu...não quero nada agora...obrigada.
- Fique à vontade.
- O que é isto? – Suzana pergunta ao ver um copo na mão de Bruno.
- Ah... É caipirinha. Quer? - Suzana sente novamente a tentação de aceitar
- Eu...vou experimentar um pouquinho. – Suzana experimenta e engasga. Bruno dá-lhe um tapinha nas costas e ela melhora.
- Tudo bem? – pergunta Bruno.
- Tá... já passou.
- Não pensei que fosse tão forte pra você.
- Até que eu gostei. Vou tomar mais um pouquinho.
- Cuidado...
- Ah! Não foi nada. – Suzana bebe mais uns goles e vira tudo. – Viu só? Tá tudo bem. – a bebida sobe logo à cabeça de Suzana, pois estava de estômago vazio.
- Suzana, é melhor não beber mais até comer. Pode fazer mal – Bruno pondera, procurando conquistar mais a confiança da menina.
- Tá tudo certo, gato. – responde mais animada.
Sandra e Sônia chegam até à piscina, depois de terem passeado com Ricardo e Renato pelo jardim.
- Oi gente. – Suzana saúda as primas.
- Oi. – respondem todos quase ao mesmo tempo.
- E aí, tavam apreciando o espaço, né? – Bruno puxa conversa.
- É... Sua casa é muito bonita. – Sônia elogia.
Sandra observa Rodrigo e Adriana conversando descontraidamente na piscina, completamente desligados dos outros e percebe o ciúme enrustido de Suzana.
- Bem...vamos comer? – Bruno convida. Embora todos se manifestem, Suzana propõe a Bruno:
- Ah, Bruno, por que você não me mostra melhor a casa. Eu não tô com fome ainda. – Suzana já estava um pouco alta por ter bebido de estômago vazio.
- Tá... Mas primeiro deixa eu sevir meus outros convidados.
- Tá...- Suzana aceita, embora um pouco contrariada.
- Vocês não vão comer? – Bruno pergunta a Rodrigo e à Adriana.
- Ainda não, tamos curtindo a piscina. – Adriana responde pelos dois.
Mesmo debaixo de um olhares desconfiados de Sônia e Sandra, Suzana descontraída pelo efeito da bebida e esperando alguma reação de Rodrigo, acompanha Bruno que apresenta com mais detalhes o jardim, a casa e seu quarto. Suzana aprecia tudo o que Bruno lhe mostra, inclusive seus CDS e este aproveita para colocar uma música para motivar um clima romântico. Quando está quase se aproximando, pronto para dar um beijo em Suzana, Sandra aparece, chamando a prima:
- Suzana!
- Ai! Que susto! - Suzana recua olhando para a prima
- Você tá aí e esqueceu que nós também temos convidados nossos que estão aqui?
- Ah! E daí?
- E daí, que nós temos que dar atenção a eles.
- Eles ‘tão tendo muita atenção. Vocês tão com o Ricardo e o Renato e o Rodrigo com aquela garota. – Suzana não consegue disfarçar seu ciúme
- Suzana, vamos descer pra não ficar chato. - Bruno procura fazer o papel de bom moço
- Ah...tá! - Suzana se vê obrigada a concordar, mas continua querendo provocar ciúmes em Rodrigo.
Os três descem juntos encaminhando-se para a piscina. Rodrigo cobre de atenções Adriana, e Suzana se contorce de ciúmes por dentro. Sandra chega-se à prima percebendo sua irritação.
- Sú, por que não se comporta de uma maneira superior?
- O que você quer dizer com isto?
- Deixa de fingir pra você mesma. Você tá morrendo de ciúmes!
- Ciúmes?! Eu?!
- Você tá a fim do Rodrigo desde a primeira vez que o viu. Por que não assume?
- Ridículo! Não tô a fim de ninguém! Sabe o que eu tô a fim? De dançar! Vamos lá, Bruno!
Suzana começa a dançar, rodopiar de uma maneira descontrolada, ao mesmo tempo querendo chamar a atenção de Rodrigo e de todos. Tentando parecer bem intencionado, Bruno dançando com a menina, recomenda:
- Suzana, calma, você vai ficar tonta.
- Eu tô ótima!
Suzana, que dançava segurando as mãos de Bruno, começa a dançar separado deste desequilibrando-se e antes que dê tempo de alguém segurá-la, cai na piscina.
- Cuidado, Suzana! – Bruno grita.
Mesmo sendo socorrida rapidamente por Rodrigo que estava na piscina, Suzana, bebe muita água. Rodrigo e Ricardo prestam os primeiros socorros, pois tinham experiência nisto. Suzana bota toda a água para fora e vomita. Mesmo envergonhada, agride Rodrigo que a princípio a olha preocupado:
- Que é que você tá olhando?! Não quero ninguém com pena de mim!
- Eu não tô com pena de você não, garota! – Rodrigo reage à agressão – Achei que você fosse uma garota legal, mas me enganei! Você é muito infantil, gosta de chamar a atenção, de pagar mico! Tô cheio do seu jeitinho mimado!
Rodrigo sai de perto e Adriana vai consolá-lo:
- Rodrigo...gato..Não fica assim. Essa garota é boba, exibida. Não estraga seu dia por causa dela.
- Eu...vou embora...
- Não, Rodrigo.Vem cá, vamos curtir o churrasco, deixa ela pra lá!
- Não tem mais clima. Não sei o que os meus primos vão resolver, mas eu tô indo embora da casa dela.
- Bem...você é que sabe. – Adriana finge não querer opinar, mas por dentro sente-se vitoriosa.
Enquanto isto, Sandra repreende Suzana:
- Que vergonha, Suzana! Você passou dos limites! Sua mãe vai saber disto!
- Não...por favor, não conta! – Suzana pede aos prantos.
- Sandra, por favor, não conta pra mãe dela. Foi na minha casa, vai ficar chato pra mim. – Bruno argumenta - Ela promete que não vai fazer mais isso, né Suzana?
- Será que agora eu vou precisar ser sua babá, Suzana? – Sandra continua repreendendo a prima, que a ouve sem ter o que dizer, chorando sem parar - Você não tem limite!
Sônia e Renato, por serem mais retraídos, ficam ouvindo e embora tenham ficado também chateados com Suzana, sentem pena dela. Ricardo vai falar com Rodrigo:
- Cara...Você pegou pesado! Ela tá chorando muito!
- É?! Problema! Ela não quis aparecer? Agora agüenta as conseqüências!
- Cara...ela agiu assim por ciúme.
- Ela tava se derretendo pro Bruno!
- E você tava dando papo pra aquela garota, a Adriana.
- Ela preferiu bancar a criançona, como sempre faz! Você viu o que ela fez no fim do ano, no aniversário dela e há pouco, naquele Luau! Ela gosta de se ferir e ferir aos outros!
- Mas cara... Tá um clima horrível. Nós estamos na casa dela.
- Vocês podem estar ainda, mas eu não. Vou embora se puder ainda hoje!
- Cara, não faz isso.
- Vocês fiquem se quiserem. Eu vou!
- Mas eu acho melhor a mãe dela não saber de nada.
- Eu não sou cagoete. Só não tô mais a fim de papo com essa garota!
- Cara, para e pensa. Ela deve estar passando por problemas. Você já viu que o pai não dá a mínima pra ela?
- E daí? Os outros é que tem que pagar? Ela que procure um psiquiatra pra resolver as neuras dela!
Bruno sugere que esperem Suzana se recompor para não dar a perceber seu estado quando chegar em casa.
- Sandra, o Rodrigo disse que queria ir embora. Os outros vão querer ir também. – Sônia conta esperando uma atitude da prima
- Ah, é? Eu vou falar com a Suzana. – Sandra decide.
Sandra vai até o jardim onde Suzana se encontrava e lhe dá um ultimato:
- Suzana, se você não for se desculpar agora com o Rodrigo, eu vou contar à sua mãe tudo o que você fez.
- Tá louca?! Ela não me deixa mais sair e nem vocês.
- Eu aceito. O que eu não vou aceitar é que o Rodrigo e os primos queiram ir embora por sua culpa! O certo seria que eu contasse de qualquer jeito, mas vou lhe dar uma oportunidade: não repita isso e peça desculpas ao Rodrigo!
- Você é um saco!
- Vai ou não vai pedir desculpas a ele?
- Não!
- Então não só vou contar à sua mãe, como pro seu pai que está pra chegar!
- Não! Isso já é covardia!
- Tomara que ele te espanque!
- Não! Não! Eu...eu peço desculpas! Pronto!
Sandra chama Rodrigo que é convencido por Ricardo a ouvir Suzana:
- Eu...eu...me desculpa! - Suzana fala com a voz embargada pelo choro
- Tá...eu também fui agressivo, também peço desculpas.
- Sua agressividade foi compreensível. – pondera Sandra – Uma ação provoca uma reação.
O clima melhora um pouco. Ao chegarem em casa, não é difícil disfarçar, pois Soraya dava atenção a visitas.
Sandra entra no quarto depois de passados alguns minutos e procura conversar com Suzana:
- Sú...
- Você é uma terrorista! Me ameaçou por causa dos seus interesses!
- Sú, eu peguei pesado, mas se controla, para de ficar pagando mico, porque se continuar assim, a sua mãe vai saber e se preciso o seu pai também.
- É...Eu estou em suas mãos.
- Felizmente você tá em minhas mãos.
- Por que você diz isso?
- Sú, o Bruno e a Adriana ‘tão fazendo um joguinho de sedução. Ele contigo e ela com o Rodrigo. Ele quase te tacou um beijo quando eu apareci. Vamos dar um tempo nos convites dele. Ele quer forçar a barra.
- Ah, Sandra...você vê maldade em tudo! – Suzana critica.
- Quem sabe eu vejo a maldade onde tem?
- É maldade um cara se interessar por alguma garota?
- Sú...você sabe como são os filhinhos de papai rico. A grande maioria pensa que pode conseguir tudo o que quer. O Rodrigo e os primos são exceções.
- Tá, Sandra. Mas se eu ficar a fim de namorar o Bruno, que mal pode haver nisto?
- Você tem que conhecer melhor um garoto pra saber se ele vai ser legal pra você. O Rodrigo tá dando esse tempo.
- Você fala, mas também tá parada no Ricardo.
- Ele também tá dando tempo pra que eu decida.
- Você sempre sabe de tudo!
- Sú, eu ainda nem fiz 15 anos. Não quero fazer nada precipitado.Você pensava do mesmo jeito, mas agora parece que não sabe o que quer. Fica fazendo ciúmes no Rodrigo. Se também não estiver a fim do Bruno, não magoa, não dá falsas esperanças.
- Ai...eu nem sei. Eu...me deixa sozinha, Sandra, por favor, eu quero pensar.
- Tá. – Sandra sai do quarto e olha a prima como quem diz: “Como você complica as coisas.”
Sandra sai e Suzana pega o diário. No cabeçalho, vê escrito: “Pondera a vereda de teus pés e todos os teus caminhos sejam bem ordenados.” (Provérbios, 4: 26); no rodapé, o trecho: “Porque os caminhos do homem estão perante os olhos do Senhor e Ele considera toas as suas veredas.” (Provérbios, 5: 21).
Rio, 10 de fevereiro de 2002:
Meu querido diário
O que será agir como eu li acima e abaixo? Fico tão confusa. Confesso que o Bruno me atrai, mas o Rodrigo é tão doce, tão puro, tão bom. Por que será que eu o magôo tanto? Estou envergonhada e ao mesmo tempo perdida. A Sandra me alertou. Às vezes ela é um saco. Parece até uma tia, não uma prima! Mas, quem sabe, não tenha razão? Eu não sei mais o que faço. O que há comigo? Preciso sossegar um pouco.
Tchau
Suzana.
Dois dias depois, Genaro chega para tirar uns poucos dias de férias e fazer negócios com outros empresários que também estavam em Angra. Rodrigo recebe um telefonema inesperado e comunica à Suzana:
- Eu falei com meus primos e eles devem estar avisando suas primas...eu vou voltar ainda hoje pro Rio, porque meu irmão veio de São Paulo pra me ver.
- É...que pena... – Suzana tenta disfarçar a tristeza.
Sentindo seu coração quase saltar pela boca, Rodrigo não consegue controlar-se. Olha ternamente para Suzana, chega perto dela, que permanece imóvel, afaga-lhe o queixo, o rosto e suavemente dá-lhe aquele que seria o primeiro beijo de sua vida. Ela deixa-se beijar e fica paralisada. Aliviado pela coragem de seu ato, Rodrigo carinhosamente fala para sua amada:
- Não precisa dizer nada, lindinha. Vou pensar muito em você. Sei que vai pensar em mim também. Té breve.
Suzana continua imóvel, hipnotizada, com os olhos vidrados, numa mistura de fascínio e espanto.
Como estavam do lado de fora da casa, Adriana, que ao acaso passava pelo local, viu e invejosa, procura arquitetar rápido um plano para não perder sua presa.
- Rodrigo! – a garota chama quando Suzana já havia se retirado - Tá indo embora?
- É...Meu irmão tá lá em casa. Veio de São Paulo pra me ver e os meus primos estão voltando comigo.
- Pôxa, que pena. Eu também vou antes do fim da semana. A gente pode se ver lá no Rio. Eu dei meu telefone. O celular você também tem. Não tem desculpa de não me procurar.
No seu quarto , ainda perturbada pelo ato impetuoso de Rodrigo Suzana, abre o diário na página do dia e encontra os trechos bíblicos. Acima: “O prudente vê o mal e esconde-se; mas os simples passam adiante e sofrem a pena” (Provérbios, 22:3); abaixo: “O que ama a pureza do coração e é grácil no falar, terá por amigo o rei” (Provérbios, 22: 11).
Rio, 12 de fevereiro de 2002
Meu querido diário:
Estou tão confusa que nem consigo pensar no que li.. Hoje eu fui beijada pela primeira vez. Acho que minha mãe deve ser a primeira a saber Meu coração disparou e eu fiquei imóvel, por dentro correndo e por fora estática, sem ação. Ele conseguiu me pegar de jeito! Apesar de surpresa, senti que foi com carinho. Ele sabia que podia me beijar. Eu o comparo com o trecho bíblico escrito abaixo: “grácil no falar”. Ele foi muito doce, tanto no ato de me beijar como pelas palavras que disse. Mas eu ainda estou dividida. O Bruno parece mais experiente, mais direto. Ele quase me beijou. O Rodrigo ainda conseguiu fazer isto antes. É...1 x 0. Se o Bruno me procurar, eu confesso que vou gostar. Fico perdida, pois o Rodrigo deu o maior ponto pra aquela perua da Adriana! Pior que a danada é bonita e sabe como atrair um garoto. Será que estou com medo de me decepcionar? E se eu experimentasse namorar o Bruno? Será que eu devo? Ai! Sabe do que mais? Chega! Preciso respirar, aquele beijo me tirou o fôlego! Tô abobalhada!
Tchau!
Suzana.
Casualmente, Sandra e Sônia passam pela casa de Joana e vendo sua mãe perguntam por ela:
- Oi, como está a Joana? – Sandra indaga
- Ela voltou pro Rio.
- Assim de repente?! O que houve? – Sandra espanta-se
- Disse que tava entediada aqui. Eu deixei ir, mas disse que teria que ficar com a avó.
- É...- Sandra lamenta – mas se ela ligar, diz que estamos com saudades e nos vemos na escola, tá?
- Tá. Bom final de férias pra vocês.
- Obrigada, igualmente. – despedem-se ao mesmo tempo as duas.
Suzana chama Soraya para uma conversa particular:
- Mãe, você já ficou indecisa? Sem saber direito de quem você gosta, se a pessoa gosta mesmo de você?
- Você tá se sentindo assim, né?
- É...o Rodrigo...eu senti que ele não queria ir embora, mas que ao mesmo tempo ele usou a vinda do irmão como um pretexto pra ir e ter a certeza se eu ia sentir a falta dele.
- Faz sentido.
- Mãe...ele conseguiu me pegar de surpresa, me deu um beijo.
- Seu primeiro beijo né?
- Não posso negar que sinto atração pelo Rodrigo, acho ele um cara bonito. Mas o Bruno tem alguma coisa que...não sei explicar.
- Isso é natural. É muito cedo pra saber se você gosta de alguém mais profundamente. Você só tem 15 anos. Outras garotas que regulam com você já avançaram muito mais do que um beijo. Você é muito mais sensata.
- Mas eu nem avancei. Fui beijada. Fico dividida porque aquela Adriana tá dando em cima do Rodrigo e ele tem dado ponto pra ela.
- Ele vai ter que saber o que quer também. Agradeço a confiança que teve em mim. Você quase não falava comigo. Fiquei feliz por isto.
Bruno aproveita a ausência de Rodrigo quando seu pai chega para passar seus últimos dias de férias no local. Apresenta-o a Genaro, que trava uma boa amizade com ele.