quarta-feira, 21 de julho de 2010

CAPÍTULO XXVI

MAIS REVELAÇÕES
Um novo envelope chega às mãos de Lúcia.
- Helô! – Lúcia corre pelo jardim ao ver a cunhada.
Lúcia mostra para Heloísa que abre o envelope retirando um papel.
- É a cópia de uma escritura!
- A pessoa enviou também uma carta anônima do mesmo jeito que a outra, escrita com pedaços de letras de revistas, dizendo que foi o Sérgio que comprou e botou no nome de Sílvia em usufruto da mãe.
- Sílvia...filha da mulher que usufrui do imóvel. – Heloísa começa a fazer deduções.
- Também veio outro documento. Uma cópia de certidão de nascimento dessa Sílvia. - Lúcia mostra à Heloísa que lê e fica boquiaberta.
- Lúcia...você leu tudo?
- Helô, não vai fazer tanta diferença, só vai reforçar a minha decisão de me divorciar.
- É, mas assim como nós tivemos provas do que ele andava fazendo, vamos chamar o Horácio e reunir mais provas sobre isto também.
Lúcia avisa à Sônia que precisa sair e Heloísa contacta com Horácio, depois de obter uma dispensa do trabalho.
- Estou tão preocupada com a Sônia. – Lúcia comenta com Heloísa.
- E o Ivan?
- Ele tá apático, tanto quanto ela.
- Se prepara, você sabe como vai ser daqui pra frente.
Suzana e Sandra, solidárias com a prima, fazem companhia à esta enquanto sua mãe sai.
Enquanto isto, Lúcia e Heloísa, acompanhadas por Horácio, vão ao endereço indicado.
- É aqui? – Heloísa pergunta
- Deixa eu conferir. – Lúcia lê novamente a correspondência – É aqui mesmo.
- Lúcia, eu entro. Vocês ficam aqui. – Horácio recomenda - Você sabe manejar esta filmadora, né Helô?
- Deixa comigo.
Horácio deixa as duas escondidas atrás de uma árvore um pouco distante do carro. Uma cerca envolve o terreno da casa. Horácio caminha um pouco mais próximo e vê uma mulher mestiça, com um tipo de mameluca, estendendo roupas num varal.
- Dona Adenir – Horácio propositalmente a chama pelo nome e ela atende
- Bom dia.
- Bom dia – a mulher responde – Como o senhor sabe meu nome?
- Eu sou amigo do Sérgio Castelli. Ele disse que eu poderia encontrá-lo aqui e deu seu nome como referência.
- Papai? – pergunta uma menina com síndrome de down que aproxima-se ao ouvir o nome de Sérgio
- Não é o seu pai, não filha. O que o senhor deseja? Senhor... Senhor?
- Horácio. Eu faço serviços pra empresa dele e como estamos fazendo construções por aqui, aproveitei pra procurá-lo.
- Ele tá fora, não sabia que ele tava a serviço por aqui. Nunca me falou do senhor.
- Ah, mas estas construções às vezes param por falta de pessoal, de material também. Ele deve ter esquecido.
- Eu não tô muito a par do que ele faz.
- Tô com saudade do meu pai! – a menina manifesta-se logo após o comentário.
- Eu vou ligar pra ele, filha. Vai lá pra dentro, vai. Olha, eu acho mais fácil o senhor encontrar com ele na empresa. Aqui ele não tem vindo.
- Se a senhora quiser, posso procurá-lo na empresa e digo que a menina tá com saudade dele.
- Ah... – a mulher fica um pouco desconfiada.
- Pode deixar que eu falo com ele. Bem, agora eu vou, pois tenho pressa. Tenham um bom dia.
- Bom dia...
Horácio volta ao local onde deixou Heloísa e Lúcia.
- E aí, Helô, tirou as fotos?
- Tirei bastante.
- Ótimo!
- Mas como foi? – Lúcia indaga aflita
- Olha, você viu aquela menina com síndrome de down? – Horácio indaga a Heloísa
- Vi.
- Agora tá confirmado. A mulher respondeu quando a chamei pelo nome, eu falei nele e a menina disse: papai. Eu disse que ia falar com ele que ela estava saudosa e a mulher não negou que ele seria pai dela.
- Mas independente disto, eu já havia tomado a minha decisão. – Lúcia afirma.
- Você tem mais provas do que poderia imaginar. – Heloísa observa
- As que eu tive antes, já foram mais do que suficientes.
Mais tarde, em casa, Lúcia recebe um telefonema de Vitor pedindo para que vá à sua casa e ela desconfia.
- Sérgio deve estar lá – Lúcia conclui.
- Sabe cumé o Vitor, né, Lúcia? Mas ele não vai dar palpite, só tá querendo ajudar. – Heloísa opina.
- Você vai comigo?
- Eu posso ir, mas vou esperar lá fora, ou ficar conversando com o Vitor e a Lelê. É uma parada que você vai ter que resolver.
- Não vai ser fácil.
- Mas você consegue, já enfrentou o pior.
Conforme as suspeitas, Sérgio aguardava Lúcia na casa de Vitor e esta não se surpreende ao vê-lo. Os dois ficam a sós.
- Vamos conversar como gente civilizada, Lúcia.
- Claro, eu vim preparada pra isto.
- Como?
- Sérgio, conhecendo bem seu irmão e sabendo como você se sentiu por ter sido desmascarado, acha que eu não contava com você aqui? Não sou tão otária assim.
- Você concordou comigo em conversar civilizadamente, cumpra o que disse.
- Perfeitamente, sou toda ouvidos.
- Lúcia, eu estou arrependido. Eu sei o quanto errei mas estou disposto a recomeçar, quero uma nova chance, não é justo com os nossos filhos.
- Não acha um pouco tarde?
- Nunca é tarde pra se arrepender, Lúcia.
- Sérgio, se eu não tivesse sabido que você estava lá na situação que vi, você estaria arrependido?
Sérgio fica sem resposta e não a encara.
- Você disse que não achava justo com nossos filhos. Filhos não pedem pra nascer, por isto, eu aproveito o ensejo pra dizer que também não é justa a vida que leva a sua filha!
- O quê?! - Sérgio chega a enrubescer de nervosismo.
- Isto mesmo. Eu já tinha provas suficientes pra tomar uma decisão e agora tenho mais. Fui à casa que você comprou pra ela e embora o nome do comprador não apareça como o seu, sei que foi você. Você sustenta uma mulher de nome Adenir, que tem uma filha sua e a menina tem síndrome de down. Vamos acabar com isto. Eu quero o divórcio.
Sérgio sente-se vencido. Imagina quem o teria delatado, lembra de várias amantes que seriam capazes disto, mas de nada adianta, a vingança anônima estava consolidada e a separação é inevitável.
Lúcia relata o fato aos filhos e Sônia fica estarrecida e revoltada.
- Mãe! Meu pai é muito pior do que eu imaginava! Não quero mais ver a cara dele!
- Nem eu! – Ivan interrompe, sentindo a mesma indignação.
- Deixem eu falar. – Lúcia tenta acalmar os filhos - Não é nada fácil acabar com um casamento. Ele deixa de ser meu marido, mas nunca de ser pai de vocês. Além do mais, a menina não tem culpa e é irmã de vocês.
- Você a viu? – Sônia se interessa.
- Não, o Horácio viu e tirou fotos. Eu tenho provas, mas não vou fazer nada contra o pai de vocês. Só vou reivindicar o que é de direito. Ele pode ver vocês a hora que quiser. Nunca fui vingativa e não vou interferir na relação de vocês com ele e vocês podem ter contato com a sua irmã, que vive muito isolada.
- Mãe...eu...minha cabeça tá cheia! Tanta coisa assim de repente, uma bomba estourando atrás da outra! – Sônia chora desesperada
- Claro, minha filha. Eu sei como você deve estar se sentindo.
Sônia sobe para seu quarto e pega o diário, lendo antes as passagens do dia: “Irai-vos e não pequeis; consultai no travesseiro o coração e sossegai (Salmos, 4: 4); “Por que a ira do homem não produz a justiça de Deus” (Tiago, 1: 20).
Rio, 15 de julho de 2002
Querido diário
Oi, faz um tempão que eu não escrevo. Tenho andado chateada, revoltada. Descobri tantas coisas que não imaginava sobre o meu pai. Acho que na minha cabeça ele era perfeito e agora vejo que embora soubesse que não, ele tem muito mais defeitos do que eu poderia imaginar. Descobri tanta coisa errada que até dói escrever, mas a última, é que eu e o Ivan, temos uma irmã de 8 pra 9 anos que tem síndrome de down. Minha avó diz que a gente deve honrar pai e mãe, mas eu não quero ver meu pai agora. Eu preciso acreditar que exista a justiça de Deus, pois, como Deus pode permitir uma criança nascer com este problema? Ela não tem culpa de nada.
Minha cabeça tá cheia e eu nem consigo pensar. Minhas primas têm sido legais comigo, eu é que não tô muito a fim de ouvir nada. Elas dizem pra eu perdoar meu pai, mas eu não consigo. Eu preciso de um tempo.
Por enquanto, é só.
Tchau,
Sônia.
Ao terminar de escrever em seu diário, Sônia toma uma decisão:
- Mãe, eu quero conhecer minha irmã.
- É um direito seu.
Lúcia fala com Vitor e este a acompanha e aos filhos para conhecerem a irmã. Vitor se apresenta inicialmente:
- Bom dia.
- Bom dia. – responde Adenir
- Seu nome é Adenir?
- Sim. O senhor veio procurar alguém aqui? Nunca vi o senhor. Não é a primeira vez que alguém aparece aqui já sabendo o meu nome. O que o senhor quer?
- Não se preocupe, eu sou irmão do Sérgio. Estou acompanhando meus sobrinhos, Sônia e Ivan que ficaram sabendo que têm uma irmã e quiseram conhecê-la. Meu irmão está se separando, mas a mãe dos seus filhos não vai impedir que eles tenham contato com sua filha e é com a autorização dela que estou aqui.
Apesar de um pouco temerosa, Adenir chama Sílvia e seus irmãos se apresentam:
- Oi, eu sou a Sônia, sua irmã.
- Sônia... – Sílvia repete
- Eu sou o Ivan.
- Ivan...
Sônia e Ivan a princípio ficam com pena da irmã. Sônia, mais sensível, se afeiçoa logo; Ivan resiste um pouco.
Voltando para casa, Sônia fala com as primas:
- Gente, tô sentindo tanto amor pela minha irmã.
- Que bom, Sônia – Sandra sorri satisfeita
- Ela tocou seu coração, né? – Suzana observa
- É...Até o Ivan conversou com ela.
- É, estamos vendo milagres. – Suzana comemora – Agora só falta você aceitar Jesus.
- Sabe, Sú, eu fico pensando sobre isto. Não sei...mas eu olho pra você, sinto uma diferença.
- Esta diferença é Jesus na minha vida. Pode ser na sua também.
- Mas, será que é assim? Quer dizer...ah...sei lá, não sei explicar!
- Sônia, as coisas espirituais se discernem espiritualmente, não adianta buscar explicação pela lógica humana – Sandra argumenta.
- É, Sônia. – Suzana concorda - Você tá tendo uma experiência nova, conheceu uma irmã, sente amor por ela. Deus se agrada disto. Ela veio através do adultério, mas é sua irmã e é uma benção de Deus.
- Sônia, a gente sempre foi mais do que primas, somos mais que irmãs, eu gostaria que você, assim como a Suzana, se tornasse agora nossa irmã em Cristo. – Sandra convida
- Ah, gente, mas eu sempre acreditei em Cristo. Tive até uma revolta com tudo isto, mas não deixei de acreditar.
- Mas é importante declarar isto. – Suzana olha firme para Sônia.
- Por quê?
- Por quê declarando que Jesus é seu único salvador, anula qualquer força contrária - Sandra reforça.
- É simples, é só repetir uma oração. – Sandra ora com Suzana intercedendo e impondo as mãos sobre Sônia, que repete a oração de aceitação a Jesus.
- Nós também queremos conhecer a Sílvia! – Sandra dá a idéia
- É isso aí! – Suzana concorda – Amanhã vamos pedir ao Alfredo pra nos levar lá.
Suzana e Sandra conhecem a prima Sílvia. Oram por sua vida e levam-na a uma igreja próxima onde o pastor intercede pela menina e esta repete uma oração de aceitação a Jesus, diante dos olhares emocionados das primas e da irmã. Renato e Alfredo, também presentes, declaram Jesus como seu único salvador.
- Pena que o Ivan não esteja aqui. – Sônia lamenta
- Nem tudo é na hora que a gente deseja, né Sônia? – Sandra conforta a prima.
- Mas só o desejar, já confirma a promessa de Deus nas nossas vidas! – Suzana afirma com esperanças – “Crê no Senhor Jesus e serás salvo, tu e tua casa”, é a promessa. Não importa o tempo, vai acontecer! “Pois mil anos aos Teus olhos são como o dia de ontem que se foi e como a vigília da noite” (Salmo 89: 4).
As inseparáveis primas agora são três irmãs em Cristo. Ainda em férias de meio de ano, as três saem alegres numa manhã para passear e evangelizar nas proximidades de casa. Pouco antes de chegarem, uma menina loura de cabelos lisos pouco acima dos ombros, vestida simplesmente de blusa branca e saia jeans aparentando cerca de 16 anos, aproxima-se do Solar Castelli, interfonando:
- Alô? – Viriato atende.
- Bom dia.
- Bom dia.
- Por favor, aqui é que mora o Dani?
- O Daniel?
- Sim, ele mesmo.
- Ele não mora mais aqui.
- Não?!
- Não.
- Mas...não é aí que moram os pais dele, os tios?
- Sim, mas ele não mora mais aqui.
- Tá... ‘brigada...
Viriato quer na realidade proteger Daniel e prefere não dar detalhes sobre seu paradeiro, pensando que a menina possa ser uma má influência.
- Quem era Viriato? – Alfredo pergunta
- Cara, não tô nem querendo saber. Uma garota procurando o Daniel. E se for alguém metida em encrenca, drogas, querendo tirar alguma coisa, fazer alguma chantagem? A gente nunca sabe.
- Será?
- Na dúvida, é melhor não arriscar.
Lá fora, arrasada por não ter notícias de Daniel, a menina fica imaginando o que teria acontecido a ele. Não sabe o que fazer e chora desesperadamente encostada ao muro. Neste momento, o TRIO EM S, vem chegando e Suzana é a primeira a reparar na menina.
- Gente, olha lá aquela menina encostada no muro, ela tá chorando.
- Tadinha... – Sônia se compadece.
- Vamos lá ver o que tá acontecendo com ela. – Suzana decide.
- Menina! – Suzana chama e a menina assustada tenta correr, mas logo para, sentindo-se mal e as três a alcançam.
- Você não tá bem. – Suzana segura a menina reparando que está ofegante e parece que vai desmaiar.
- Eu...ai....
- Respira fundo! – Sandra recomenda.
- Cê tá pálida! – Sônia impressiona-se.
- Vamos pra dentro. – Suzana decide. A menina é amparada por Suzana e Sandra enquanto Sônia interfona para o portão ser aberto. Viriato acha uma loucura trazerem para dentro de casa alguém que não conhecem.
- Deixa com a gente! – Sandra o tranquiliza
- Eu vou chamar minha mãe. – Suzana corre para procurar Soraya.
Sandra e Sônia sentam a menina no jardim e a ouvem.
- Que há com você? Por que tava chorando? – Sandra preocupa-se
- Eu...eu.. ai... – a menina leva a mão à boca e pergunta apressada:
- Tem algum banheiro aqui perto?
- Eu levo você. – Sandra a acompanha e a menina vomita muito.
Voltando um pouco melhor, a menina fala com as duas
- Eu tava procurando o Dani.
- O seu nome é... – Sandra espera que ela responda
- Flávia.
- Flávia! Que bom que você apareceu! Ele queria muito saber de você, não a encontrava, não conseguia ligação. Eu sou irmã dele, meu nome é Sandra.
- Eu tive que mudar às pressas com minha mãe e não consegui encontrar o Dani. O celular dele tava com outra pessoa. Eu fiquei desconfiada quando ouvi uma outra voz. O cara parecia tão malandro pela voz que eu tive medo de dar qualquer informação. Liguei da casa de uma amiga. Depois ela disse que ligaram perguntando por ele e ela disse que nem o conhecia, que era um engano e desligou logo.
- Você...bem, eu ainda sou muito nova, mas percebo as coisas. – Sandra espera por uma confirmação
- Eu tô grávida.
- Do Daniel? - Sônia pergunta
- Claro que é dele! – Flávia fica muito ofendida e chora.
- Sônia! – Sandra a repreende.
- Desculpe, não falei por mal, foi sem pensar.
- Calma, Flávia, não fica assim. – Sandra a consola, enxugando suas lágrimas com um lenço.
- Bebe um pouco d’água – Sônia oferece
- Você não tem ninguém que possa ajudar? Você não tem mãe, pai? – Suzana pergunta
- Pai? Nem sei quem é e acho que nem a minha mãe sabe. Ela diz que já fez muito em me colocar no mundo. Me chama de acidente biológico. A única pessoa que me amava e com quem eu podia contar era a minha avó, que me criou até há dois anos quando morreu.
- Você tá se sentindo muito só, né? – Sandra compreende a situação de Flávia
- Eu...eu descobri que tava grávida e tentei falar com o Dani. Minha mãe entregou a casa e mudou às pressas. Tô com outro telefone, por isso que ele não me encontrou. Eu tentei esconder e ainda tô tentando, mas minha mãe só não descobriu por que não para em casa. Eu preciso falar pro Dani...eu preciso saber onde ele tá.
Soraya e Suzana aparecem e Sandra e Sônia ajudam Flávia a contar tudo.
- Minha filha... – Soraya se compadece de Flávia – Eu acredito em tudo o que você disse, mas a mãe do Dani é uma pessoa muito rigorosa e por ser assistente social tenho certeza que vai exigir que assim que a criança nasça você faça um teste de DNA.
- Eu não tenho nada a temer, só não quero abortar, eu vou ter este filho de qualquer jeito, mesmo que o Dani nem quisesse mais saber de mim! Pelo menos um filho é uma boa lembrança do que a gente passou junto.
- Calma filhinha... – Soraya a conforta – Ninguém vai fazer você abortar e eu acho que o Daniel vai gostar de saber. Ele tá muito mudado.
- Ele quer muito saber de você. Ele falou isso comigo. – Sandra a anima
- Vocês não me disseram ainda onde ele tá. – Flávia se interessa
- Ele tá muito bem, numa casa de reabilitação pra dependentes químicos – Soraya informa.
- Eu...eu percebia que havia alguma coisa errada com ele, mas eu não tenho experiência nestas coisas.
- O pior já passou, nem vale a pena falar sobre isto – Sandra fala aliviada – Eu sofri muito também, porque meu irmão e eu sempre nos demos muito bem e ele tava tão perdido, mas finalmente encontrou Jesus.
- Quê?! – Flávia fica espantada
- Isto mesmo que você ouviu - Suzana confirma
- O que importa agora é ajudar esta menina – Soraya considera-se objetiva, não entendendo a profundidade das palavras das meninas.
- Você vai ter que contar pra sua mãe, né? – Sônia indaga
- Ela não vai me ajudar.
- Eu sei quem pode te ajudar – Sônia imediatamente tem uma idéia
Soraya liga para Vitor e vai com as meninas e Flávia à casa do cunhado, expõe a situação e ele se dispõe a falar com mãe de Flávia.
Chegando à casa de Flávia, Vitor toca a campainha e uma mulher de cabelos de um tom castanho meio marrom mal penteados, usando um traje estampado e tamancos de saltos bem altos, exageradamente maquiada e segurando um cigarro atende.
- A Sra. é dona Valéria?
- Dona? Eu não sou dona não senhor. Tenho só 32 anos. O senhor veio por alguma indicação?
- Eu vim por intermédio da sua filha.
- Da Flávia? Houve alguma coisa com ela? – apesar de perguntar, Valéria não demonstra interesse pela filha.
- Não se preocupe, ela está comigo, eu só vim na frente. Flávia, venha, querida.
Flávia atende e entra.
- Até que enfim, hein, garota? Tive que arrumar tudo sozinha, você tá sumida desde manhã e não avisa nada, tá pensando que aqui é hotel? O feijão que ‘cê come, é de graça pra você, mas pra mim custa caro, tá? Quer mole? Ninguém come da minha comida sem pagar, mesmo que não seja com dinheiro! Tá cheio de roupa suja, não dá pra fazer tudo ao mesmo tempo!
- Mãe, a gente precisa conversar.
- Conversar?! Não tô com tempo pra conversa e o senhor, se não veio como cliente, diga o que quer e me dê licença.
- Eu vim da parte de sua filha...
- Mãe, eu to grávida – Flávia o interrompe
- Quê?! Tá louca?! Mais uma boca?! Nem morta, santa! Te vira! Aborta ou vai à luta!
- Calma, minha senhora... – Vitor tenta apaziguar
- Calma, por que não é com o senhor! Já não é mole levar a vida com esta menina e ela ainda acha que eu vou ter mais um aqui pra sustentar? Você não tem cabeça, né otária? Se queria dar o golpe da barriga, devia dar bem feito! Aposto que o pai nem quer saber!
- Ele não sabe ainda. – Vitor fala antes que Flávia dê alguma resposta, percebendo o nervosismo e indignação da menina.
- Quero ver só quando souber! – Valéria não acredita que ele vá assumir o filho
- Chega! Eu vou embora daqui! Você nunca foi minha mãe, só me botou no mundo e eu não preciso de você pra nada! Quem foi minha mãe, foi a minha avó, que se estivesse viva ia me repreender, mas não ia me dar as costas!
- A porta da rua é a serventia da casa! – Valéria responde com ódio.
- Espera um pouco. – Vitor novamente procura interceder – Ela errou, não pensou, mas é sua filha, é menor, a senhora é responsável por ela.
- É?! Pra fazer filho ela não lembrou disto! Agora, que se vire!
- Vou pegar minhas coisas e cair fora daqui! Ai! – Flávia passa mal e Vitor a segura
- Calma Flávia. Pensa em Jesus, tudo vai ficar bem.
- Ai....que dor...se eu perder meu filho por causa dela eu acabo com ela...
- Ela é sua mãe...
- Ela nunca foi mãe, só é uma mulher que teve uma filha! Eu vou trabalhar honestamente, não vou ganhar a vida de maneira fácil do mesmo jeito que ela faz!
- Cretina! – Valéria dá uma bofetada em Flávia – Você fala isto, mas tava sendo sustentada por mim! E fez filho debaixo do meu teto! Quem é você pra falar de mim?! Rua!
- Não se magoem. – Vitor pondera
- O senhor não ouviu ela dizer que eu não sou mãe? Pois então, agora é que eu não vou ser mesmo!
Flávia continua sentindo-se mal e Vitor a ampara
- Flávia, eu ajudo você a arrumar suas coisas, mas antes eu quero orar por você. Vamos expulsar todo o mal em nome de Jesus. Você vai ter seu filho. Ele será uma benção.
- Tratem de ser breves que eu tenho muito o que fazer! Pega tudo o que é teu e some daqui pra sempre!
Vitor ora por Flávia e ela melhora. Ajuda-a a juntar suas coisas e antes de saírem, fala para Valéria:
- Aqui está o meu cartão, ela vai ficar na minha casa, com a minha família.
- Eu não tenho mais nada com ela! – Valéria rasga o cartão - O senhor já tomou muito meu tempo! Leva essa coisa daqui!
Vitor leva Flávia ao médico que lhe prescreve repouso absoluto e remédios para segurar a gravidez. A menina é muito bem recebida pela família de Vitor, ocupando o mesmo quarto que Patty, que logo se dispõe a cuidar dela. Flávia sente-se ganhando a família que não tinha.
- Nem sei como vou agradecer. – Flávia diz a Vitor
- Eu fiz o que faria por qualquer pessoa necessitada.
- Mas eu não quero ficar aqui sem colaborar, eu quero trabalhar.
- Mas agora, neste momento, você tem que repousar.
- Mas eu preciso acertar isto, não me sinto bem assim.
- Flávia, se você se sente melhor, eu ofereço um trabalho pra você na cantina da minha escola.
- Assim que puder eu começo.
- Você não estuda?
- Eu tive que parar.
- Precisamos acertar isto também, mas, tudo a seu tempo.
- Com esta correria toda, a gente ainda não fez o principal.
- O que?
- Falar com o Dani.
- É mesmo.
- Mas eu ainda não posso ir aonde ele está.
- Lá é rigoroso pra saída dos internos, mas, como ele está indo bem, acho que não vai ser difícil trazê-lo aqui.
- Se o senhor puder, eu agradeço muito, mas, sobre a gravidez, deixa que eu conto.
Daniel é liberado para ver Flávia e um membro da casa de reabilitação o acompanha até a casa de Vitor. Daniel entra no quarto e encontra Flávia dormindo. Acorda-a com um suave beijo no rosto.
- Dani! – Flávia joga-se nos braços de seu amor, chorando de emoção, de felicidade por revê-lo.
- Tô aqui, minha linda, pronto pra recomeçar. Perdoa o sofrimento que te fiz passar. Você me procurou e eu também tentei achar você...
- Agora a gente tá aqui junto e é isto que importa.
- É claro, amor. Mas agora vai ser tudo diferente. Eu não dei a você o valor que você realmente tem. Foi preciso sentir muito sua falta pra saber o quanto é importante pra mim. Tô sentindo que você quer contar alguma coisa.
- Eu queria fazer mais suspense, mas não agüento.
- Então, fala.
- Amor...eu tô aqui, assim, deitada, de repouso, por que...tô grávida!
- Fofinha! – Daniel a abraça.
- Dani... Sua reação foi muito melhor do que eu esperava.
- Por quê? Pensou que eu não ia gostar?
- Ah, Dani...é que me assustaram dizendo que a sua mãe ia exigir um exame de DNA.
- Deixa isso comigo. Agora eu quero é tratar de nós dois.
- O que você quer fazer?
- Eu te amo e você tá grávida. Vamos casar.
- Você quer mesmo casar comigo?
- Quero, mas na presença do Senhor.
- Como assim?
- Flávia, Eu conheci um Deus que é Deus acima de qualquer um e quero que você também O conheça.
- Mas Dani, eu já tenho religião.
- Você pode até ter, mas será que você tem Jesus?
- E por que eu não teria? Eu rezo sempre!
- Já pensou em qual Jesus que você acredita? Será que é o que tá vivo, ou o que tá na cruz?
- Dani, eu fui batizada, fiz 1ª comunhão.
- Eu vou ser batizado.
- Mas Dani, você já não tem padrinho?
- Gatinha, não tô falando neste batismo que nossos pais decidem. Tô falando de um batismo que é da minha própria decisão, depois que aceitei Jesus como meu único e suficiente salvador.
- Dani, desculpa, amor. Eu te amo, sinto que você tá bem melhor, tá até mais calmo, tranqüilo, mas não é isso que eu quero seguir. Vamos combinar assim: você segue a sua religião que eu sigo a minha, tá?
- Gatinha, eu não sigo uma religião, eu sigo Jesus.
- Tá amor, mas eu também sigo.
- Flávia, tio Vitor e a família dele te abriram os braços, a porta da casa e o coração. Você foi praticamente adotada por ele. Ele tem sido um pai pra você, né?
- Ah, Dani...eu acho que se o meu pai biológico soubesse da minha existência, não viria a me aceitar como filha.
- Muitos pais biológicos rejeitam seus filhos, mas existe um Pai que é eterno, que nunca nos deixa, que tá pronto a aceitar a gente, a adotar a gente como filho, quando aceitamos O Filho d’Ele como único e suficiente salvador. Você não acha que o tio Vitor é um filho de Deus?
- Mas todos são filhos de Deus.
- Pra ser filho de Deus, a gente tem que aceitar O Filho d’Ele, Jesus, como nosso único e suficiente salvador.
- Então eu sou filha de Deus, eu aceito Jesus.
- Então, você deve declarar isto.
- Ah, Dani, dá um tempo! Eu não preciso fazer isto.
Daniel entende a posição de Flávia e sente um sinal de Deus de que tudo é uma questão de tempo.
Os pais de Daniel ficam sabendo da gravidez e indagam sobre a possibilidade do filho não ser seu, ao que ele, ofendido responde:
- Não vou casar com desconfiança. Eu creio que o filho é meu. Além do mais, quem sou eu pra julgar a Flávia? Eu não fui sempre fiel!
- Mas você é homem! – Paulo retruca com machismo.
- Que é isto, pai?! Você acha que só a mulher deve ser fiel? Numa relação deve haver fidelidade dos dois lados e eu me arrependo. Quero recomeçar, pois eu sei o quanto preciso dela e sei que não vou ser feliz com outra.
- Ela tá na sua igreja? – Heloísa indaga
- Ela vai comigo.
- Mas não tá lá, assim como você tá, né? – Heloísa insiste
- Ainda não, mãe, mas vai estar. Eu sei o que tô dizendo.
- Espero que saiba mesmo. – Heloísa continua descrente.
Flávia sente-se cada vez mais amada pela família de Vitor e participa de todas as festas, inclusive do aniversário de Helena e das atividades na escola, onde passa a trabalhar. Fica inquieta com a mudança de Daniel, que, apesar de tratá-la com carinho, evita maiores intimidades. Percebe que os adolescentes e jovens da igreja namoram de uma forma diferente. Flávia vai à igreja só para estar perto de Daniel e também por insegurança, pois teme que ele possa se interessar por alguma garota de lá. Daniel persiste, mesmo vendo as atitudes da namorada contrárias às suas orações.
No início do culto, sempre sentada com Daniel num banco bem atrás, Flávia debocha:
- Já vai começar: “Irrrrmãos!” – Flávia ergue as mãos
- Olha o respeito! – Daniel dá uma leve cotovelada em Flávia
- Ai, tá amor...desculpa.
Flávia ouve o louvor, a pregação e embora não fique atenta o tempo inteiro, sente-se mal quando ouve o trecho: “Atendei vós, pois, à parábola do semeador. A todos os que ouvem a palavra do reino e não a compreendem, vem o maligno e arrebata o que lhes foi semeado no coração. Este é o que foi semeado à beira do caminho. O que foi semeado em solo rochoso, esse é o que ouve a palavra e a recebe logo, com alegria; mas não tem raiz em si mesmo, sendo antes, de pouca duração, em lhe chegando a angústia e a perseguição por causa da palavra, logo se escandaliza. O que foi semeado entre os espinhos é o que ouve a palavra, porém os cuidados do mundo e a fascinação das riquezas sufocam a palavra e fica infrutífera. Mas o que foi semeado em boa terra é o que ouve a palavra e a compreende; este frutifica e produz a cem, a sessenta e a trinta por um” (Mateus, 13: 18 – 23).
Flávia sente vontade de sair, mas, mesmo contrariada, ouve até o fim e o incômodo é maior quando o pastor questiona a todos na pregação:
- E você, que terra é?
A pergunta vem como uma flecha em seu coração, pois o carinho que é tratada pela família de Vitor levam-na a uma comparação sobre que terra seria ela no meio deles. Lá fora, fala com Daniel:
- Amor, desculpa, tá?
- Tudo bem.
- É que...ai, Dani...eu não combino com isto. É tão diferente do que eu aprendi.
- Fofinha, você precisa aprender a separar Deus de religião.
- Mas eu aprendi a ver Deus através da minha religião.
- Por tradição, herança.
- Dani, futebol, política e religião não se discute!
- Nem eu vou discutir com você.
- Mas, no íntimo, você gostaria que eu fizesse parte da sua igreja, que pensasse igual a você.
- Flávia, o Espírito Santo é que me tocou. Eu não passei a pensar como ninguém.
- Ah, Dani, não dá pra conversar assim!
- Flávia, você tá tendo a oportunidade de conhecer uma família como a do tio Vitor, homem que antes parecia pra mim ridículo, mas agora é um exemplo. Tem defeitos como qualquer ser humano, mas é um homem de Deus, com uma família abençoada que também serve a Deus.
- Dani, se eu não quiser fazer parte da sua igreja, você deixaria de se casar comigo?
A pergunta deixa Daniel por alguns segundos calado, sério, o que preocupa Flávia.
- Responde, Dani. – Flávia fica mais tensa, com vontade de chorar.
- Gatinha, te amo muito, amo muito nosso filho e vou fazer tudo por ele, mas, em primeiro lugar, adoro a Deus.
- Quer dizer então que você não se casaria comigo se eu não quisesse fazer parte da sua igreja?! – Flávia fala com a voz embargada, mas Daniel, apesar de lamentar, mantem uma posição firme.
- Paulo pediu a Deus que retirasse um espinho de sua carne. Deus respondeu: “A minha graça te basta”. Se este é o meu espinho na carne, por mais que me doa, a graça de Deus é meu consolo. Me perdoa, mas é assim que eu penso.
Flávia está mais sensível devido a gravidez e acha as palavras de Daniel cruéis demais, considera a atitude dele para com ela que lhe dispensava tanto amor, uma ingratidão. Reflete sobre o que falou sobre a família de Vitor, que é como sempre desejou. Emoções confusas se passam sobre sua mente. “Por que tem que ser assim?” – Flávia pergunta-se.

domingo, 18 de julho de 2010

CAPÍTULO XXV

REVIRAVOLTA
Sentindo a aflição de Lúcia ao telefone, Heloísa apressa-se em ir à sua casa.
- Que bom que você chegou, eu quero mostrar isto antes que os meninos cheguem do colégio. – Lúcia entrega a carta à Heloísa.
- Eu vou ler, mas não posso demorar muito. Tenho que resolver muitas coisas no trabalho.
Heloísa lê silenciosamente a carta:
Se quiser saber o que seu marido fará no próximo sábado, vá à casa de Cabo Frio.
- Não tem assinatura. – Lúcia observa
- E a pessoa foi bem esperta, né? Carta anônima escrita com recortes de revista.
- Bem, Lúcia, como estou com pressa, vou ser objetiva; o que você pretende fazer?
- Eu...acho que vou lá.
- Se você quiser, vou com você.
- Eu ia pedir mesmo.
- Lúcia, conte com o meu apoio. Não sei o que vai acontecer daqui por diante, mas você pode contar comigo.
- Obrigada Helô.
- Vou levar um amigo que é detetive.
Lúcia não deixa transparecer sua apreensão aos filhos e no sábado sai bem cedo com Heloísa e o amigo desta, o detetive Horácio, para Cabo Frio.
- Chegamos. – Lúcia fica ansiosa querendo sair do carro, mas Heloísa alerta:
- Peraí, Lúcia. Vamos ver se tem movimento. Assim que você ver alguém, pega a máquina, Horácio.
- Deixa comigo.
- Tá parecendo que não tem ninguém. – Lúcia observa
- Olha lá, o Sérgio tá saindo com um grupo! – Heloísa aponta
- E cheio de mulheres! – Lúcia exclama indignada. – Agora é que eu pego este vigarista!
- Calma, Lúcia! – Heloísa a segura – Vamos ser prudentes, o Horácio já fotografou.
- Vamos atrás deles! – Horácio decide ao ver que todos estão entrando no carro de Sérgio.
Os três seguem o carro que se dirige a um clube próximo. Ao chegarem lá, Lúcia espera um pouco e não tem dificuldades de entrar, pois é conhecida no clube. Horácio tira mais fotos para ter mais provas. Ao ver Sérgio afastar-se um momento do grupo, Lúcia aproxima-se.
- Bom dia.
- Bom dia. – responde o grupo
- Vocês conhecem uma casa nas Palmeiras, no nº 14?
- Nós estamos lá – responde uma moça do grupo.
- Estavam lá! - Lúcia altera o tom de voz - Porque lá é minha casa e vocês vão sair de lá agora!
Neste mesmo momento, Sérgio aparece.
- Lúcia!!!!
- Cala a boca, seu cretino! – Lúcia furiosa dá-lhe uma “bolsada” na cara – Não quero ouvir sua voz, me solta! – desvencilha-se com violência do marido que tenta acalmá-la segurando-a.
- Mas Lúcia, eu...
- Não adianta, as justificativas agora são pro meu advogado! Eu segui você de casa até aqui e tenho provas! Não me apareça no Solar! – Lúcia chora de raiva e joga-se nos braços de Heloísa.
- Cafajeste! – Heloísa grita para Sérgio dando-lhe uma bolsada na cara
Lúcia volta à casa, repreende os empregados coniventes com Sérgio e despede todos. Vai até todos os quartos e joga todas as coisas dos convidados de Sérgio pela janela.
No Solar, Suzana, Sandra e Sônia recebem as visitas de Rodrigo, Ricardo e Renato.
- Amor, Jesus é demais! – Rodrigo exclama entusiasmado
- Não dá pra descrever, né? É sentir! – Suzana exulta de felicidade
- Quando são só os dois parece que a conversa é só essa. – Sandra critica
- É. O Rodrigo tá...sei lá...diferente...mas é engraçado...ele parece mais alegre – Ricardo observa
- Os pais dele, o que acharam?
- O pai criticou mais, a mãe disse que ele tem o direito de seguir o que quiser.
- Dani também tá nessa...mas tenho que reconhecer que ele tá muito diferente. Nem parece que ele esteve envolvido com drogas. Ele segue toda a rotina do centro de reabilitação e tem sempre uma palavra amiga pra quem chega. Ele foi pra lá realmente mais pra ajudar. Tô achando a Suzana mais exagerada, numa euforia que eu tenho até medo que daqui a pouco entre noutra depressão.
- Vamos dar tempo ao tempo. Eu conheço pouco a Suzana, mas tô achando que ela tá bem melhor. Não era nada fácil agüentar aqueles “micos” que ela dava quando bebia.
- Isso é... – Sandra concorda, relembrando.
Não muito distante, de outro lado do jardim, Sônia e Renato conversavam:
- Minha mãe saiu cedo hoje com a tia Helô.
- E daí? Você parece preocupada.
- É que ela não costuma fazer isto. Ainda mais num sábado.
- Não deve ter acontecido nada demais.
- Pois eu acho que sim, ela tá demorando muito. Eu acordei até cedo, umas 7:30 e ela já tinha saído fazia tempo. Agora já é quase meio dia e elas não chegaram.
Lúcia para nas proximidades de Cabo Frio num bar para se acalmar.
- Aquele safado! Ele vai ver! Eu devia ter ido atrás dele muito antes!
- Lúcia, você tem que esfriar a cabeça. – Heloísa aconselha – Pense nos seus filhos.
- Mas eu tô assim por causa deles também! O pai é o herói deles!
- Eu sei que vai ser difícil contar, mas eles vão precisar muito de você. Daqui pra frente vai ser você e eles.
- Eu queria estar com meus pais agora.
- Prepara os dois. Eles sempre gostaram do Sérgio.
- Como eu fui alienada! Eu poderia ter evitado que chegasse a este ponto.
- Não é tão fácil assim. A gente prefere acreditar que tá tudo bem, mesmo que pressinta que não.
- A única vez em anos que eu fiquei revoltada foi quando a Sônia sofreu aquele acidente e ele não estava.
- Outras situações já incomodavam. O Ivan com aquela mania de computador.
- Eu sei o que me aguarda daqui pra frente. Divorciada, tendo que encarar tudo sozinha. Coisa que até eu fazia, mas o Sérgio ainda dava um jeito no Ivan. Agora aquele menino vai ficar mais difícil, mais rebelde.
- Sônia também vai precisar de apoio, ela vai sofrer muito Lúcia.
- É...ela é muito sensível.
- Quando ocorre um problema como este, a gente até se surpreende com os “muito quietinhos” como a Sônia. Ela se parece muito com você, sabe? Muito quieta, procurando se convencer que tá tudo bem. Enquanto a Sandra sempre ponderou e a Suzana sempre agiu sem pensar, a Sônia geralmente esperava uma decisão, ficando em cima do muro.
- Você quer dizer que ela pode ter uma reação pior do que eu espero?
- Acho que sim. Tenha muito discernimento pra passar a situação pros dois.
No Solar, Sandra continua conversando com Ricardo, que convida:
- Não quer ir almoçar lá em casa? A gente fica mais à vontade.
- Tenho que falar com meu pai. Ah! Tá ele aí chegando. Pai!
- Oi?
- Pai, eu posso ir à casa do Rick?
- Como assim?
- Passar o dia lá.
- E tem mais alguém em casa?
- Claro, Dr. Paulo. – responde Ricardo – Meus pais estão lá. Hoje é sábado.
- Eu vou ligar pra sua casa. – Paulo fica desconfiado.
- Como o senhor quiser. – Ricardo aceita.
Paulo liga certificando-se de que os pais do garoto estão em casa e autoriza Sandra a ir com o motorista e com a escolta de dois seguranças devido ao pânico gerado pelo seqüestro de Genaro, incumbindo estes de trazê-la de volta.
- Seu pai é durão, hein? E que exagero! Dois seguranças! – comenta Ricardo
- Ele não aparenta à primeira vista, mas é ciumento. Também tá com “neura” por causa do seqüestro do meu tio.
– Sandra ri, divertindo-se com a atitude do pai.
Pouco depois da saída de Sandra, Lúcia chega com Heloísa.
- Lúcia, eu só posso desejar boa sorte.
- Obrigada. Vai ser duro, mas eu vou conseguir.
- Você vai impor dias pra ele ver os filhos? Já pensou nisto?
- Helô, a relação deles com o pai é uma coisa que eu vou respeitar. Só não quero vê-lo. Eles que resolvam entre si.
- Está começando bem, Lúcia. A Sônia tá lá com o Renato.
- Eu vou pedir licença a ele.
Lúcia vai até a filha que percebe a tensão da mãe.
- Minha mãe, Rê. Ela parece preocupada.
- Oi, Renato.
- Oi, Dona Lúcia.
- Você podia me dar licença? Eu preciso muito falar com a Sônia.
Sônia levanta-se apreensiva.
- Você me espera? – Sônia pergunta a Renato
- Claro. – ele responde com um sorriso
- Vai ser um pouco demorada a conversa. – avisa Lúcia - Vou chamar seu irmão também.
- Fiquem à vontade, eu posso esperar. – Renato mostra-se solidário, percebendo que há algum problema.
- Não se prenda se precisar ir. – Lúcia adianta
- Eu não tenho nenhum compromisso. Tá tudo bem. – Renato reitera.
- Obrigada pelo interesse querido. – Lúcia agradece – Vamos entrar, com licença.
Sônia antes de entrar com a mãe sinaliza pelo olhar a Renato sua necessidade que ele continue por perto e ele entende respondendo com um olhar tranqüilo que a conforta. Lúcia, entrando com a filha, pede:
- Espere aqui que eu vou lá em cima chamar seu irmão.
Lúcia entra no quarto do filho, que está em clima de aventura no jogo do computador.
- Ivan.
Lúcia fala mais alto, mas o som do computador impede que o menino ouça.
- Ivan, desliga isto! – Lúcia percebe que ele a ignora totalmente sua presença e desliga o computador.
- Mãe!! por que você fez isto?! – Ivan grita irado e a mãe já contando com esta reação, o encara séria.
- Desça agora – fala com muita firmeza – Quero falar um assunto muito sério com você e sua irmã.
Impactado com a atitude mãe, Ivan a acompanha, embora ainda indignado pela interrupção brusca do seu jogo.
- Sente-se Ivan
- Tô bem de pé.
- Tá, como quiser. Quero saber o que vocês pensam das viagens a serviço de seu pai, nos últimos tempos, cada vez mais freqüentes? Diga Sônia.
- Eu...eu sinto muita falta dele...mas ele ficou um tempo sem viajar...
- Sim, mas só naquele período difícil em que o Genaro foi seqüestrado. Depois ele voltou a viajar mais do que de costume. - Lúcia lembra – O que você pensa disso?
- Ah, mãe...o que eu posso pensar? Quem sou eu pra dar palpite na vida profissional do meu pai?
- Você é filha dele, tem o direito pelo menos de questionar por quê um trabalho afasta tanto uma família.
- Mas a gente não tá afastado.
- Você tem certeza?
- Mãe, a gente ainda têve a oportunidade de estar junto na gincana do colégio... – Sônia argumenta
- Uma situação esporádica. O normal foi sempre ele estar distante, cuidando de negócios longe, construção de casas. – Lúcia persiste em sua observação
- Esta conversa tá ficando um saco – Ivan reclama levantando-se e chega a dar um passo, mas Lúcia breca:
- Pode ficar aqui mesmo! Tão cedo você não vai voltar pra aquela parafernália de computador e tem mais: terminando este período de férias de julho, vou resolver os horários em que vai ser ligado. Quero mais atenção aos estudos. As médias não estão nada boas! Aproveita esta sua revolta e dá sua opinião sobre o que estou perguntando.
- Ah, eu nunca pensei nisto e concordo com a Sônia! Que é que eu tenho que me meter no trabalho do meu pai?!
- Se ninguém tem nada mais a dizer eu vou ter que ser direta: vou me separar do pai de vocês.
- Como?! – Os irmãos perguntam ao mesmo tempo. Sônia levanta-se espantada e Ivan fica paralisado.
- Isto mesmo.
- Mas...mãe...assim...de repente – a voz de Sônia começa a embargar-se pelas lágrimas
- Filha... – Lúcia chega-se carinhosamente à Sônia – Não é de repente, houve uma razão forte pra esta decisão: eu recebi uma carta anônima dizendo que ele estaria na casa de Cabo Frio. Foi uma maldade, mas eu fui com tia Helô e um detetive e comprovei que seu pai me trai.
- Não...NÃO! – Sônia sai correndo pra fora e Ivan continua paralisado. Lá fora, Suzana percebendo que a prima não está bem, pede licença a Rodrigo e Renato que estavam com ela e a alcança.
- Sônia! Que foi?
Sônia não consegue dizer nada e Suzana a abraça fortemente. Rodrigo e Renato preocupam-se
- Que foi? – perguntam os dois quase ao mesmo tempo.
- Gente, desculpa...mas ela não tá bem. Eu tenho que ficar com ela. - Suzana sente que é algo muito sério.
- A gente entende, né, Rê?
- Claro. Depois liga pra gente.
- ‘Brigada pela compreensão de vocês, eu vou entrar com ela.
Suzana entra com Sônia amparando-a. Lúcia deixa as duas a sós. Suzana espera a prima se acalmar e a ouve:
- Eu...que pensei que a minha família tava melhor que a sua, que a da Sandra... – Sônia volta a chorar e seu corpo treme. Suzana, com compaixão da prima, a traz para perto de si.
- Soninha...você precisa de colo, priminha. – Suzana senta com a prima no seu colo e esta chora como uma criança indefesa com a cabeça no ombro dela.
- Chora...chora o quanto você precisar. Eu tô aqui. – Suzana acaricia e beija a cabeça de Sônia.
Enquanto isto, Sandra na casa de Ricardo, passeia abraçada com este pelo jardim.
- Pôxa...faz tempo que eu não passava um fim de semana tão tranqüilo. – Sandra comenta
- Vamos pra dentro? – Ricardo sugere
- Mas tá tão bom aqui.
- É, mas...a gente sobe, fica lá no meu quarto, mais à vontade, lá não tem circuito interno de TV.
- Ah, sei...isto é um saco. Lá no Solar também pelo menos nos nossos quartos também não tem.
- É, senão fica que nem aquele filme: “INVASÃO DE PRIVACIDADE”. – Ricardo compara.
Os dois entram e sobem para o quarto. Ricardo mostra suas coisas, os dois conversam, mas logo depois, como todos os adolescentes em ebulição de sentimentos, sentados na cama, intensificam suas carícias.
- Rick, vamos parar por aqui, tá muito acelerado. – Sandra levanta-se rapidamente
- Mas, que foi?
- Rick, o meu sentimento por você tem crescido a cada dia. Você é muito legal, companheiro, ouve os meus problemas, mas...
- Mas?
- Eu não me sinto preparada pra alguma coisa mais profunda, entende? Eu vejo as garotas se entregando totalmente pros garotos com uma pressa, uma ansiedade e cada vez mais cedo, parece que vão morrer se não deixarem de ser puras.
- Ah, pureza é um “estado de espírito!”
- Não sei se é só assim. Acho que a gente tem que aproveitar a vida. As crianças vêem coisas que nem deveriam ver na TV. Assim como as crianças devem ser crianças, nós também devemos ser adolescentes. Não vamos pular uma etapa boa da vida.
- Que visão mais psico-social, Sandra!
- Rick, eu não vou negar a atração que também sinto por você, me desculpa se eu racionalizo ou até intelectualizo demais, mas se você gosta mesmo de mim, vai ter que me aceitar assim.
- Eu fico doido quando te toco, te beijo, sinto teu perfume.
- Rick, desde que eu e minhas primas vimos você e os seus primos, foi uma coisa mágica, cada uma sentiu atração imediata exatamente por aquele que tá namorando agora. Vocês são nossos primeiros namorados.
- Eu também nunca senti por garota nenhuma o que sinto por você.
- Sei...é bom ouvir isto, mas segura, Rick, não é o momento.
- Tem medo que o seu pai vá ficar de marcação?
- Meu pai é antiquado, mas é legal. Minha mãe sempre conversou abertamente sobre estes assuntos comigo, nunca me proibiu, mas sempre me alertou. Sou eu mesma que não quero agora.
- Por que tanto medo?
- Rick, a gente tem que se conhecer melhor. Tudo deve ser naturalmente. Eu não tô dizendo que sou contra, mas é como se eu ouvisse um aviso de que se for agora eu vou me arrepender.
- Se arrepender? Mas eu te amo, Sandra.
- Tá, Rick, mas este amor todo ainda tá muito ligado ao físico, às sensações.
- Eu também amo a sua pessoa.
- Eu acho você especial, mas numa coisa você não é diferente dos garotos da sua idade: você quer matar a curiosidade. Eu não vou dizer que não tenha vontade, mas é que eu sinto que não devo. Pelo menos agora, não.
Sandra sente certo alívio quando alguém bate na porta. Ricardo abre e entra sua mãe.
- Rick, o pai da Sandra ligou informando que já está na hora dela ir.
- Eu já tô indo.
- Vamos só acabar de conversar e ela vai, mãe.
- Tá. Mas não demorem, hein? – a mãe de Ricardo olha um pouco desconfiada e sai.
- Sandra...eu...não sei, mas acho que deixei você com medo.
- Eu tenho medo até de mim. – Sandra expressa no olhar fixo para Ricardo uma inquietação, uma dificuldade de se dominar, dando-lhe esperança de realizar o seu desejo.
Sandra vai para o Solar e procura por Suzana. Não a encontra em casa e vai para a sua.
- Mãe, eu passei pela casa da Suzana e a tia Soraya disse que ela foi ficar com a Sônia. Eu fiquei preocupada, porque ela disse que a Sônia não tava bem e ela disse que você me contava.
Heloísa conta tudo à filha que fica impressionada, embora sempre desconfiasse das viagens de Sérgio.
- É, mãe, parece que tá havendo uma reviravolta por aqui. Eu vou subir pro quarto. Tô cansada.
Quando chega em cima, Paulo a interpela:
- Sandra, filhinha, tudo bem?
- Claro, pai.
- Bem mesmo? - torna a perguntar desconfiado
- Tudo bem, pai.
- Aquele garoto te tratou com respeito?
- Pai, não houve nada demais, eu só passei a tarde na casa dele, tá? Deixa eu entrar no meu quarto, por favor.
Sandra abre o diário e lê: “Resolveu Daniel, firmemente, não contaminar-se com as finas iguarias do rei, nem com o vinho que ele bebia; então, pediu ao chefe dos eunucos que lhe permitisse não contaminar-se” (Daniel, 1: 8); “Todas as coisas me são lícitas, mas eu não me deixarei dominar por nenhuma delas” (1 Coríntios, 6: 12).
Rio, 13 de julho de 2002
Meu querido diário
Mais uma vez eu tenho a sensação de ler uma frase direta pra mim, ainda mais por ter o nome Daniel na passagem bíblica. Sinto uma forte relação com ele e comigo. Há pouco tempo eu poderia dizer que tinha no tio Vitor um modelo de homem mais velho, o herói convencional, politicamente correto, íntegro, bom pai, bom conselheiro, atento a todos os da família, principalmente comigo, com a Suzana e a Sônia, pois ele sempre diz que pra ele somos como filhas. Eu o admiro ainda mais pelo que está fazendo pelo Dani, meu querido irmão, que eu tinha como um herói anti-convencional, um rebelde que eu não diria ser sem causa, pois ele não têve a atenção que merecia do nosso pai. Agora, ele me impressiona pela guinada que deu. Ele tá seguindo um programa de recuperação e tá se dando tão bem que tá até ajudando mais do que sendo ajudado. Estou com vontade de falar com ele. Com todos os problemas que ele têve, mesmo antes quando era viciado e sendo algumas vezes agressivo, nunca deixou de ser um bom irmão. O trecho acima tem tudo a ver e o abaixo, não se deixar dominar. Hoje, com o carinho que o Rick me fez, eu fiquei com vontade de fazer o que todas as garotas fazem até cedo demais. Tô confusa como nunca fiquei. Poderia falar com a minha mãe. Ela não seria contra, mas também não me diria pra fazer correndo. Meu pai, nem pensar. Só a cara com que ele me olhou quando me fez sentir quase desmascarada, como se ele pudesse ler os meus pensamentos. Não é por medo da reprovação do meu pai, mas eu sinto que não é o momento, mas tenho medo de não agüentar esperar.
Bom, té manhã,
Sandra.
Na manhã seguinte, Sandra encontra Suzana preparada para sair.
- Sú?! Que milagre é este?! Acordada a esta hora num domingo?
- É...pra você ver...
- Aonde você vai tão cedo? Você tá pronta pra sair, né?
- Tô, mas tô adiantada, vou pra igreja.
- É?!
- É. Tô esperando o Rodrigo. Você queria falar comigo?
- Bom...queria, mas antes queria saber como tá a Sônia.
- Ela não têve um sono tranqüilo. Eu fiquei juntinho dela na cama, ela me agarrou forte dormindo, falava: “Pai...mãe...não...” se encolhia toda.
- Tadinha...
- Eu a chamei pra ir comigo, mas ela não quis. Eu a achei meio febril. Tá lá quieta, não quer falar com ninguém.
- Pôxa...
- Sandra, eu tô sentindo que tem alguma coisa te incomodando. Você também não dormiu bem, tá tão cedo de pé.
- É, Sú, eu fiquei pensando muito.
- Em que?
- Sú, você gosta do Rodrigo, né?
- Nem preciso responder. – Suzana sorri.
- Ele é muito especial pra você?
- Mais outra pergunta que eu também não preciso responder. Aonde você quer chegar?
- Sú, eu perguntei sobre o Rodrigo pra chegar ao Rick. Você não enlouquece com um beijo do Rodrigo?
- Eu e o Rodrigo trocamos carinho, mas, de comum acordo, resolvemos nos dominar.
- Dominar? Como assim?
- Sandra, eu entendo o que você sente, porque qualquer garota sente. Desde a primeira vez que eu vi o Rodrigo, eu senti meu coração quase sair pela boca, cada uma ficou entusiasmada pelo que é agora seu par, lembra?
- É...
- Esses sentimentos são bons, mas Deus mostra pela palavra d’Ele, que o momento de viver a realização da sexualidade é no casamento. Você de nós sempre foi a mais ponderada, usa esta sua qualidade pra refletir. É tão bom conhecer a pessoa, gostar, ter companheirismo. Tanta gente nem se curte mais no dia da lua de mel, cada um vira pro lado e dorme, por que já não é mais novidade.
- Eu agora entendo por que dizem tanto que a carne é fraca, mas mesmo assim eu não acho preciso esperar o casamento pra se realizar com quem a gente gosta.
- É, mas o Espírito é forte e a gente tem que aprender a viver nele. Hoje sei o que sinto pelo Rodrigo. Mas antes, quando tava indecisa, quase me entreguei a quem não devia. Lembra do Bruno, né?
- Ele ia usar você.
- Eu quase cedi a um impulso, mas Deus teve misericórdia e me livrou. O Ricardo é legal, não vai te usar.
- Tenho medo que ele possa conhecer alguma outra garota mais experiente, dê ponto pra ela e aí eu danço.
- Não imagina coisas. Se ele gosta realmente de você, vai esperar. O Rodrigo tá chegando. – Suzana acena para ele - Quer ir com a gente?
- Não, eu vou ver o Dani.
- Manda beijos pra ele, ele tá sendo muito usado lá.
Suzana sai com Rodrigo e Sandra pensa sobre o que a prima disse.
Desesperado por ter sido descoberto, Sérgio procura um advogado seu amigo, para saber o que fazer:
- Ela foi com um detetive e deve ter fotos comprometedoras. Você não sabe o que ela viu antes de se manifestar.
- E agora?
- A única saída é você apelar, pedir perdão. Agora só falando com ela.Melhor você tentar enquanto dá. Não deve deixar passar muito tempo.
- E se eu a convidasse pra falar comigo fora de lá?
- É uma boa estratégia.
Sandra vai ver Daniel. Os dois abraçam-se demoradamente. Daniel, sempre um irmão carinhoso, acaricia os louros e cacheados cabelos da irmã, presos, puxados pra cima e pergunta:
- E aí, maninha?
- Dani...há tão pouco tempo você tava tão perdido. Agora tô aqui precisando da sua ajuda.
- Eu tava perdido, porque não havia encontrado Jesus. Tô aqui pra ouvir, mas Deus já sabe do que você precisa.
- Eu até duvidei da existência de Deus, mas vendo você assim, tão seguro, acredito que exista uma força superior.
- Esta força é muito mais superior do que você possa imaginar. O poder de Deus é infinito. Fala, o que há?
- Dani, eu já conversei com a Suzana hoje, porque ela sendo uma garota também sente coisas que eu sinto. Eu não quis falar com a mamãe, muito menos com o papai. Sei que o que vou falar não vai sair daqui. Como é quando você sente uma atração muito forte por uma garota? Você já têve experiências mais íntimas com mais de uma garota, né?
- É...infelizmente.
- Por que infelizmente? – Sandra espanta-se com a resposta do irmão.
- Por que agora que eu conheço Jesus, sei o que é amar verdadeiramente.
- Você quer dizer que nunca amou verdadeiramente uma garota?
- Não, quero dizer que descobri que amo uma e não dei à ela o devido valor.
- Como assim? Você tá falando daquela mesma garota que você me falou outro dia?
- Sim, ela mesma.
- Mas e aí, Dani? Deixa eu entender. Você disse que não deu à ela o devido valor, mas ela sumiu.
- Sim, mas eu não sei o que aconteceu pra ela sumir e não acho que seja por minha causa. Não dei à ela o devido valor, porque não fui fiel.
- Ah...então você tá com sentimento de culpa?
- Eu sentia culpa e achei que não merecia perdão, mas conheci um Deus que me perdoa e isto me aliviou. Continuo arrependido, mas com vontade de resgatar minha relação com ela, quero encontrar essa garota.
- Você vai encontrar, Dani.
- Tá difícil...Eu ligo pra lá e ninguém atende, o celular dela tá sempre fora de área.
- Você já pensou em ir lá?
- Eu nunca fui sem avisar, ela sempre me deu o “sinal verde” quando a mãe não tava em casa.
- Ih, Dani...ela deve estar escondendo a relação de vocês da mãe, isso não é legal.
- Eu até concordo com você, mas tenho que esperar. Se eu aparecer de repente, posso causar algum problema.
- E se alguém fosse lá, só pra sondar, pra saber se elas viajaram?
- Vou pensar. Mas, não vamos nos dispersar, estávamos falando de você.
- Dani, eu quis ouvir você, por que é homem e vê as coisas de outra forma. Eu sempre achei você um cara sensível Apesar de achar que você nunca pensou em compromisso sério. Seus olhos brilham quando cê fala na sua garota. Você nunca foi mal, só quis se meter a “bad boy”.
- Eu tinha medo de gostar verdadeiramente. Mas disto, a gente não foge. Você gostaria de ter um aval pra se entregar ao Ricardo, né?
- Ai...agora cê “foi na lata!”
- Se ele te ama, vai te respeitar e compreender. De minha parte, vou fazer duas coisas: dizer que não faça nada e orar por você. Deus fez o homem e a mulher pra se amarem, mas tudo tem o seu momento certo. Eu sei que não pareço a pessoa mais indicada pra dizer isto, mas o que fiz, não faço mais. Eu pra conseguir drogas vivia na promiscuidade, esquecia minha garota, me envolvia com muitas outras e me sentia vazio, mas depois voltava a agir errado. Agora é diferente. Mulher não é válvula de escape, diversão. Eu fui um irracional. Deus me fez racional e eu posso segurar os meus impulsos.
- A Suzana me disse que o casamento é o momento certo pra se entregar.
- Ela deve estar aprendendo a segurar a vontade. Ela e o Rodrigo se amam, mas se controlam, pois têm Jesus.
- Dani, agora vocês metem Deus em tudo!
- Claro, Ele tá em tudo.
- Dani! – um colega chama – Tá na hora do culto!
- Quer vir, maninha? Vem, só pra assistir.
A princípio Sandra assiste contrariada, mas emociona-se ao ouvir o louvor e quando o pastor prega a palavra, a frase: “O seu desejo será contra ti, mas cumpre a ti dominá-lo”; (Gênesis, 4:7), entra como que um raio em sua mente, como uma resposta às suas dúvidas. Ao decorrer do culto, mais louvores e lágrimas lhe caem dos olhos. Ela pensa ao ver o irmão tão feliz: “Pôxa...meu irmão é um milagre”. Ao final do culto, o pastor pergunta:
- Há alguém presente que gostaria de receber Jesus como seu único e suficiente salvador?
Num ímpeto, Sandra, levanta-se e grita com a voz embargada pelas lágrimas:
- Eu quero!
- Glória a Deus!!!!!! – Daniel grita de entusiasmo. – Palmas pra Jesus! – Daniel aplaude e todos o acompanham. Sandra vai à frente chorando e repete as palavras do pastor, aceitando Jesus como seu único e suficiente salvador.
- Maninha, tá havendo neste momento uma festa no céu! – Daniel abraça a irmã
- É Dani...eu só fico pensando nos nossos pais...eu gostaria que estivessem aqui.
- Deus tem o tempo dele, maninha.
Ao chegar em casa, Sandra vê Suzana e Rodrigo. Alguém tapa os olhos de Sandra que quando toca as mãos, diz:
- Rick! – vira-se para ele abraçando-o ternamente
- Oi, amor. Tenho uma novidade.
- Ai, deixa eu contar a minha primeiro.
- Ai...primeiro eu!
- Eu aceitei Jesus! – os dois falam juntos
- Pôxa!! – falam juntos novamente.
- Mais perfeito que isto, só se tivesse sido no mesmo lugar. – Rick observa
- Pois é Rick...mas Deus faz do jeito dele. – Rodrigo constata
- É...às vezes, a gente tem que estar um pouco separado, pra estar mais próximo de Jesus. A gente se encontra com Ele e depois tem um reencontro com quem a gente quer bem, né amor? – Suzana olha ternamente para Rodrigo.
- Com certeza! – Rodrigo concorda
- Mas, foi praticamente na mesma hora. – deduz Suzana.
- É! – Sandra e Ricardo falam novamente juntos, entreolhando-se com cumplicidade.
- Rodrigo me ouviu. – Ricardo conta - Eu confesso que não é fácil viver uma vida assim... Diferente, mas ele me fez pensar que existe mesmo uma briga interna, “um quero, não quero”, como se tivessem aqueles anjinhos e diabinhos dos desenhos, um dizendo: “Espera, agora não” e outro: “Vai, vai fundo!”
- É, eu também senti assim. – Sandra admite.
- Agora, somos mais juntos em Cristo! – festejam Rodrigo e Suzana.
- É, mas precisamos passar isto pra Sônia.- Sandra lembra-se
- O verdadeiro cristão, encara os desafios. – Rodrigo afirma.

quinta-feira, 15 de julho de 2010

CAPÍTULO XXIV

AS COISAS DE DEUS SÃO LOUCURAS PARA OS HOMENS
O carro fica praticamente inutilizado no lugar do motorista, porém, o lugar do lado fica intacto. Os caminhoneiros preocupam-se e descem do caminhão para prestar socorro.
- Cara...olha aqui. O motorista tá morto. - O motorista do caminhão constata
- Coitado...Tinha mais alguém no carro?
- Sei não.... vamos olhar melhor.
Os dois vão mais à frente.
- Olha lá: tá estirado no chão. - O motorista avista primeiro
- Tá morto?
- Ele têve sorte. Tá só desmaiado. Deve ter pulado fora antes de bater. - O motorista responde
Dois dias depois, Suzana que teve uma recuperação impressionante, recebe alta. Os Castelli aguardam comunicação dos seqüestradores. Soraya recebe um telefonema da polícia e fala primeiramente a Vitor, depois à filha:
- Suzana! Recebi um telefonema da polícia, dizendo que ligaram do DISK DENÚNCIA informando onde está seu pai. Falei com o Vitor e ele insistiu em ir até lá. Disse pra eu não ter medo, só confiança em Deus.
As TVs documentam a negociação travada entre Vitor juntamente e a polícia com os seqüestradores. O lugar fica cercado pela polícia, mas os bandidos oferecem resistência.
Patty que estava andando de bicicleta, entra em casa aflita:
- Mãe!
- Que foi, Patty?
- Mãe...meu pai tá onde tá o tio Genaro?
- Como é que você sabe?
- O Zeca contou, disse que viu na TV.
- Mas que menino linguarudo!
- Mãe, eu tô com medo.
- Filha, Nosso Deus nos manda não temer. Seus irmãos foram com ele. Vamos orar. Tudo vai dar certo.
O cativeiro onde está Genaro continua cercado de carros da polícia. O chefe da organização conseguiu sair ileso de helicóptero, enquanto seus capangas enfrentam a polícia. Os bandidos se negam a sair. A situação fica mais tensa.
- Cara, eu posso até ser preso, mas aquele Cássio vai também.
- Se alguém aqui vai ser preso, vai ser só você!
Vitor, percebendo que as ameaças e trocas de tiros entre polícia e bandidos não cessam, oferece:
- Eu entro lá.
- É muito arriscado. – o policial alerta.
- Mas eu não vou entrar sozinho.
- A gente entra com você, pai. – Miguel decide.
- Nenhum de vocês vai precisar entrar comigo. Eu tenho uma companhia que não precisa ser vista, só sentida.
Os policiais avisam para cessar fogo para que Vitor entre. Os bandidos concordam tendo em mente ter Vitor como mais um refém. No momento que Vitor se aproxima da casa, os seqüestradores ficam como que assombrados:
- Que é isso?! Que luz forte! Não tô vendo nada!
- Nem eu!
As vistas dos seqüestradores ficam ofuscadas pela luz que Vitor traz consigo. Ele entra e tira Genaro do local.
Os bandidos se rendem, mas vingam-se:
- Nós estamos sendo presos, mas o Cássio e o Daniel, sobrinho dele, são cúmplices!
De volta ao lar acompanhado por Vitor, Allan e Miguel, Genaro é esperado ansiosamente por Soraya e Suzana. Apesar de muito saudosa do marido, Soraya deseja compensar Suzana pelo sofrimento que atingiu sua saúde, deixando a filha correr até o pai ao vê-lo chegar, gritando:
- Pai! Pai! Pai! - Suzana corre repetindo a palavra até se jogar nos braços dele. Soraya de longe, olhando para o marido faz sinal com as mãos e Genaro lê seus lábios falando:
- Abraça. Abraça! – Soraya faz um gesto de abraço com as mãos
Genaro abraça a filha sem dizer nada, caindo num choro compulsivo. Os dois choram muito e não dizem nada, pois a emoção fala por eles, que vão abraçados até Soraya que agora abraça e beija muito Genaro, dizendo ternamente:
- Como eu te amo. Foi horrível ficar sem você, sem saber como estava. Não vou perguntar nada. Esqueça tudo. O que importa é que você está aqui.
Enquanto isso, Paulo recebe um telefonema:
- Alô?
- Dr. Paulo é o Alexandre. Eu encontrei o Daniel venha depressa. Ele se machucou um pouco num acidente de carro, mas tá bem.
Paulo anota os dados e vai até o hospital buscar o filho.Vê o filho amedrontado e sente compaixão:
- Filho...eu não fui bom pai, mas todos nós merecemos uma nova chance. Me perdoe, eu te amo.
- Pai... – Daniel chora como uma criança.
- Sua irmã vai ficar muito feliz em vê-lo, ela sofreu muito. Sua mãe tem aquele jeito autoritário, mas te ama. Volta comigo. Você precisa de ajuda, mas tem que querer.
- Eu quero, pai...
Os dois vão para casa.
No Solar, Allan e Miguel conversavam num canto próximo à escada na sala:
- Cara, será que é verdade? – Miguel indaga
- O quê?
- O que os bandidos disseram. Que o Daniel ajudou no seqüestro.
Os dois ouvem um barulho vindo da escada e se assustam, correndo até em cima:
- O que foi isso? – exclama Miguel
- Isso? Olha aqui: Quem. – Sônia mostra Suzana, que desmaiou ao ouvir o comentário quando descia a escada.
- Seus linguarudos! – Sônia repreende.
Miguel deita Suzana no sofá e Odete traz água. Suzana recobra os sentidos e bebe um pouco de água. Lembra-se do que ouviu e fica com uma expressão de ódio. Sandra chega na sala e não entende.
- Suzana, não fica assim. - Allan consola a prima
- Me deixa, gente! Me deixa! – Suzana vai até a porta e sai para fora. Miguel e Allan fazem menção de ir atrás e Sandra recomenda:
- Deixa, gente. Ela precisa esfriar. Não sei o que houve, mas ela quer ficar sozinha.
Os primos contam para Sandra o fato e ela não sabe o que pensar.
Suzana anda pelo jardim. Pouco depois o carro de Paulo entra com este trazendo Daniel que sai e espera o pai enquanto este vai guardá-lo na garagem. Suzana vê Daniel e num ímpeto de fúria vai até ele:
- Desgraçado! Eu te odeio! – Suzana soca Daniel que não entende nada, tenta defender-se, mas sente-se acuado, só conseguindo dizer:
- Suzana...eu...
- Você é um miserável! Drogado! Sujo! Imundo! – Suzana, cheia de ódio, cospe em Daniel.
Soraya assiste de longe sem entender e grita para Allan e Miguel que estavam perto:
- Segurem a fera!
Os dois a seguram e ela raivosa, grita:
- Me solta! Me solta! Eu mato este infeliz!
Levam-na depressa para dentro e Daniel fica ajoelhado chorando. Sandra vê o irmão e o abraça. Ele sente-se pequeno ajoelhado segurando na cintura da irmã que afaga seus cabelos, tentando dominar as lágrimas que também começam, a descer.
- Dani...não fica assim, maninho. Tudo vai passar.
- Eu não presto, não sirvo pra nada. Por quê não morri naquele desastre?
- Hein? Eu não soube... mas o que importa é que você tá vivo. Meu irmãozinho querido. Você vai ficar bem.
Allan e Miguel procuram acalmar Suzana dando-lhe água, mas ela chora compulsivamente, nervosamente. Soraya fica extremamente preocupada, pois teme que a filha tenha algum mal súbito novamente. Procura controlar-se para ajudar Suzana, chegando-se carinhosamente à ela:
- Filhinha...você tem que se dominar, meu bem. Esqueceu do que aconteceu com você?
- Mãe... – Suzana tenta falar, mas a voz é embargada pelas lágrimas.
- Querida, sobe com a mamãe lá pro seu quarto.
As duas sobem, Suzana se acalma e conta o que ouviu para a mãe e esta indaga:
- Você tem certeza, filha?
- Eles falaram que ele era suspeito.
- Vamos procurar saber. O importante é que seu pai tá aqui. Daniel tá doente.
- Aquele miserável!
- Não fala assim, filha. Você não chegou a este ponto, mas a bebida também é uma droga, só que é lícita. Não julgue seu primo.
- Eu não quero ficar aqui perto dele!
- Filha...
- Mãe, por favor deixa eu ficar uns dias na casa do tio Vitor? Deixa, mãe por favor!
- Eu vou falar com o seu tio Vitor e com o seu pai. Acho que nenhum dos dois vai se opor. Agora só o que eu quero é que você se acalme.
Lá fora, arrasado, Daniel continua ajoelhado abraçando a irmã que o consola:
- Maninho...não fica assim, reage!
Allan e Miguel vão até eles para ajudar:
- Daniel, a Suzana ouviu a gente comentar que estão acusando você de ser cúmplice do seqüestro do tio Genaro. – conta Allan
- Eu?!
- Se foi você, a gente entende, porque sabe como é que a droga cega as pessoas – Miguel analisa
- Mas eu não fiz nada!!
- Tá, mano. – Sandra o acalma – Se você tá tranqüilo com sua consciência, isto é o que importa.
- O meu pai trouxe o tio Genaro de volta. O pior já passou. - Allan conta.
- Ele foi muito corajoso. Nós fomos com ele e nem tivemos tanta coragem. – Miguel comenta.
Paulo assiste todos conversarem e sente que não deve interferir. Vitor aproxima-se e toca os ombros de Daniel que está de cabeça baixa, sem vê-lo. Logo ao ser tocado, fica trêmulo.
- Daniel, eu gostaria de ler pra você uma passagem bíblica, você aceita?
- A - aceito...
- Eu vou deixar vocês sozinhos. – Sandra prefere se retirar.
Vitor abre a Bíblia e lê:
- “Ele me disse: Daniel, homem muito amado, está atento à palavras que te vou dizer; levanta-te sobre os pés, porque eis que te sou enviado.” – Daniel vai se erguendo mesmo trêmulo e Vitor prossegue:
- “Ao falar ele comigo esta palavra, eu me pus em pé, tremendo. Então me disse: Não temas, Daniel, porque desde o primeiro dia em que aplicaste o coração a compreender e a humilhar-te perante o teu Deus, foram ouvidas as tuas palavras; e por causa das tuas palavras é que eu vim”. (Daniel, 10: 10 - 12).
- Tio Vitor....tio Vitor.... – Daniel chora compulsivamente e abraça Vitor. - Me perdoa...eu sempre zoei você! Mas eu tô vendo que o Seu Deus existe! Ele me ouviu e mandou você! O que você acabou de ler, tem tudo a ver com o que eu tava sentindo, com o que eu tava precisando ouvir, pra ter certeza de que Ele pode me transformar!
- Então você quer Este Deus?
- Se quero? Só quero!
- Então repita comigo: Senhor, eu Te aceito e a Teu Filho Jesus como meu único e suficiente salvador.
Daniel repete a oração de aceitação a Jesus e Vitor fala:
- Daniel, você agora tem uma vida diferente. Eu gostaria de lhe fazer um convite.
- Manda, tio!
- Você ficaria um tempo num centro de reabilitação da minha igreja? É que lá o pessoal fica para se recuperar e eu sinto que você será muito útil, porque La vai se fortalecer e ajudar muitas pessoas que ainda estão com dificuldade.
- Eu aceito, tio! Eu quero ajudar outras pessoas!
- Que bom! – Vitor exclama com satisfação.
De longe Paulo assistia sem saber o que dizer. Vai até o filho que quando o vê joga-se em seus braços.
- Pai!
- Que foi, filho?
- Pai, lembra que você disse no hospital que eu tinha que querer ajuda?
- Sim.
- Tio Vitor me ofereceu uma ajuda: Jesus e eu O aceitei.
- Não! Mais um crente na família!
- Não pai, mais um sobrevivente! Agora eu tenho certeza que a minha vida vai ter um sentido porque eu vou ajudar outras pessoas a se livrarem da droga, porque ela é uma droga. Sou careta, mas sou feliz!
- Você não só sobreviveu, Daniel, mas nasceu de novo. – Vitor acrescenta
- Cadê a minha mãe? – Daniel indaga ao pai
- Estou aqui. – Heloísa chega sem ter sido vista, abre os braços e Daniel a abraça.
- Mãe, me perdoa.
- Eu é que peço que você me perdoe. Eu pensei que estava controlando a situação quando te internei. Devia ter conversado mais com você.
- Mãe, o tio Vitor vai me levar pruma casa de reabilitação. Eu vou pra lá pra ajudar outras pessoas. Eu aceitei Jesus como meu único salvador.
- Se você fez esta escolha e está feliz, meu filho, não vou discutir. Só não deixa o fanatismo tomar conta de você.
- A mãe...eu quero ser fanático!
- O que importa é que você quer se cuidar por sua própria escolha.
- Eu vou conseguir, mãe! Com Jesus agora eu vou.
- Vitor! - Soraya chama o cunhado que vai até ela.
- Oi. Como está o Genaro?
- Ele tá descansando.
- E a Suzana?
- É isso que eu quero falar com você, meu cunhado. Ela pediu se podia ficar uns dias na sua casa. Eu vou falar com o Genaro, acho que ele deve deixar. Por você tudo bem?
- Você sabe que nem precisa me perguntar isto.
- Ela não quer ficar perto do Daniel. Você deve saber que o estão acusando de suspeito do seqüestro.
- Ouvi comentários. Mas não há provas concretas. Ele se meteu com gente perigosa. Eles podem ter inventado isso, usando o nome dele para se vingar.
- Não sei, Vitor. Mas esse pessoal usuário de drogas comete crimes piores. Até matam pais, avós.
- Graças a Deus ele não fez isto. Mas, antes que eu me esqueça, o Daniel não vai ficar aqui. Ele vai para uma casa de reabilitação.
- Será que ele vai poder ir?
- Mesmo que ele tenha que responder a algum processo, não podem impedi-lo de se tratar.
- Isso é. Mas eu até acho melhor que a Suzana fique um pouco com você, porque o ambiente vai ficar difícil pra ela e pra Sandra. Você sabe o quanto ela e o irmão são ligados e o gênio que a Suzana tem. Ela sabe ser justa quando quer, mas quando fica com raiva de alguém, ela fica cega e tá com um ódio tremendo do Daniel. Eu quero poupar minha filha e poupar a Sandra também. Um tempo longe, dá pra refletir melhor.
- Vamos fazer o seguinte: você fala com o Genaro, eu falo com o Paulo e a Lolô pra combinar tudo e levo o Daniel. À noite eu volto e levo a Suzana.
- Eu ligo pro seu celular.
- Pode ligar, logo que eu estiver liberado venho buscá-la
Enquanto esperava para acertar os detalhes com Vitor, Soraya vai até Genaro que estava descansando e o encontra acordado, com o olhar parado. Aproxima-se carinhosamente a ele, sentando-se na beira da cama.
- Meu querido. Que bom que você está aqui comigo.
- Eu...eu...nunca pensei que isso pudesse acontecer comigo. – Genaro segura um pouco o choro, sentindo-se como um menino indefeso. Soraya o abraça.
- Genaro, não pensa no que passou. Você tá aqui, é isso que importa.
- Eu sei...sofri muito pensando como você poderia estar.
- Eu sofri muito, mas meu amor por você aumentou, porque eu nunca me imaginei sem você. Embora tenha sido terrível esta experiência, podemos tirar um saldo positivo.
- A Suzana também sofreu muito, né?
Soraya levanta-se com receio de contar ao marido o que houve com a filha e durante alguns segundos não o encara.
- Você tá me escondendo alguma coisa?
- Eu... – Soraya senta-se ao lado dele novamente.
- Querido, agora que já passou, eu vou falar: ela esteve internada, passou muito mal, esteve até no hospital.
- Como?!
- Calma. Já passou. Ela chegou a ficar em coma, mas no dia que o Rodrigo foi lá, ela saiu do coma e têve uma melhora que surpreendeu os médicos. Não se sabe exatamente o que ela têve. Foi algo pior do que um colápso. Viu como sua filha te ama?
- É verdade...
- Ela tá muito tensa, pediu pra eu falar com você se ela poderia ficar alguns dias na casa do Vitor.
- Pode, claro. Sendo pro bem dela, não tem como eu me opor.
- Ela vai e quando voltar vai estar bem melhor.
- E a mamãe? Até me esqueci de perguntar dela. Ela soube? Como é que ela está?
- Fica calmo. O seu tio Ciro e a Mary ficaram com ela. Tentaram esconder, mas ela percebeu pelo jeito deles que havia alguma coisa errada e acabou sabendo pelo noticiário da TV. Ela ligou pra cá, não falaram da Suzana, só disseram que eu não estava em casa. Disse que logo que pudesse veria você, que te ama muito e que sabia que Deus ia ouvir as orações dela.
- Amanhã eu vou vê-la.
- Nós vamos. O Alfredo leva.
- Coitado do Alfredo. Tão bom sujeito.
- Ele sofreu muito também.
Vitor volta para pegar Suzana e ela mostra-se apática na casa do tio. No dia seguinte, sábado, Rodrigo vai vê-la.
- Oi Suzana.
- Oi...
- Que há contigo?
- Comigo? Nada...
- Suzana, você não para pra pensar que tá aqui, tá com saúde, seu pai tá em casa. Isto não é motivo pra ficar feliz?
- É, né...
- Suzana, eu juro que não te entendo.
- Não precisa entender mesmo. – Suzana dá de ombros como quem não se importa.
Rodrigo fala com Vitor antes de ir embora.
- Tio Vitor, a Suzana tá outra vez estranha.
- Como assim, outra vez?
- Como quando ela tava indecisa em relação a mim...
- Rodrigo, ela passou por um trauma grande. O pai foi seqüestrado, ela quase morreu e não sei se você sabe, mas ela têve um grande desgaste ontem, porque soube de uma coisa que a abalou muito.
- Que foi?
- Fica entre nós. Foi armação, mas Daniel tá sendo acusado de cúmplice do seqüestro do Genaro.
- O quê?! O Daniel, irmão da Sandra?
- É. Eu o levei para um centro de reabilitação, onde ele tá sendo cuidado e será útil, pois eles trocam experiências.
- Tio Vitor, o senhor segue aquilo que o senhor prega. Eu pude comprovar no hospital. Eu disse que se Este Deus existisse mesmo Ele teria que curar a Suzana.
- Ele provou isto pra você. Que está esperando pra aceitá-Lo como seu único salvador?
- Como assim?
- Rodrigo, Ele provou o Seu poder. Agora declare que Ele é o Senhor da sua vida. Repete comigo uma oração?
- Bem...tá...
- Primeiramente, eu vou orar por você, depois você repete comigo, tá?
- Tá...
- Senhor, aqui está o Rodrigo. Ele teve uma prova do Teu poder, pois, Tu, maravilhoso Deus, o atendeste quando clamou pela vida da Suzana. Pai querido, eu entrego esta vida agora nas Tuas mãos em nome de Jesus, amém. Amém?
- Amém...
- Quer repetir a oração de aceitação a Jesus, comigo?
- Eu...eu...eu quero!
- Então repita: Senhor Deus...
- Senhor Deus....
Rodrigo repete tudo, a princípio se perguntando por que precisa fazer isto, mas ao fim da oração, comenta:
- É...foi bom. Tô me sentindo mais leve.
- Rodrigo, agora, mesmo que tudo ainda pareça muito difícil, você vai ter mais forças pra ir em frente, por que Jesus vai guiar o seu caminho.
- É isso aí, tio Vitor. Tchau, eu volto amanhã.
- Volta mesmo, querido.
Naquela noite, Suzana mal toca na comida e fica calada. Depois do jantar sobe com Patty para o quarto.
- Vitor, a Suzana tá com um mau humor. – Helena comenta
- Tá muito oprimida. Vamos orar por ela mais do que já estamos orando.
- Com certeza. O Daniel tá gostando da casa de reabilitação?
- Como eu pensei, ele tá mais ajudando do que sendo ajudado.
- Que bom!
Naquela madrugada, Vitor e Helena oram. Enquanto isto, Suzana se debate na cama ao lado da de Patty, que acorda com a agitação da prima, que fala dormindo sem parar:
- Não...sai...me deixa...sai....
De repente, Suzana, completamente fora de si, senta-se na cama e fala alto com uma voz gutural:
- ELA É MINHA! ELA É MINHA!
- Pai! Mãe! – Patty sai correndo do quarto apavorada, chama os pais que entram com ela no quarto. As pupilas dos olhos de Suzana somem, ela fica totalmente tomada.
- SAI DAQUI, EU QUERO ESTA GAROTA! ELA É MINHA! ELA VAI MORRER! EU QUIS ACABAR COM ELA, VOCÊS....EU ODEIO VOCÊS! - Suzana, completamente possuída, fala bufando de raiva.
- Chega! Você vai sair dela agora pra nunca mais voltar, em nome de Jesus! – Vitor coloca a mão firmemente na cabeça de Suzana, que ainda tomada por aquele espírito maligno grita:
- NÃÃÃÃÃÃÃÃO!!!!!
Suzana cai ao chão parecendo desmaiada. Pouco depois, Suzana abre os olhos e chora, ofegante, sem conseguir entender o que houve. Vitor a ajuda a se levantar, pede que Patty traga água e acalma a sobrinha.
- Tio....Que aconteceu?
- Calma, filhinha. Beba água.
- Ai...minha cabeça tá doendo. – Suzana leva a mão à cabeça .
- Você bateu com a cabeça, mas tá tudo bem, não houve nada de sério.
- Eu...eu não me lembro de nada. Será que tô ficando louca?
- Vem cá comigo, querida, senta.
Suzana continua assustada, mas ouve Vitor com atenção.
- Suzana, você lembra da Sandra ter dito que você dormindo ficava muito inquieta, sua voz mudava...lembra?
- Eu...tô lembrando.
- Pois é, meu bem. Eu tenho que dizer a verdade: você estava possuída por um espírito maligno.
- Hein?! Como?!
- Você estava dominada por este espírito.
- Não, cê tá brincando!
- Suzana, alguma vez eu menti pra você? Você acha que eu seria capaz de inventar uma coisa dessas, por mais absurda que possa parecer?
- Eu...acho que não.
- Muitos não acreditam, mas o diabo existe. Alguns acreditam e acham que terão privilégios no inferno. Quando Jesus sofreu na cruz, levou sobre si todas as dores que a humanidade merecia. Deus tem um amor infinito, por que Ele é poder, misericórdia, perdão. O inimigo procurou tocar nas suas maiores feridas. Eu orei muito, jejuei com sua tia, seus primos, porque nós sabíamos que você conheceria Este maravilhoso Deus. Seu pai foi seqüestrado, mas Deus operou pra trazê-lo de volta, porque ele também estava debaixo de nossas orações. O diabo pensou que conseguiria destruí-los, mas tudo se fez novo e pode ser melhor ainda, se você tomar agora uma decisão que o Daniel e o Rodrigo tomaram.
- Qual?
- Aceitar Jesus como seu único salvador.
- Não sei se tô preparada.
- Depois de saber o que aconteceu com você, ainda acha que não está preparada?
- Tio, não sei se vou conseguir. Eu fiquei com tanto ódio do Daniel.
- Daniel disse que um destes “amigos” – se é que podemos falar assim – o sondou pra ter informações sobre Genaro e deu idéias de fazer algo pra conseguir tirar dinheiro dele. Ele chegou a ficar tentado, mas têve medo de ser descoberto. A idéia foi realmente do outro. Ele pode usar isto contra o Daniel, mas não tem provas. Perdoe seu primo.
- Tio...
- Se você declarar que Jesus é o seu salvador vai dar autoridade a Ele sobre sua vida. Você quer isto?
- Eu...eu quero!
- Então repita esta oração: Senhor Deus, eu creio em Ti como criador dos céus e da terra e que tu proveste para a humanidade a salvação através de Teu Filho Jesus. Perdoa meus pecados, escreve meu nome no livro da vida eu aceito Teu Filho Jesus como meu único e suficiente salvador. Eu Te agradeço em nome de Jesus, amém.
Suzana repete a oração intercalada por lágrimas e soluços e o tio a abraça:
- Seja bem vinda ao reino de Deus!
- Eu...tô me sentindo aliviada.
- Claro que está! O reino de Deus nos traz o refrigério! Você quer ter uma Palavra de confirmação?
- Como assim?
- Lembra do diário que a vovó deu pra vocês? Pega e lê o dia de hoje!
Suzana abre o diário e lê as passagens: “Dar-vos-ei coração novo e porei dentro de vós espírito novo; tirarei de vós o coração de pedra e vos darei coração de carne” (Ezequiel, 36: 26); “Quando vier, porém, o Espírito da verdade, ele vos guiará a toda a verdade; porque não falará por si mesmo, mas dirá tudo o que tiver ouvido e vos anunciará as coisas que hão de vir.” (João 16: 13).
Rio, 07 de julho de 2002
Meu querido diário
A princípio fiquei sem entender o que eu fiz ainda agora. Depois que li as mensagens do dia de hoje, sei que este Espírito da verdade me levou a aceitar Jesus como meu único salvador. Nada é por acaso e não foi por acaso que eu vim mais uma vez pra perto do tio Vitor. Deus cuidou de mim e usou o tio Vitor! Agora eu entendo que não é por minha vontade que tomei esta decisão. Eu ouvi a voz deste Espírito da verdade, a voz de Deus. Entendo agora tudo o que fiz de errado, me arrependo e agradeço a Este Deus que me livrou de ter feito coisas piores. Estou preparada pra perdoar o Daniel, em nome de Jesus! Amém!
Até muito breve,
Suzana.
À tarde, Vitor vai visitar Daniel na casa de reabilitação:
- Oi Daniel.
- Oi, tio! Que bom ver você aqui! – Daniel o abraça.
- Você se adaptou logo, hein?
- No pouco tempo que tô aqui, já orei três vezes a cada dia.
- Daniel, personagem bíblico, orava três vezes ao dia.
- É? Já orei duas vezes hoje.
- O que você tem colocado pra Deus?
- Tenho agradecido muito por Ele ter me tirado da lama que eu tava, inclusive por eu não ter feito coisas piores.
- Tem pedido também, né?
- Tenho. Eu tô bem, só faltam duas coisas essenciais.
- O que?
- Preciso encontrar minha namorada. Acho que tá morando no mesmo lugar, mas das últimas vezes que liguei pra ela, o telefone tava ocupado sempre, o celular na caixa postal.
- Você quer que eu vá à casa dela?
- Agora não tio, obrigado. Pode dar problemas pra ela alguém aparecer assim de repente, sem avisar.
- Entendo. Mas, qual é a outra coisa essencial?
- Que a Suzana me perdoe. Ela tem razões pra desconfiar de mim, mas eu não fiz nada.
- Pode crer Daniel. Eu inclusive acho que tem alguma coisa por trás da denúncia pelo telefone. Algum rival.
- Isto é assim mesmo, ganha o maior do pedaço.
- Você está bem mais consciente, o Espírito Santo de Deus está trabalhando poderosamente em você.
- E em mim também. – a voz é de Suzana que vem através de um sinal de Vitor. Daniel fica mudo de surprêsa.
- Daniel...eu...fiquei com muita raiva de você. Quando pensei que você poderia ter tramado o sequestro do meu pai, eu fiquei cega de ódio. Mas O Espírito Santo me tocou e.... – Suzana fica quase sem voz, querendo chorar – Ai...eu tenho que conseguir acabar de falar .... eu te perdôo em nome de Jesus!
Daniel chora sorrindo e Suzana também chorando mais ainda, fala:
- Daniel, não fica aí me olhando e chorando, me dá um abraço, cara!
Os dois choram abraçados e as pessoas em redor aplaudem gritando:
- Glória a Deus!
Ainda naquele dia, Sandra vai visitar o irmão, junto com os pais. Os dois ficam um bom tempo conversando.
- Sandra, cumé que tá tudo em casa?
- Eu diria que um pouco melhor do que tava.
- Como assim?
- O papai e a mamãe não estão se agredindo tanto quanto antes e o fato de você ter aparecido mudou muita coisa.
- Bom ouvir isto. Jesus faz a diferença.
- Você resolveu seguir a mesma religião do tio Vitor?
- Não, maninha, eu aceitei Jesus como meu único salvador.
- Então. O mestre da religião do tio Vitor é Jesus.
- Não, maninha, Jesus é o mestre dos mestres.
- Você tá muito empolgado. De qualquer maneira, não posso negar que você tá bem diferente, muito melhor.
- Exatamente, porque Jesus renovou o meu viver. Eu renasci em Jesus Cristo, sou uma nova pessoa.
- É...isto deve fazer sentido pra você.
- Pode fazer pra você também.
- Pra mim?! Como assim?
- Maninha, você não tá satisfeita com muita coisa na nossa família, ou eu tô errado?
- Bem...não, mas eu já me sinto bem melhor vendo você livre da droga. Acho que isto é nascer de novo.
- Este “nascer de novo”, pra mim tem um sentido mais amplo, que pode vir a ter pra você também.
- Eu não entendo por que você tá insistindo nisto. Eu não preciso mudar nada. Eu não fiz nenhuma besteira.
- Tudo bem, a decisão tem que ser sua e eu vou orar por você.
Suzana encontra Sandra no carro para voltarem juntas ao Solar.
- Sandra, eu tava com tanta saudade. – Suzana abraça a prima pouco antes de entrarem no carro.
- Acho que temos muita coisa pra conversar.
As duas se acomodam no carro enquanto esperam os pais de Sandra que se abre com Suzana:
- Tô preocupada com o Dani.
- Por quê? Ele tá ótimo!
- Aparentemente sim, mas tá estranho. Não sei se é o ambiente.
- Não é só o ambiente, Sandra, é Jesus.
- Ah! Só faltava essa agora! Você também?
- Sandra, você não achou alguma coisa diferente em mim?
- Eu tô achando você bem, mas você sempre têve momentos mais alegres, de maior expansão.
- É, mas agora eu tô na expansão infinita do Senhor Jesus!
- Então quer dizer que agora todos os problemas acabaram?
- Não, mas eu vou ter confiança no meu Deus pra resolver todos eles.
- No “seu Deus?”
- Que pode ser seu também, basta você querer.
- Sú, Deus é propriedade das pessoas?
- Nós é que somos d’Ele. Ele escolhe a gente. Ele tem um plano pra mim, pro Daniel, pra toda a família!
Sandra tem o mesma sensação de dúvida que têve em relação ao irmão ao ver a euforia de Suzana.
Passam-se alguns dias. Genaro contrata mais seguranças para acompanhá-lo ao trabalho, não permitindo que ninguém saia do Solar sem escolta. Dá mais atenção à família, diminui o ritmo de trabalho com a ajuda dos irmãos.
Correspondências chegam endereçadas às três mansões do Solar. Uma em particular intriga o seu destinatário, que liga para uma das cunhadas:
- Helô, por favor, vem aqui agora!
- Que houve Lúcia?
- Vem aqui, quando você chegar eu explico.

sexta-feira, 2 de julho de 2010

CAPÍTULO XXIII

UM PLANO QUASE PERFEITO
O policial continua observando todo o movimento do Solar fingindo fazer a ronda revezando com um cúmplice e manda comparsas atrás de Genaro, para pesquisar o momento apropriado para executar o plano. Ao ouvir uma conversa casualmente, fica atento:
- E aí Alfredo, vai ouvir a Suzana cantar? – pergunta Viriato
- Cara, hoje é o grande dia!
- Parece até que é sua filha.
- É como se fosse.
- Dr. Genaro vai?
- Vai. Os pais do Rodrigo vão estar lá.
Viriato faz uma expressão de quem entende a causa da ida de Genaro.
O policial pega o rádio e avisa:
- Vai ser hoje. Uma grande oportunidade.
Suzana e as primas ansiosas contam as horas para o evento. Todos dirigem-se ao início da tarde para o colégio Rigel. Genaro, por insistência de Soraya e por sua própria conveniência comparece para conhecer o pai de Rodrigo, mais um bom contato para negócios. Paulo e Sérgio também vão para prestigiar os respectivos filhos. Embora a gincana se dê na véspera da final da Copa do Mundo, conta ponto para todas as matérias.
Lá fora, a quadrilha combina o esquema:
- Então vai ser daquela distância, ninguém vai ouvir nada.
- Você testou estas armas? É laser mesmo?
- Cê acha que tá lidando com um amador?
- Se não der certo vamos ter que esperar por outra oportunidade, porque dentro do Solar não dá.
- É...mas hoje deve dar certo.
- Qualquer alteração, o Waldir tá encarregado de avisar. O esquema tá perfeito. A gente pensou em tudo.
No colégio, Luciana em conchavo com outra menina, planeja que Suzana se saia mal na apresentação:
- Tá aqui, botei neste copo. –Luciana avisa
- Será que ela bebe? – pergunta a outra
- Ela vai tomar de um gole só! – Luciana afirma
Suzana apresenta-se com sucesso na coreografia com Sandra, Sônia e outras duas meninas. A platéia delira nos aplausos. Pouco antes da apresentação de canto, a menina que estava em combinação com Luciana, a chama:
- Suzana, não tá com sede? Bebe um gole antes de cantar.
- Ah, ‘brigada.
Suzana sente o cheiro do conteúdo e fica paralisada. A menina está certa de que ela não resistirá. Suzana começa a ter as mesmas sensações de ansiedade, sentindo calafrios à altura da nuca. Quando vai beber, lembra das palavras de Vitor: “Evite o primeiro gole”. Tira o copo de perto da boca e olha fixa e seguramente para a garota, dizendo:
- Eu tô muito feliz, por isto, vou devolver este copo sem dizer nada. Senão com certeza, eu atirava o que tá dentro na tua cara! Toma, perua! – Suzana joga na mão da menina que fica perplexa e dá-lhe as costas saindo vitoriosa.
Suzana impacta a todos nos bastidores devido a sua reação, dirige-se para o palco, canta e é ovacionada.
- Parabéns Genaro! – César cumprimenta
- Obrigado.
- Vitor, como a Suzana tá segura! – Helena comenta com satisfação
- Isto é só o começo. – Vitor afirma
Suzana recebe flores, agradece ao colégio e aos participantes de sua equipe, professores e a todos os presentes de sua família e amigos. Nos bastidores, Luciana morre de inveja.
A equipe de Suzana é premiada e ela em particular pela coreografia e pela interpretação. Todos tiram fotos juntos. Após algumas horas, quando muitas pessoas já haviam ido embora, os Castelli e os familiares de Rodrigo conversam despreocupadamente lá fora. De repente, Genaro indo em direção ao carro, observa espantado:
- Que é isso?! Os quatro pneus arriados?! Como é que pode?! Este colégio não tem seguranças?
- Claro que tem, Genaro. – Soraya lembra
- Então como é que não viram nada? Vou apurar isto.
- Genaro, não arruma confusão. – Soraya argumenta
- Ele tem razão. – César opina – Os seguranças devem prestar atenção nestas coisas.
- Mas gente, não vai adiantar, já fizeram a maldade. – Eneida tenta apaziguar
- Mas é realmente muito estranho. – Paulo observa
- Vamos fazer o seguinte: - Vitor tem uma idéia - já está tarde e não é conveniente que fiquemos aqui. Estou com meu carro, o Paulo com o dele, o Sérgio também. Nós dividimos o pessoal nos carros e depois se pensa no resto.
- Eu vou ficar aqui. – Genaro decide
- Eu ajudo o senhor Dr. Genaro – Alfredo oferece
- Eu vou procurar apurar o que houve e você procura ajuda. Aqui perto tem um posto.
Como todos tem muito espaço nos seus carros, não é preciso fazer muitas divisões de carona. Paulo leva Ricardo e Sérgio leva Renato. César e Eneida insistem em levar Soraya e Suzana, para que a última vá com Rodrigo.
Genaro procura saber sobre o ocorrido, mas os seguranças afirmam não ter reparado nada. Viram os quatro pneus furados, mas não ouviram nenhum ruído e embora estranhado, tiveram a impressão de ter sido naturalmente. Furioso, Genaro aguarda Alfredo que se dirige para o posto. Antes que este volte com ajuda, recebe uma coronhada e cai desacordado, tendo seu celular roubado para dificultar a comunicação. Devido a demora de Alfredo, Genaro o procura, afastando-se um pouco das proximidades do colégio. Os bandidos encapuzados agarram Genaro que nem tem tempo de gritar, encapuzando-o e jogando-lhe dentro do carro, advertindo:
- Cala a boca, senão leva chumbo!
Em casa, Soraya a princípio não se preocupa, pois sabe que por ser sábado e pelo horário avançado haveria dificuldade para resolver o problema. Porém, ao passar de meia-noite, liga para o celular de Genaro e ouve a gravação de caixa postal. Liga para o de Alfredo e o resultado é o mesmo. Fica mais apreensiva e liga para Heloísa. Lúcia de sua casa vê Heloísa indo para a de Soraya e pergunta o que houve. Assustada, a acompanha.
- Que bom que vocês estão me fazendo companhia. Tô ficando muito preocupada. Será que...
Ao toque do telefone já mais de uma hora da manhã, Soraya nem termina a frase e corre para atender:
- Alô?
- Dona Soraya?
- Sim.
- A senhora é esposa do Dr. Genaro Castelli?
- Sim, sou eu mesma. Aconteceu alguma coisa?
- O seu marido está conosco.
- Como? Quem está falando?
- Dona Soraya, não avise à polícia. Aguarde outro telefonema para saber local onde deixar o resgate.
- O quê?!
- Se a senhora colaborar não acontecerá nada com seu marido.
- Alô?! Alô?! Desligaram!
- O que foi, Soraya? – Lúcia pergunta apavorada
- Seqüestraram o Genaro!
Suzana aparece na sala.
- Mãe...
- Minha filha...
- Eu ouvi tudo.
- Filha...
- Mãe... – Suzana se desespera – A culpa foi minha!
- Que é isso, minha filha! Você não tem culpa de nada!
- Mãe, ele foi assistir a apresentação no colégio. Ele bem que não queria ir! Eu...ai! Eu tô passando mal... – Suzana leva a mão ao coração e sente muita falta de ar. Heloísa a socorre pondo em prática seus conhecimentos de enfermagem, apressando-se em recomendar:
- Lúcia, chama uma ambulância! Rápido!
O estado de Suzana impressiona, seus olhos reviram, sumindo as pupilas e ela fala com uma voz gutural:
- Ela vai ser minha... – Suzana desmaia.
Na casa de Vitor, o telefone toca e Helena que estava orando com este, apressa-se em atender:
- Alô?
- Tia Helena...
- Sandra? – Helena assusta-se ao ouvir a voz chorosa da sobrinha – Que foi?
- Tio Genaro foi seqüestrado!
- Como?!
- A Suzana têve um colapso! Tá em coma no hospital! Foi horrível! Até choque deram nela!
- Mas ela reagiu, né, Sandra?
- Ela parecia que ia voar, mas agora tá lá em coma, toda entubada.
- Sandra, vamos ter fé, não se desespera. Eu creio no poder de Deus e nós vamos clamar a Ele. Genaro vai ser encontrado e Suzana vai sair do coma, em nome de Jesus!
Helena comunica o fato a Vitor, que, embora baqueado, ora por Genaro e Suzana. Na sala da casa, olha com ternura para o mural de fotos dos familiares e das sobrinhas também destacados, entre estes um com as três juntas com as mãos unidas para cima, com uma tira de papel embaixo, escrita a dedicatória: “Para o tio Vitor, das suas três mosqueteiras”; uma foto maior de Suzana franzindo os lábios, com os dizeres: “Um beijo especial para o meu mais especial padrinho”.
Embora os Castelli procurassem abafar o fato, alguns repórteres de plantão conseguem apurar a ocorrência, que durante o dia chega às emissoras de rádio e TV. Vitor, ainda cedo, liga para seu tio Ciro para pedir que fique com sua mãe já que a notícia poderia chegar à ela. Ciro informa que esta ainda não sabia.
Na empresa Mega Mídia, Edú chega para trabalhar e Márcia indaga:
- Já soube da última?
- Sobre?
- Você não ouviu o rádio?
- Não.
- Nem ligou a TV?
- Não. Fala logo!
- Genaro Castelli foi seqüestrado.
- Quê?! Como?!
- Os detalhes ninguém sabe. Eu liguei pro Vitor e ele nem sabe como isso vazou. Foi logo depois de uma festa no colégio da filha dele. Os pneus do carro tavam furados, os outros foram pra casa e ele ficou com o motorista pra dar um jeito no carro. O motorista levou uma coronhada quando tava procurando ajuda e levaram o Dr. Genaro. O motorista conseguiu ligar mais tarde da rua e o outro irmão do Dr. Genaro, o Dr. Sérgio foi buscá-lo.
- Pôxa...E a filha dele? Ela tá sofrendo muito, né?
- A reação dela foi pior do que se pudesse imaginar. Ela tá em coma no CTI.
- Quê?!
- É Edú. O dinheiro não compra a vida de ninguém. Só Jesus nesta causa. Em nome de Jesus eu afirmo: o Dr. Genaro vai ser encontrado e a filha dele vai sobreviver.
Rodrigo que ainda dormia extasiado com o evento da noite anterior, nem imaginava o que estaria acontecendo. Ao despertar ouve o rádio que naquele exato momento dá a notícia. Rodrigo pula da cama aterrorizado ao ouvir que sua amada está em coma. Desce e encontra a mãe que levantou-se pouco antes dele e está na sala, sem saber do ocorrido.
- Mãe...
- Que foi filho?! Que cara é esta?! Você tá trêmulo!
- Mãe...o Dr. Genaro...a Suzana...
Rodrigo fica com a voz embargada pelas lágrimas sem conseguir falar. A mãe o abraça, dá-lhe um pouco de água e ele conta tudo.
- Meu Deus! Meu filho...aquela menina....não acredito....
Um flashback passa na mente de Rodrigo. A figura de Suzana não sai de sua cabeça. O jeito alegre e comunicativo da menina no dia em que se conheceram, sua graça no desfile, a bebedeira no Reveillon, a valsa que dançou com ela no seu “debut”, a visita surprêsa em Angra e o beijo que roubou dela e que foi o primeiro dos dois, os outros que trocaram no dia do aniversário dele, a dança alternada entre agitada e romântica na sua danceteria particular, o medo da barata de borracha, o pranto sentido no desabafo no recente retiro, a serenata de declaração de amor, o tombo cômico de Suzana ao ensaiar a coreografia assistida por ele e a sua noite de brilho na gincana.
No hospital, Soraya chorosa assiste à filha no CTI, falando com ela carinhosamente:
- Minha filha, eu te amo tanto. Desde o momento em que soube que você estava dentro de mim.
- Soraya, vem cá. - Heloísa aproxima-se sem entrar, chamando Soraya num tom bem baixo de voz
As duas vão para o corredor.
- O que o médico disse Soraya?
- Ele disse que o quadro dela é estável, mas requer cuidados. Ainda está tentando entender o que houve.
- Foi muito estranho. Nem com a experiência que tenho em enfermagem, nunca vi coisa igual. Nem parecia ela. Eu pensei que fosse um acesso de loucura, sei lá.
- Se o médico não sabe precisar o que há com ela, imagine você. Eu então entendo menos ainda.
- Pareceu alguma coisa pior que um colapso.
- Só espero que ela reaja.
- Ela vai reagir. Suzana é forte, Soraya. Eu sinto que ela tem uma força que ela mesma não identificou ainda.
- Haja o que houver, eu vou estar sempre ao lado dela. Eu vou cuidar dela. Ainda vou vê-la abrir os olhos.
- Vai sim. – Heloísa abraça Soraya confortando-a.
Enquanto o país vive a expectativa da final da Copa do Mundo de 2002 na partida do Brasil X Alemanha, a família Castelli só pensa encontrar Genaro e que Suzana saia do coma. Vitor está alerta e num momento que vai para fora de casa, vê um carro chegando e reconhece o motorista que faz serviços para Marisa, seu Ademar, trazendo Angelina, que sai apressada do carro, indo de encontro ao primo abraçando-o.
- Vitor, primo. Eu estou sabendo de tudo.
- Eu imaginei.
- Tentei ligar pra você, meu telefone deu defeito. Nem pelo celular consegui. Passei pela casa do Ciro e da Mary e me disseram que eles estavam com a tia Marisa. Então, eu fiquei mais descansada por ela, mas não dava pra esperar por notícias em casa. Passei pela casa do seu Ademar e felizmente ele estava. Se prontificou logo a me trazer.
- Dane-se a Copa! – grita seu Ademar saindo do carro – Vitor, que coisa, hein?
- Primo, eu não consigo acreditar! Genaro seqüestrado, Suzana em coma?
- Angelina, - Vitor coloca as mãos nos ombros da prima e fala olhando bem dentro dos seus olhos – temos que ser fortes e crer muito mais no nosso Deus. Estou sofrendo tanto quanto se fosse com algum dos meus filhos.
- Eu avalio. Aquelas meninas são muito importantes pra você.
A notícia continua se espalhando e chega ao conhecimento de Carolina, a menina que saiu do Colégio por causa da briga com Suzana.
- Mãe, cê ouviu a notícia?
- Não, que foi?
- A Suzana, aquela menina com quem eu briguei, até rolei no chão na escola, tá no CTI.
- É? Mas como?
- O pai dela foi seqüestrado.
- Bem, que nós podemos fazer?
- Ah, mãe, mas eu fui má com ela, com a prima dela. Nunca desejei uma coisa dessas. O pai foi muito duro com ela. Por causa da briga e da suspensão ela ficou um mês de castigo.
- Ah, mas também ela foi covarde. Ela é muito maior que você. Te deu na cara, te jogou no chão.
- Mãe, não é hora de lembrar disto. Ela não merece ficar em coma no CTI, não merece que o pai tenha sido seqüestrado. Eu quero saber dela.
- Nós procuramos saber o hospital em que ela está. – a mãe aceita por ver o interesse da filha, mas segundo sua maneira de pensar, não deveriam voltar a se envolver com os Castelli.
O Brasil é pentacampeão. O povo sai às ruas festejando. O país esquece as injustiças sociais, a crise econômica, os crimes bárbaros, até os delinqüentes comemoram. Esta alegria contrasta com a profunda tristeza e ansiedade que invade o clã dos Castelli. No hospital, Soraya comenta com Heloísa:
- Que ironia, o Brasil é pentacampeão e eu me sinto uma dupla perdedora.
- Não fala assim, Soraya.
- Helô, como eu posso me sentir? Meu marido seqüestrado, minha filha entre a vida e a morte.
- Ela vai reagir, o Genaro vai ser localizado. Tenha fé!
- Fé? Tá difícil.
Em casa, Rodrigo inquieto, é acalmado pela mãe.
- Mãe, eu preciso ir ao hospital onde a Suzana está.
- Filho, vem cá, querido, você tá muito tenso. Vamos ligar pra casa dela, pedimos informações sobre o seu estado, perguntamos o telefone do hospital pra ter maiores informações. No mesmo dia acontece o seqüestro e a menina entra em coma. Eles estão desesperados, com certeza. Pra dar apoio nós temos que estar calmos. Essa menina me encantou tanto que eu nem posso acreditar que esteja nessa situação.
Ricardo e Renato, preocupados com suas namoradas, vão ao Solar Castelli prestar seu apoio.
- Sandra, queria poder fazer alguma coisa. – Ricardo tenta consolá-la
- Não tem nada que se possa fazer. Agora é só esperar – Sandra está quase sem esperanças
- Vocês têm notícias dela? – Renato interessa-se
- O médico disse que o estado é estável – Sandra informa – mas ela continua em coma, com aparelhos controlando a respiração.
Sônia começa a chorar e vai para outro lado do jardim. Renato a acompanha.
- Não dá pra acreditar nisto, Sandra! – Ricardo revolta-se – Tava tudo bem; a Suzana se acertou com o Rodrigo, tava mais confiante, brilhou na coreografia da gincana, cantou e arrasou. Depois, acontece isso! Pôxa, eu não aceito! Eu sofro pelo Rodrigo que tá arrasado, você já tava mal por causa do seu irmão. Isso tem que acabar! É demais!
- É...eu já nem sei o que pensar. Tá demais, mesmo. – Sandra concorda
- Você não sabe nada do seu irmão, né?
- Novamente ele deu um sinal de “raspão” e sumiu.
- Espero que ele esteja bem.
Daniel participa de mais uma farra com alguns amigos, na casa de um filhinho de papai, onde campo está livre, sem a interferência dos donos. Daniel curte seu delírio, sua fantasia, mas no seu resto de sanidade, duas pessoas não lhe saem da mente: a irmã e a namorada. Ao vê-lo calado num momento de reflexão, o anfitrião o chama:
- Ei cara, ‘cê tá a fim de curtir uma?
- Já tô numa “nice”.
- Aquela gata moreninha não tira os olhos de você. Você também olhou pra ela.Convida ela pra subir.
- É, pode ser bom. Pra passar o tempo, tudo é válido.
- Você não existe! – estranha o rapaz – Ela é a garota mais desejada da festa e você a chama de “passatempo”?! A vida é curta! O Brasil é pentacampeão! Vai fazer seu “penta” com ela! Não pensa em nada, só curte!
Daniel, influenciado pelo rapaz vai até a garota que o recebe bem, conversa um pouco e depois sobem.
Após algumas horas, a garota desce, parecendo decepcionada. O anfitrião procura saber o que houve.
- Que foi, gata?
- Nunca mais quero ver aquele cara!
- Por quê?
- Pensei que tava curtindo comigo e me chamou de Flávia! Meu nome é Bárbara, não vou servir de reserva!
- Que cara mais idiota! – critica o anfitrião, que em seguida sobe, encontrando Daniel encolhido na cama.
- Que foi, cara?
- Não quero falar com ninguém.
- Cumé que cê dispensa uma gataça daquelas?! O nome já diz: Bárbara! Cê é muito otário! Ela já é minha!
O anfitrião pega a garota e os dois vão para o quarto dele. Na festa, ninguém pertence a ninguém e Daniel atormentado pela droga, pelo efeito depressivo que vem depois da euforia, sente-se só, acuado, tem alucinações, sente que as paredes estão querendo engoli-lo, vê monstros e sai correndo e gritando.
No dia seguinte às comemorações do penta, Sandra e Sônia vão à escola. Os colegas já sabem do fato e são solidários. Luciana arrepende-se por ter sido tão falsa com Suzana. Vários colegas combinam de ir ao hospital para ter notícias. Rodrigo também vai à aula, mas só pensa em Suzana. À tarde, liga para Vitor:
- Tio Vitor.
- Rodrigo, como está querido?
- Como eu poderia estar? – Rodrigo começa a chorar
- Rodrigo, é muito difícil, mas não fique assim, tudo vai ficar bem.
- Mas ela não reage!
- Rodrigo, creia em Deus, tenha a certeza de que em nome de Jesus, a Suzana vai sair desta e nós vamos ter notícias do Genaro.
- Ninguém ligou mais pra dar notícias dele, pra pedir resgate?
- Ainda não. Com esta euforia do penta, tudo para.
- Eu preciso ver a Suzana. Tanta gente tem ido que eu acabo não conseguindo ir
- Tem um horário certo e restrito. Amanhã eu acompanho você lá.
- ‘Brigado tio Vitor. Eu ligo pro senhor quando chegar da escola.
- Podemos nos encontrar lá direto. Às 2:00 da tarde.
- Meia hora antes eu já vou estar lá.
Enquanto Vitor despede-se de Rodrigo ao telefone, Patty entra chateada em casa.
- Que foi filha? – Vitor pergunta
- Ah, esse pessoal da rua fica me olhando, perguntam coisas do tio Genaro. Não têm mais o que fazer?
- Depois do penta, esse seqüestro tem sido o assunto.
- Não sei nem cumé que descobriram.
- Ah, minha filha, esses repórteres quando querem descobrem tudo.
- Eu tô tão triste. A Suzana lá em coma. Ela vai ficar boa, né?
- Em nome de Jesus! Tudo isso é espiritual. Deus vai responder às nossas orações.
No hospital, no dia seguinte, Paulo aparece. Heloísa é ríspida com ele:
- Que tá fazendo aqui ô Judas Iscariotes? Veio bancar o bom tio? Você nunca gostou dela!
- Helô, por favor. – Soraya pede
- Estou aqui pra dar notícias do nosso filho.
- Você o viu? Ele voltou pra casa? - Heloísa levanta-se ansiosa
- Ele foi visto por um colega que o está seguindo sem ser visto. Tô aguardando notícias.
Um pouco depois, ainda sem informações sobre Genaro, Rodrigo encontra Vitor no hospital para ver Suzana. Vitor ora, determinando a cura da sobrinha e Rodrigo entra no CTI. A princípio, fica impressionado ao vê-la cheia de aparelhos e até recua, mas consegue dominar o terror que sente e aproxima-se, falando baixinho perto do ouvido da amada, com esperanças que ela o esteja ouvindo:
- Suzana....Minha linda...eu te amo. – Rodrigo não consegue dominar as lágrimas – Suzana...Você vai ficar boa.... se Este Deus que seu tio Vitor fala tanto tem tanto poder, Ele tem que te tirar daqui agora, em nome de Jesus!
Rodrigo chega mais perto de Suzana e uma lágrima sua cai sobre a pálpebra direita de Suzana. Naquele momento, como que recebendo uma fonte de vida seus olhos se abrem. Suzana, com a máscara de oxigênio, começa a gemer e Rodrigo ao ver que ela está saindo do coma, sai pelo corredor eufórico, gritando:
- Ela abriu os olhos! Tá tentando falar!
- Fala baixo menino! Isto aqui é um hospital! – a enfermeira repreende.
- Desculpe. – Rodrigo abaixa a voz e Soraya e Heloísa vão até o CTI e constatam, acompanhadas pelo médico que Suzana saiu do coma.
O médico faz as perguntas de praxe para verificar o estado de Suzana e sua memória ao sair do coma. Ela parece bem, como se nada houvesse acontecido e é liberada para um quarto. A menina embora sem apresentar nenhuma seqüela, expressa uma grande tristeza, ao recordar:
- Meu pai...ele...
- Minha filha, a gente vai encontrá-lo. – Soraya a conforta - Ninguém ligou mais. Nós estamos aguardando. A Odete está lá em casa à espera. Deve ser a euforia da Copa. O Brasil é penta campeão.
- Que importa isso agora? – Suzana começa a chorar
- Filhinha, se acalma. Não deixa a emoção tomar tanto conta de você, se poupa.
- Eu não posso ficar sem você. – Rodrigo beija sua mão carinhosamente encostando-a no rosto.
Enquanto Heloísa aguarda no hospital, Paulo, perto do prédio da empresa com Sérgio assoberbado de trabalho pela ausência de Genaro, recebe um telefonema de Alexandre:
- Dr. Paulo, eu acho que o Daniel percebeu que eu o estava seguindo. Perdi o cara de vista outra vez.
- Meu Deus! Já tinha dado esperanças pra mãe dele!
- Eu vou entrar em contato com outros colegas nossos que moram por perto. Nós vamos conseguir Dr. Paulo.
Logo depois aparece Sérgio.
- E aí, alguma notícia? – Paulo indaga
- Agora que saiu nos jornais, na TV, não vão ligar tão cedo. Devem achar que a gente comunicou à polícia.
- Cancelei várias reuniões que o Genaro tinha marcadas pra logo depois da Copa. – Paulo comunica
- Você fez bem. Como é que nós vamos ter cabeça pra isso agora?
- Pois é, mas não podemos parar de trabalhar, né?
- Isso é, mas temos que achar um meio de ajudar nosso irmão. Por que não ligam? Que angústia!
- E eu, que também não acho meu filho?
- Pelo menos a Suzana saiu do coma.
O celular de Sérgio toca e ele vendo no visor de quem se trata, não atende.
- Não vai atender? – Paulo estranha
- Não. Não é nada de importante. Quer dizer, não mais do que nossa expectativa agora.
Os seqüestradores ficam em estado de alerta.
- Como é que foi vazar?
- Eu acho que foi um desses repórteres de plantão. Gente importante sempre dá assunto.
- Cara, temos que tomar cuidado.
No tráfico existem sempre as trocas de intreresse e as rivalidades. Sendo assim, um rival mais forte do que aquele que tramou o seqüestro de Genaro, convoca policiais e arquiteta um plano para que a polícia apareça como cumpridora de seu dever:
- Você liga do DISK DENÚNCIA. O bando é preso e a nossa turma fica sendo a dona do pedaço. Tenho uma remessa da branquinha mais pura pra vocês dividirem comigo. A gente entrega todos e cai fora, assim como foi com o Wilson Mattos! Vamos trazer mercadoria da boa lá do Paraguai. Nosso comando vai crescer e os clientes deles vão ser nossos!
Daniel encontra um “amigo” que da-lhe uma carona e despista Alexandre. Leva-o para uma praia distante, quando já está anoitecendo.
- Liberdade! – Daniel grita sob a euforia da droga, misturada com álcool.
- Cara, aquele garçom, onde a gente bebeu deve ter ficado com muita raiva da gente.
- Ele tava com uma cara!
- O rosto grandão, o corpo pequeno – o rapaz descreve no seu delírio
- Que máximo! Eu o vi lilás! – Daniel descreve.
- Cara, eu tenho mais neve quente aqui, da mais pura e branquinha, toma.
O lugar está deserto. Depois de se entupirem de droga, ficam mais um pouco na praia, descansam e no início da madrugada voltam ao carro. O amigo de Daniel guia sem cuidado. Há pouco trânsito devido ao horário. Num momento de lucidez vendo o perigo de perto, Daniel grita ao ver um caminhão que passa pela travessia quando o amigo está a toda velocidade:
- Cuidado cara, vai bater!!!! Aaaaaaaaaaaaaah!!!!!!!!
Não há tempo. O carro bate em cheio no caminhão e capota.